Oriontte
Olhar para Trás
Quantas vezes se olha para trás enquanto se percorre um caminho? Poucas, não é? Afinal, virar a cabeça para outro lado que não seja adiante enquanto um trajeto é seguido pode tirar a perspectiva do andarilho e chegar até mesmo a causar um acidente, especialmente se a atenção dele estiver voltada para a direção oposta à que está seguindo.
O ser humano foi criado com olhos na parte frontal do rosto, e não na nuca, sendo assim, o natural é que divise o percurso que está diante de si, e não aquele que está sendo, à medida em que se caminha, deixado para trás. Mesmo quando em dados momentos alguém vira o olhar para sua parte posterior, o faz por pouco tempo, com a intenção de realizar uma rápida checagem ou mesmo vislumbrar se pegou a senda correta ou se deixou de virar, alguns metros antes, na direção que era a certa.
Olhar para frente, seguir adiante, esses são os movimentos naturais que permeiam nossa existência, e não caminhar constantemente de pescoço virado para o caminho oposto enquanto se anda, perdendo a atenção no trajeto que está seguindo e continuando a se afastar daquele que ficou no passado, direção esta da qual continuará se distanciando, porque por mais que queiramos, o tempo não volta, o relógio não retrocede, e a vida continua seguindo seu rumo, sem pausas, sem retornos, avançando, indo adiante. Em frente... sempre em frente.
Essa afirmação parece estar envolta numa atmosfera de certeza incontestável, mas mesmo diante de fatos inquestionáveis, a mente e o coração humano insistem em fugir da lógica para tentar acreditar em verdades sem fundamento, que foram criadas apenas para satisfazer uma necessidade, um desejo, ou para tornar menos doloroso um arrependimento por algo que deixou de ser feito num caminho que já ficou para trás.
A vida segue seu rumo, e nessa estrada não há caminho de retorno. Nascemos, vivemos, e um dia, partimos desse mundo, deixando para trás apenas o que fizemos no trajeto percorrido. Mas em momento algum há ponto de parada nessa estrada, onde podemos cessar a caminhada, olhar para o caminho seguido e espontaneamente percorrê-lo de volta na tentativa de sanar os erros cometidos. Isso, não é possível fazer.
Uma vez trilhada a senda, dado o passo e seguido o percurso, está feito, não tem volta, e tudo o que podemos fazer depois disso é colher os bons frutos do que plantamos de certo, e arcar com as consequências dos erros cometidos. Há sim, a possibilidade de amenizar um dano causado, ou mesmo de reformar ou reconstruir uma estrutura abalada por algum mal que causamos, mas isso será feito adiante, enquanto a vida segue, porque é isso que ela vai fazer de forma constante, contínua e inexorável, até que o ponto final da caminhada seja alcançado.
Por tudo isso, a melhor escolha a ser feita é deixar de olhar para trás constantemente, torcendo o pescoço e perdendo a atenção com o que está adiante. Amores perdidos, oportunidades desperdiçadas, erros cometidos, tudo isso continuará ali, no passado, quer você olhe para eles ou não. Mas a caminhada não irá parar, e é adiante que a atenção deve ser focada.
Olhar para o que fizemos esporadicamente, como forma de rever as coisas boas e aprender com os equívocos que cometemos é sim uma atitude benéfica. Mas manter ali o olhar, esquecendo do que está adiante é apenas uma receita para que novos erros sejam cometidos.
O caminho é constante, seja ele curto ou longo, e também reserva novos amores e oportunidades que poderão estar no próximo metro o quilômetro percorrido. Talvez até mesmo aquele amor do passado que se achava estar perdido, ou aquela chance que pensávamos que já não existisse mais seja vista novamente, mas não atrás, e sim à frente, percepção essa que será ignorada se mantivermos nosso olhar voltado sempre para o passado, ao invés de divisar o cenário que se descortina para o futuro.
Seguir em frente, como os ponteiros de um relógio, esse é o caminho. Lembrando o passado para trilhar o presente e, assim, chegar ao objetivo que aguarda no futuro. Não há ordem inversa nessa caminhada, e não é na largada que encontraremos a linha de chegada.
Festa Junina
Feche os olhos e sinta as lembranças voltando. Memórias de uma época em que sequer tinha discernimento sobre o que fazia, mas que já sentia e vivia em plenitude essa maravilha que é a vida, com todas as alegrias que ela proporciona, dentre elas a vivenciada nesse período ímpar, que acontece apenas uma vez a cada ano.
Feche os olhos e sinta o cheirinho inconfundível da fogueira em meio ao vento frio de uma noite estrelada de junho, em que as fogueiras se espalham no chão, aquecendo corpos e corações enquanto tentam em vão emular o brilho das estrelas que se estendem pelo céu a correr o infinito.
Sintas as lembranças voltando pouco a pouco, resgatando pequenas fotos mentais de épocas em que os rastros de luz rabiscados no ar pelos chuveirinhos flamejantes dividiam espaço com os clarões multicoloridos dos fogos que se espalhavam pelo ambiente, enchendo olhos, ouvidos e corações com a alegria sonora e vistosa de uma festa tão aguardada.
Saboreie a memória trazendo de volta o gosto das guloseimas servidas enquanto recorda a canjica derretendo na língua, o gosto adocicado da pamonha e do pé de moleque, os grãos macios do milho verde, e os crocantes daquele mais assadinho na brasa da fogueira reluzente, se espalhando pela boca que logo será banhada pelo quentão inebriante, trazendo consigo o gostinho distante da cachaça mesclado àquele leve toque de canela, aquecendo o corpo e o coração para a noite de dança que se aproxima.
Reviva o caleidoscópio de cores que se espalham nas bandeirolas penduradas por todos os lugares, flamulando ao sabor do vento frio dessa noite estrelada enquanto dividem espaço com as imagens dos santos da época, com os vestidos e camisas axadrezadas, com as pintas desenhadas no rosto das matutas e os chapéus de palha retirados em reverência quando elas cumprimentam o par na quadrilha que baila pelo terreiro.
Ouça os estampidos dos fogos ecoando pelo ar noturno, dos pés batendo no tablado, dos gritos de euforia em meio à dança interminável, do choro da sanfona, do retinir do triângulo e do compasso da zabumba enchendo o ar de animação enquanto a voz do cantador puxa a poesia que o matuto guarda na mente e no coração, contando a história de uma terra de alegria e sofrimento, de um povo sofrido e contente, e de uma cultura que apenas se fortalece com a passagem interminável do tempo.
Feche os olhos e sinta, ouça, saboreie, cheire, veja, e viva essa época que antes mesmo de chegar já traz consigo a saudade, porque se sabe que tudo o que é bom dura pouco, mas que vem também acompanhada da alegre ansiedade pelo seu retorno, que virá logo ali, depois da esquina do ano que entra, voltando com todas as suas cores, músicas, cheiros e sabores para eriçar de emoção e alegria a pele de quem festeja tão logo os primeiros acordes cheguem aos ouvidos, anunciando que o arrasta-pé vai começar, e que a festança não tem hora para acabar.
Fechou os olhos e lembrou?
Pois então agora abra, porque meus amigos, o São João já chegou.
Páscoa
Cada um tem sua cruz para carregar. Eis um dito popular que passou a ser tão utilizado que por vezes é empregado quando se quer relacionar comicamente a alguém que vive para incomodar outra pessoa, como, por exemplo, “a minha sogra é a cruz que eu carrego”, ou “aquele meu cunhado folgado é a minha cruz”.
Mas a cruz, de cômica, não tem nada. Por muito tempo foi utilizada com objeto de tortura ou morte, e tirou a vida de muitas pessoas de forma cruel e devastadora. Não à toa foi usada para representar os pecados do mundo todo, sendo carregada por Alguém que em um gesto de amor infinito a levou em nosso lugar.
Nesse aspecto, continuar utilizando esse dito para nos referirmos a nossos problemas poderia ser visto como uma forma de desrespeito, já que qualquer agrura que tenhamos que enfrentar jamais poderá ser comparada às dores e humilhações que Cristo teve de encarar para nos dar a Salvação.
No entanto, mesmo não usando o termo, podemos ainda assim dizer que temos os nossos próprios fardos, cujo peso só poderá ser definido por aquele que o carrega, e não pelas pessoas que assistem de fora e querem opinar. Doenças, depressão, decepções, humilhações, dores, problemas amorosos, financeiros e mais uma gama de questões cuja menção não caberia numa folha de papel.
Cada um que caminha por este pedaço de rocha flutuando no espaço tem ou já teve seu próprio fardo para carregar, e com certeza já se deparou com momentos de revolta, falta de fé, desencorajamento, vontade de desistir e quase certamente fez a pergunta que quase sempre é repetida. “Por que eu?”
Por que isso aconteceu comigo, que nunca fiz mal a ninguém? Por que tenho que enfrentar esse problema, quando tem tanta gente ruim no mundo que vive no luxo e na riqueza? Por que eu, que não mato, não roubo e tento viver de acordo com todos os preceitos de bondade, tenho de encarar tudo isso quando aquele bandido e assassino sequer dá um espirro ou tem uma unha encravada?
Em dado momento é quase certo que todos nos façamos essa pergunta, às vezes com uma boa dose de revolta, diga-se de passagem. Mas então outro questionamento também pode ser feito. Lembra daquele Cara que citamos acima, e que carregou um mundo de pecados nas costas representado por aquela cruz? Por acaso Ele reclamou enquanto fazia isso?
Por acaso Ele perguntou, “por que eu?” enquanto era massacrado e morto lentamente com requintes de crueldade? A resposta é clara, não é? Ele não só evitou reclamar, como chegou até mesmo a rezar pelas pessoas que lhe faziam aquelas atrocidades. Mesmo depois de pedir que aquele cálice fosse afastado na véspera de começar a enfrentar todo o sofrimento que teria pela frente, logo em seguida ele decidiu cumprir uma Vontade Maior e encarar a dor que o aguardava.
Então uma nova pergunta pode ser feita. Por que não seguir esse exemplo? Por que ao invés de reclamar e tentar fugir, não podemos fazer o mesmo que Ele, aceitando o que vem pela frente e tentando enfrentar tudo com coragem e resignação?
A pergunta é válida, e como tento não ser hipócrita, digo com efetiva certeza que ela também é direcionada para mim, que me queixo e tenho medo tanto quanto qualquer um que esteja lendo esse texto.
E há mais um motivo para que ela seja feita. Porque, diferente daquele Cara que há mais de dois mil anos carregou sozinho os pecados do mundo, nós contamos com uma ajuda mais do que especial. Uma ajuda que o próprio Cristo nos prometeu, e se tem alguém que sabe cumprir promessas, é Ele. Ou vocês esqueceram essas palavras?
"Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu darei descanso a vocês.
29Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas.
30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve".
(Mateus, 11:28-30).
Bom, não é pouco ouvir uma oferta como essa Daquele que carregou o peso do mundo em pecados, e para ter essa ajuda não há mistério, basta fazer uma coisa tão simples como pedir.
Então aproveitemos essa época em que lembramos de um Sacrifício de Amor tão grande e imensurável, para seguir o exemplo Daquele que deu a Vida por nós. Quando chegar o momento de carregarmos nossos fardos, que tentemos não apenas agir como Ele, mas também, e principalmente, pedir para que esteja ao nosso lado nesses momentos tão difíceis.
A promessa é forte, assim como Quem a fez, e a garantia de cumprimento é mais do que certa. Basta buscar. Basta pedir. Basta sentir.
Que possamos ir até Ele, e que possamos também lembrar do real significado desta data tão especial.
Uma Feliz Páscoa a todos.
DEUS os abençoe.
Um dia não é o bastante
Um dia especial, para celebrar, para homenagear ou comemorar alguma conquista. É nesse contexto que se cria uma data comemorativa, que será lembrada durante anos, algumas com mais relevância, outras nem tanto, a depender da importância de quem se está homenageando. Mas o fato é que o marco se estabelece, se repete e se recorda, até que se transforma em uma tradição.
Um dia, uma data, um marco, um pequeno quadrado no calendário, um rabisco na agenda, um lembrete no celular. Um dia. Geralmente é o bastante para promover o reconhecimento de quem fez algo importante, uma conquista, uma descoberta, um recorde, uma vitória, um capítulo na história que passa a ser relembrado para o merecido reconhecimento do homenageado.
Mas então pergunto, se um dia é o bastante para celebrar uma conquista, seria então suficiente para comemorar inúmeras vitórias?
Um cientista que desenvolveu um tratamento, um político que promoveu melhorias na vida do povo, um religioso que acolheu muita gente, alguém que por meio da filantropia ajudou com obras de caridade, certamente estas pessoas merecem uma data para homenageá-las pelas conquistas alcançadas no decorrer de suas vidas.
Mas e quando se celebra um dia para conquistar quem fez isso e muito mais, há justiça nesse ato? Quando se marca uma data para homenagear alguém que não cumpre apenas um, mas também uma infinidade de papéis, todos de enorme relevância, seja na posição de protagonista, seja na de coadjuvante, sou obrigado a dizer que só um dia não é o bastante.
Mas quem seria essa pessoa que cumpre tantos papéis em nosso dia a dia? Que desempenha tantas funções? Que merece tanto reconhecimento? Alguém do mundo da política? Do atletismo? Das artes? Da ciência? Em qual campo estaria essa pessoa tão profícua? Muito simples. Em todos esses campos, inclusive na sua casa, ao seu lado, mais perto do que você imagina.
A mulher.
A mulher cumpre todos esses papéis, e o faz com uma excelência ímpar, uma dignidade única, e uma sensibilidade que na grande maioria das vezes a diferencia de nós, homens, brucutus por natureza que deveríamos nos espelhar mais nas ações de pessoas que possuem em seu DNA as capacidades de cuidar, proteger e frutificar.
Mãe, filha, esposa, Namorada, irmã, amiga, parceira, chefe, empregada, presidente, gari, motorista, atleta, artista, são apenas alguns dos inúmeros papéis que as mulheres desempenham em nosso cotidiano, conquistando a cada dia o espaço que tanto merecem, e fazendo isso com uma excelência digna de nota, furando bloqueios, ultrapassando obstáculos, e rompendo barreiras historicamente erguidas, mas que cedem diante do ímpeto e da força de vontade delas, que possuem como característica inerente a de doar-se ao máximo aos seus objetivos.
A mulher tem conquistado inclusive espaços que décadas atrás dificilmente se pensaria que conseguissem, dada a mentalidade tacanha de muitas pessoas que certamente achavam que alguns postos eram exclusivamente reservados aos homens, o que prova apenas que elas podem fazer tudo o que fazemos, e melhor. Mas existe algo mais, uma benção pessoal que elas possuem, inerente à sua natureza. Algo pelo qual foram unicamente agraciadas. Algo que só a mulher tem.
Gerar e carregar uma vida, criar um laço de uma intimidade fora do comum com a cria que se leva no ventre, sentir algo tão ímpar e grandioso, tudo isso apenas as mulheres podem fazer, o que só demonstra o quão importantes e únicas elas são em nossas vidas, razão pela qual volto a perguntar, só um dia é o bastante para celebrar pessoas de tamanha relevância?
A verdade é que as mulheres são tão importantes, e realizam tanto no mundo, que nem se juntássemos todos os trezentos e sessenta e cinco dias do ano seria o bastante para homenageá-las da forma como merecem. Mas mesmo não sendo o suficiente, que tal o fazermos mesmo assim?
Então, não valorize as mulheres apenas no dia 08 de março, sejam elas as da sua vida, ou aquelas com as quais encontra esporadicamente no dia a dia. Trate-as com o respeito e a igualdade que merecem, retribuindo o mesmo carinho que recebeu da primeira delas, aquela que conheceu antes mesmo que o primeiro lampejo de consciência iluminasse sua mente. Aquela que com tanto amor te carregou no ventre.
E a vocês, heroínas famosas ou anônimas, um feliz dia das mulheres.
Natal
Gente com sorriso no rosto, pessoas se tratando cordialmente, mandando mensagens de paz e prosperidade, desejando o bem ao próximo e fazendo esse mesmo bem às pessoas que de alguma forma necessitem de um auxílio, seja a nível material, seja a nível espiritual.
Abraços, beijos, palavras gentis, doações, altruísmo, reconciliações e contentamento. Todas essas ações são coisas que costumeiramente vemos acontecendo no Natal e nos dias que o antecedem, momento em que os corações parecem estar mais abertos ao amor e à compreensão, ao carinho e à paciência nas relações com o próximo.
Mas por que só no Natal? Em razão do que a época representa? Por se tratar da data que marca o nascimento de Cristo? Em respeito Àquele que veio ao mundo para nos salvar de nossos pecados? Se a resposta for sim, então é uma tremenda de incoerência de nossa parte.
Quando lemos os Evangelhos percebemos que em momento algum Jesus disse, “amai ao próximo, mas somente no dia ou na semana do meu aniversário.” “Pare de pecar, mas só quando o Natal estiver chegando”, ou “deixe de fazer o mal, mas apenas por alguns dias”. Que eu bem lembre, em nenhuma parte Ele diz que depois do dia 25 de dezembro podemos voltar a ser grosseiros, a dar “coices” nas pessoas que nos incomodam de alguma forma, a desejar as coisas alheias, a pensar mal ou fazer mal ao próximo e a cometer tantos e tantos outros pecados que até mesmo a nível inconsciente acabamos cometendo, sem perceber que o estamos fazendo.
Fácil não é. Pecar é simples, basta ir lá e fazer. Deixar de pecar envolve esforço, fé e o ato de abrirmos o coração para que DEUS entre e nos dê forças para resistir ao mal. Mas o aniversariante nunca disse que encontraríamos um caminho repleto de facilidades, pelo contrário, Ele nos alertou que a porta é estreita e a caminhada envolve desapego e sacrifícios, assim como a consciência de que devemos agir dessa forma não apenas por um dia ou uma semana, mas no ano inteiro.
Então, já que essa é uma época marcada pelo costume de dar presentes, que tal então presentear as outras pessoas com nosso carinho, paciência e compreensão, e não apenas por um dia? Garanto que ao fazer isso, três pessoas serão agraciadas. A que está recebendo esse amor, você mesmo, e, claro, a Mais Importante Delas, que é justamente o Aniversariante.
Um Feliz Natal a todos.
A Senhora
Me lembro como se fosse hoje da senhorinha que nos dias já relativamente longínquos da minha infância ficava na janela, observando com atenção as pessoas que passavam diante dela, e que não mostravam o mesmo interesse naquela que os fitava com tanta atenção.
Todas as tardes, no caminho de volta para casa, em dias onde era mais seguro uma criança andar na rua eu a via ali parada, sempre do mesmo jeito, sempre da mesma forma, como uma reprise de si mesma, como uma fotografia pendurada na janela que se abria para o mundo que ela observava da quietude de um camarote onde parecia ser a única convidada.
Alheias a ela as pessoas passavam, assim como o tempo em sua caminhada infindável, assim como aquele garotinho que a olhava com algum interesse que na época não sabia dizer qual era, e que mesmo agora, enquanto escreve essas linhas, ainda não tenha certeza de tê-lo descoberto.
Sempre na mesma hora, sempre com o mesmo penteado, sempre com os mesmos vestidos estampados ela se punha em idêntica posição, fitando com atenção o que acontecia ao seu redor. Às vezes aquele olhar parecia atento, seguindo passo a passo o que acontecia, e por vezes parecia perdido, como se sua dona já não estivesse ali, mas em algum outro ponto situado entre o espaço e o tempo de dias que há muito já tinham findado.
Penso nela com a mente de um homem, e com a lembrança do garoto que a via sem compreender por que ela sempre ficava ali, olhando os outros passarem, da mesma forma, do mesmo jeito, no mesmo local. Para uma criança, em que um mundo de possibilidades existe diante de seus olhos, pode ser difícil entender como alguém se satisfaz em repetir o que faz, vez após vez, dia após dia.
Mas com o tempo vi que talvez aquela não fosse uma escolha que a senhorinha da janela tivesse feito depois de analisar um leque de variadas opções. Talvez o que ela sempre fazia dia após dia fosse a única coisa que poderia fazer quando já não era mais uma garotinha com um mundo de possibilidades diante de si.
Na memória daquela criança eu vejo apenas a senhorinha na janela. Não vejo parentes à sua porta. Não vejo amigos em sua varanda, não vejo um marido sentado ao seu lado conversando sobre as lembranças de dias que tinham ficado no passado. Apenas ela, ali, parada no seu camarote que dava para o mundo que passava alheio a ela, como um ator que durante a peça não vislumbra alguém em especial numa enorme plateia.
Na máquina do tempo de minhas lembranças eu a visito, a vejo, e se pudesse a escutaria, mas não posso interagir com ela. E o que faria se pudesse? Se ainda fosse aquele garotinho certamente perguntaria por que ela ficava ali, parada, olhando para a vida e muitas vezes para o nada. Mas sendo quem sou hoje, não perguntaria nada. Nada além de um “como vai?” Muitas vezes esse é o melhor questionamento que se pode fazer para alguém que já não tem tantas possibilidades diante de si. Que já não possui um leque tão grande de opções para escolher.
Como vai? Seria a pergunta, e as respostas, hoje, eu só posso conjecturar quais seriam. O garotinho nunca fez aquela pergunta, e ele não é culpado disso, porque só depois que o tempo passa para nós mesmos, que começamos a ver o quanto ele também passou para as outras pessoas, e o quanto levou nesse processo.
Um dia aquele garotinho passou, e o cenário parecia ser o mesmo, com uma tarde semelhante a todas as anteriores. Mas a senhorinha já não estava mais ali. Seu camarote estava fechado. Sua janela encerrada, e assim permaneceu, como uma peça que sai de cartaz levando consigo sua trupe e deixando seus espectadores sem o espetáculo que diariamente assistiam.
A senhorinha nunca mais apareceu, e sua janela não foi mais aberta, a não ser nas lembranças de um garoto que pouco sabia sobre o mundo, e que hoje é um homem que tão pouco ainda sabe, mas que uma coisa aprendeu com o tempo que se passou desde então.
Que a vida passa com a velocidade de um pensamento, de uma lembrança, ou mesmo de um rápido olhar que parece perdido no nada.
Talvez fosse isso que aquela senhorinha estivesse pensando enquanto parecia encarar algum ponto situado entre o espaço e o tempo, algo que já não estava mais ali, mas apenas em sua gaveta de memórias.
A vida passa. Então, para que vive-la com raivas e rancores, com intrigas e desamores? Talvez um dia seja eu, ou mesmo você quem estará olhando o mundo de uma janela de lembranças, sem tantas possibilidades diante de si. Então pergunto, da mesma forma que perguntaria “como vai”, para aquela senhorinha...
O que queremos ver na janela de nossas lembranças? Rancores e desentendimentos? Ou amores e contentamento?
Eu sei qual é minha resposta.
Qual seria a sua?
A Importância de cada um
É comum vermos no dia a dia pessoas se queixando sobre suas insatisfações, seja com a própria aparência, seja com as condições de vida que possuem, sonhos e projetos almejados e não alcançados, ou o saldo de suas contas bancárias. Muitas vezes nem precisamos observar o vizinho para ver esse tipo de atitude, já que nós mesmos chegamos a cometê-la.
Frases como, “ah, se eu pudesse”, “ah, se eu tivesse”, “ah, se eu fosse assim” são proferidas diuturnamente, quase sempre acompanhadas com uma inevitável comparação com outras pessoas que, na visão das que se queixam, “podem”, têm”, ou “são”.
A grama do vizinho é sempre mais verde, o corpo do outro é mais sarado do que o meu, a casa da amiga é maior que a minha, a conta bancária é mais polpuda, as roupas são mais bonitas, o carro é melhor, o emprego tem mais status, as viagens são mais constantes, e mais uma série de comparações que são feitas seguidas dos “ah, se...” citados acima.
E em tempos de rede social, onde o vislumbre do que o outro tem ou deixa de ter está à distância de um clique, essa postura se torna cada vez mais frequente, fazendo com que a pessoa que a adota acabe ela mesma se diminuindo aos próprios olhos, aumentando uma frustração que cresce de forma exponencial, em um círculo vicioso onde o lamento é causado pelo não ter ou não ser, e a pessoa continua a não ter ou não ser porque permanece se lamentando enquanto se compara ao próximo.
Sou menos, tenho menos, valho menos, e, como resultado, minha importância é menor do que a dos outros.
Há quem pense menos de si mesmo porque não tem aquele corpo sarado e escultural, ou aquela aparência digna de modelos de comerciais de cerveja ou creme dental, pensando que sua importância é menor porque os outros as veem dessa forma. Mas na verdade não são os outros, e sim a própria pessoa que se enxerga assim.
Conheço gente que está bem longe de se adequar ao padrão de beleza exigido pela sociedade, mas vive feliz e satisfeita com a própria aparência, e querem saber? Não apenas estão bem aos próprios olhos, como também a satisfação que sentem salta aos olhos dos demais, que acabam nem percebendo aquele buchinho saliente balançando cheio de alegria em um dia ensolarado na praia.
Há também aqueles que não vivem em uma mansão de dez quartos com sauna, piscina e tudo o mais, e que não dirigem o veículo de última geração que vale mais que um apartamento, e nem possuem uma conta bancária de dez dígitos, mas se sentem bem demais com sua casa simples, seu carro popular e sua poupança que vai crescendo aos poucos, mesmo que seja bem aos poucos.
Claro que é bom almejar ter mais, ser mais, crescer mais. O problema é quando isso se transforma em fonte de comparação, e por consequência, de frustração, levando aquele que a sente a ver-se com menos importância do que as pessoas que acha que são mais porque têm mais.
A importância de cada um começa na relevância que tem para si mesmo, e se ela for baixa, ou mesmo inexistente, essa pessoa nunca poderá, nunca terá, e nunca será.
Então, da próxima vez que for pensar que a grama do vizinho é mais verde, ou que você não é tão bonito porque está com aquela “pochete” de gordura na barriga, desencane e comece a ver o lado positivo da coisa, porque se você não enxergar, não serão os outros que vão enxergar por você.
Dia dos Pais
Escrever sobre o dia dos pais não é simples, em primeiro lugar porque ainda não experimentei essa que deve ser uma sensação ímpar, a de ter, cuidar, educar e acompanhar um filho nesse caminho tão belo e também tão tortuoso que é a estrada da vida.
E em segundo lugar porque eu e meu pai somos pessoas fechadas, extremamente parecidas e com uma certa dificuldade de romper uma barreira para termos um nível maior de proximidade.
Não que sejamos distantes, frios ou com uma relação conturbada. De forma alguma. Amo meu pai, o visito, tomamos nossa cerveja e conversamos sobre religião, política, futebol (sofremos pelo mesmo time), relacionamentos e até mesmo sobre essa moda horrorosa masculina de calças sociais apertadas nas canelas e deixando os tornozelos à mostra (eita troço feio).
Mas como disse acima, somos parecidos demais, e como ambos temos essa dificuldade de aproximação e abertura (ao menos pessoalmente, já que a escrita me liberta nesse ponto), durante muito tempo ficamos um pouco distantes, mesmo habitando a mesma casa, como acontecia em minha adolescência. E por que falo isso? Para ilustrar, com um exemplo que tive em minha vida, de como a presença de um pai é importante.
Nunca fui uma criança extrovertida, e tinha dificuldades para fazer amizades, o que por vezes me deixava isolado na escola. Mas quando chegava em casa, nos momentos de insegurança eu olhava para o meu pai, que para mim era um gigante em estatura e em hombridade. Olhando para ele eu enxergava essa força, e buscava nela a segurança de que precisava.
O episódio de que falei acima, e que serve um pouco para ilustrar a importância da presença da figura paterna, ocorreu na minha infância, quando eu tinha cerca de nove anos. Como já falei, não tinha muitos amigos, e era bastante inseguro e tímido. Um dia o colégio resolveu organizar uma celebração para o dia dos pais, e o evento envolvia uma reunião conjunta na quadra da escola, onde os papais se sentariam com seus filhos e fariam juntos uma arte com lápis e cartolina, para desenhar o que mais gostavam de fazer quando estavam juntos.
Meu pai é médico, e sempre se dedicou de corpo e alma à profissão, o que envolvia estar trabalhando constantemente e indo do consultório aos hospitais, em sucessivas consultas e cirurgias que muitas vezes absorviam muito de seu tempo e de sua energia, e justamente por isso naquele dia meu medo foi de que ele não conseguisse comparecer àquela comemoração.
O evento começou, e sozinho a um canto, com meus lápis e cartolina nas mãos, eu divisava toda a quadra, vendo os pais e os filhos sentados no chão, sorrindo e desenhando as coisas que gostavam de fazer. Mas meu olhar sempre recaía no mesmo lugar, na entrada da quadra, e cada vez que eu fazia isso meu coração ficava um pouco mais apertado, porque a cada segundo que passava eu tinha a certeza de que ele não compareceria.
Às vezes paro e olho para trás, para aquele menino ansioso que olhava nervoso para a entrada esperando pelo pai, e vez por outra tenho vontade de dizer para ele, “relaxa moleque, que ele está chegando”, mas se eu fizesse isso seria mais um daqueles chatos que dá spoiler, e então espero para rever a surpresa que ele teve.
E pode parecer bobagem, mas sempre que revejo essa cena sinto a mesma coisa, e uma lágrima teimosa me chega aos olhos, como acontece quando revemos aquela mesma cena emocionante do filme que gostamos, mesmo que seja pela milésima vez.
Revejo os olhos do menino brilhando quando ele vê aquele cara de branco (meu pai só trabalhava de branco), entrando lentamente e caminhando pela quadra à procura do filho. Revejo o garoto levantando a mão, ansioso para mostrar onde estava, e depois meu pai sentando comigo, como se tivéssemos a mesma idade. Lembro de alguns colegas me perguntando se aquele era meu pai (como se precisasse, já que a cara não nega), e do meu orgulho e alegria ao estufar o peito e dizer que sim.
Lembro de tanta coisa desse dia, mas confesso que não lembro o que desenhamos na cartolina, e sabe por que? Porque eu estava feliz demais com a presença dele ali para me ater ao desenho que faríamos. Mas se você me pedisse para desenhar um momento feliz com ele, esse, sem dúvida alguma, seria o escolhido.
O tempo passou, e vivemos outras situações como aquela, mas confesso que o dia dos pais na quadra da escola foi de todos o que ficou mais ricamente gravado em minha mente.
Hoje não fico mais ansioso esperando que meu pai apareça (até porque se ele não aparecer vou lá pegá-lo na marra). Mas confesso que mesmo passados tantos anos e já não sendo aquele garotinho inseguro, quando estou à espera do meu pai e o vejo chegando repentinamente eu sinto um pouco do que senti naquele dia.
O orgulho e a alegria de ter a presença do meu pai.
Um feliz dia dos pais a todos.
É chegado o São João
Abram os armários, tirem de dentro as botas, as camisas xadrez e com elas o mofo e a poeira acumulada durante meses. Aqueçam as turbinas, mexam os quadris e abram o apetite, porque a fogueira foi acesa, a comida está na mesa, e o trio prepara a canção, com sanfona, triângulo e zabumba, a emoção se aprofunda, é tempo de festa e alegria, da mais profunda euforia, de fogos brilhando no céu, de bater com os pés em tropel, de deixar entrar a emoção, de acelerar o coração, de cair na festa e na dança, nos risos e na comilança, pois é chegado o São João.
De sentir aquele cheirinho, do milho assado em fogueira, cozinhando no panelão, de se encher de canjica e pamonha, de pé de moleque e quentão. De olhar o céu estrelado, colorido e iluminado, pelos fogos que estouram no alto, de dançar de rosto colado ao som do trio de forró, sem hora para terminar, de sorrir, gritar, fazer troça, sacudir, balançar a palhoça, de espalhar o pó no terreiro, de encantar-se com o choro faceiro, da sanfona que vem se juntar, com triângulo e zabumba atiçar, os pés que marcam compasso, aumentando em cada passo, o furor a quentura e o calor, ouvindo a poesia, narrada com maestria, na voz de um cantador.
É tempo de cantar Gonzagão, Elba, Dominguinhos, Alceu, Jackson e Flávio José, de meter a bota no pé e dançar agarrado com o amor, de beijar e sentir o calor, que emana do forró, do xaxado, do baião que se curte grudado, no rosto e no corpo do par, de arrastar o passo e bailar, debaixo da noite estrelada, e adentrar pela madrugada, com alegria no coração, girando pelo pavilhão, sem hora para acabar, sem tempo para cansar, pois é chegado o São João.
E você, vai ficar aí parado? Sisudo e acabrunhado? Quieto e travado a olhar? Deixando a festa passar, sem comer, sem cantar, sem dançar? Então deixe de ser besta, sacuda o esqueleto, se mexa, e pegue sua companhia, se chegue cheio de alegria, e arraste o pé no terreiro, brincando o São João inteiro, e se o cantador parar, não espere para alto, gritar...
Puxa o fole sanfoneeeeiro!
Todos os dias
Dia das mães. Ontem fui dormir tarde, tentando estender o sábado à noite ao limite máximo, e no comecinho de um domingo onde despertei logo cedo senti os efeitos das poucas horas de sono que tive entre o fechar e o abrir de olhos. Sonolento e cambaleante fui até a cozinha, mexi nas panelas, abri a geladeira e fui organizando da minha forma desorganizada o café da manhã que faria a seguir para a pessoa que ainda ressonava.
Enquanto ia fazendo aquilo minha mente dava o play em um filme onde algumas cenas especificamente selecionadas iam passando pouco a pouco. Nelas eu via um molequinho magricela e cabeçudo resmungando por acordar cedo enquanto a contragosto vestia a farda da escola e em seguida ia tomar um caprichado café da manhã que já estava à sua espera.
O molequinho, claro, era eu, e a pessoa que pacientemente me acordava (o “pacientemente” não era uma constante, mas mereceu ser mencionado) e que colocava minha farda e fazia meu café era a mesma que ressonava no quarto naquele início de domingo.
A cena mudou, e logo em seguida deu lugar a outra onde o molequinho saía acabrunhado da escola, levando displicentemente uma mochila do He-man enquanto entrava no carro sendo levado por uma mãe que estava repleta de afazeres, e que logo depois de deixa-lo em casa e pacientemente esperar que almoçasse, ainda voltaria para o escritório para trabalhar pelo restante do dia.
Outras cenas passaram na minha cabeça, e em nenhuma delas eu aliviava muito o trabalho que dera à minha mãe no cansativo processo que é educar e cuidar de um filho, e organizando a mesa do café da manhã eu pensei o quanto injusto era o dia das mães. Sim, injusto mesmo. “Ora”, você pode dizer, “é injusto comemorar o dia das mães, homenageando quem tanto fez por nós?”
Sim, é injusto pacas, porque fazemos isso em apenas um dia, quando o ano possui outros 364 onde aparentemente não damos a devida importância a tanto esforço e tanto amor que nos foi dedicado, e ainda é, porque, caras e caros, vocês acham que mesmo já sendo moçoilas e marmanjos suas mamães deixaram de se preocupar com vocês? Se pensam assim, já lhes informo. Esse é um ledo engano.
A gestação de uma mãe não dura apenas nove meses, mas uma vida inteira, e mesmo estando fora de suas barrigas, já sem o vínculo físico que o cordão umbilical proporciona, o vínculo afetivo e espiritual jamais é cortado, e basta um espirro ou uma dor na unha para que essas mulheres incríveis deixem tudo o que estão fazendo para virem correndo tomarem conta de seus rebentos (mesmo que esses rebentos já estejam com seus próprios filhos e netos).
Ainda acham justo o dia das mães? Ainda acham justo um dia das mães?
A vida de um ser humano dura em média setenta a oitenta anos, em alguns poucos e privilegiados casos chegam aos cem. Façamos então uma conta hipotética. Digamos que uma mulher seja mãe aos vinte e cinco, e suponhamos que ela viva até os cem. Isso faz com que a relação materna dure ao menos setenta e cinco anos.
Setenta e cinco anos, transformados em dias dão um total de vinte e sete mil, trezentos e setenta e cinco dias, fora os anos bissextos, que não incluí porque sou péssimo com números, e o que citei acima já é o bastante para ilustrar meu ponto de vista.
Pois bem, se uma mãe viver cem anos, com base no cálculo acima, ela terá dedicado mais de vinte e sete mil dias aos filhos que colocar no mundo, amando, educando, cuidando e preparando-os para a vida. E só dedicamos um dia por ano a essas pessoas. Ainda acham justo?
Eu não, e enquanto preparava a comida eu pensava nisso tão absorto que não reparei que ela tinha acordado, e num piscar de olhos já estava ali, de pé, me ajudando a fazer o café que eu levantara mais cedo para fazer a fim de homenageá-la. Ou seja, nem no dia das mães elas param.
É com essa consciência que tento, sempre que minha posição de filho cheio de falhas me permite, lembrar de dedicar algumas horas a ajuda-la, ou mesmo a dar um beijo ou abraço quando ela não está esperando. Nem sempre consigo, mas é como dizem por aí, o que vale é a tentativa, mesmo que elas não esperem ou exijam isso, porque como é de pleno conhecimento de quem tem o privilégio de ser mãe, o amor que elas sentem é incondicional.
É Dia das mães. Tomei o café que fiz (sem lá muita habilidade) com ela, e depois saímos para almoçar em família, e olhando para as mamães que estavam nas outras mesas o pensamento que tinha começado a se formar no começo daquela manhã foi completado, e com ele concluí... como vocês, mães, são porretas! Especialmente a minha.
É com isso que lhes desejo um feliz dia das mães. Ou melhor, felizes dias, para todas vocês, e em especial para a minha, que claro, é a melhor de todas.
Silêncio
Você já ouviu o som do silêncio? Alguns podem estranhar essa pergunta, outros podem responder que sim, mas fazendo menção à célebre canção de Paul e Simon Garfunkel (The Sound of Silence), gravada na década de sessenta e que até hoje encanta pela beleza ímpar que possui.
Mas não, não estou me referindo à música citada acima, e sim ao apaziguador e ao mesmo tempo ensurdecedor rumor causado pelo tão profundo agente conhecido como silêncio.
“Que contradição”, você pode dizer. Ou, “que lógica existe em escutar algo cuja principal característica é exatamente a ausência de som?” Bem, se fizermos uso da lógica da razão, de fato ouvir o que não se pode ser ouvido é algo completamente fora de propósito.
Mas e se utilizarmos a lógica da emoção? Bem, aqui a coisa já muda de figura, como tudo o que habita nesse campo tão propenso a imaginações férteis e interpretações admiráveis.
Nesta seara o som do silêncio não apenas pode ser ouvido, como também possui inúmeras vozes que falam ao nosso íntimo conforme nos aprofundamos na calma que é necessária para que possamos prestar atenção no significado do que é sussurrado em nossos pensamentos. Sim, neles, pois é no interior da calmaria e do caos que é nossa mente que podemos escutar com clareza o que nos é dito.
É no silêncio da introspecção que conseguimos ouvir o que ele tem a dizer, seja na voz da razão, da emoção, do entendimento ou da compreensão, e para isso basta prestar atenção. Está com algum problema? “Duas cabeças pensam melhor do que uma”, muitos dizem, e isso é verdade. Mas não são poucas as vezes em que nos perdemos na algazarra de muitos sons, de muitas opiniões, encontrando o rumo apenas no momento em que nos deixamos levar pela calma que leva àquele conhecido estado em que não ouvindo nada, acabamos escutando tudo.
Confuso demais? Vou tentar simplificar. É quando entramos no estado de tranquilidade que o silêncio nos proporciona que nossa mente fica mais aberta a pensar de forma lúcida e completa, ouvindo os prós e os contras que os pensamentos trazem sobre cada problema, ou sobre cada situação. São essas as vozes que representam o som do silêncio, como um grande coral que integra uma orquestra que toca a música que leva à compreensão.
Esse, em uma linguagem poética e de uma certa forma até mesmo científica, é o som do silêncio ao qual me refiro, e que ganha outras nomenclaturas, a depender da forma como o enxergamos (ou ouvimos).
E de todas elas, a minha preferida é que a Voz do silêncio, a principal delas e que leva a todas as outras é uma só. A Voz de DEUS.
Então, quando os problemas apertarem e a mente se tornar um turbilhão confuso e caótico, pare um pouco, respire e tente ouvir a Voz que tem tanta coisa para te contar.
Garanto que essa Voz vai ter muito a dizer.
E você, já ouviu o som do silêncio?
O Aniversariante
Você já presenteou o aniversariante de hoje?
A tradição e a boa educação ensinam que sempre devemos, dentro de nossas possibilidades, presentear o aniversariante do dia, nem que seja com uma palavra de carinho e com desejos de um feliz aniversário, sendo um sinal de indelicadeza e de falta de consideração esquecer ou mesmo ignorar uma data tão especial.
Então pergunto, você já presenteou o aniversariante de hoje? E vou mais além, como se sentiria se alguém que amasse muito esquecesse seu aniversário?
Vamos a uma situação hipotética. Digamos que você tenha uma família enorme, repleta de pessoas por quem nutre um amor imensurável, e que espera que lhe destinem o mesmo sentimento. Chega então o seu aniversário, dia especial, em que se espera no mínimo um beijo, um abraço e um desejo de felicidades, e no máximo, bem, no máximo o céu é o limite.
Mas para o seu espanto o dia chega e ninguém parece lembrar da data, que passa em branco como se fosse um dia qualquer. Chato, não é?
Agora vamos potencializar um pouco. Imagine então que além de não lembrarem da data, parecendo ignorar todo o significado e importância daquele dia, essas mesmas pessoas que você tanto ama passem a lhe tratar mal, com desrespeito, com intolerância, com desdém e agressividade. Muito pior, não é? Sentiu como é ruim?
Renovo então a mesma pergunta que fiz no início do texto. Você já presenteou o aniversariante de hoje? Se sim, qual presente você deu? Amor, carinho, respeito e admiração? Ou desdém, desrespeito ignorância e rejeição? Você ao menos se lembrou que era o dia do aniversário dessa pessoa? Ou simplesmente ignorou e esqueceu?
Você sabe de que pessoa estou falando? Sabe quem é o aniversariante de hoje? Alguém chamado Jesus. Alguém que te ama como nenhum amigo ou familiar seu vai amar. Alguém que não vai te tratar com desrespeito ou desdém. Alguém que não vai te ignorar ou te esquecer, e alguém que sempre vai lembrar de você, não importa qual dia seja.
O aniversário hoje não é do velhinho que leva presentes dentro de um saco depois que lê cartinhas deixadas em uma árvore, mas sim daquele Cara que há muito tempo atrás deu o maior presente que você poderia receber em toda uma existência, em toda uma eternidade... a própria vida em expiação dos teus pecados. E esse presente Ele não te deu uma só vez, mas te dá todos os dias.
Então por que você... aliás, por que nós não começamos a lembrar do aniversário Dele, e de lhe dar o único presente que Ele deseja receber, que é o nosso amor? É tão difícil fazer isso? Pensemos a respeito, afinal, para tanto, basta lembrar das perguntas feitas acima, e do sentimento que teríamos se quem tanto amássemos nos esquecesse. Será que não é assim que Jesus se sente quando o esquecemos?
Que nesse Natal possamos esquecer dos presentes materiais, dos produtos, das roupas, da marca comercial que se tornou São Nicolau, e passemos a dar à data o real significado que ela tem. O dia que marca a chegada de um Menino que nos foi dado, para expiar nossos pecados e nos salvar da morte além da morte.
Um Menino, um Jovem, um Homem, um DEUS que deu sua vida pela nossa, o que é a maior prova de amor que alguém pode receber.
Que possamos dar ao aniversariante o presente que Ele merece receber. O nosso respeito, a nossa dedicação, e principalmente, o nosso amor.
Um Feliz e Abençoado Natal a todas e todos.
Caverna
Você trocaria o calor do que é real pela frieza do que é virtual? Escolheria a pílula azul ao invés da vermelha? Preferiria viver no interior de uma prisão que lhe daria a falsa sensação de sentir-se livre? Em um mundo onde as pessoas cada vez mais escolhem as sombras do mito da caverna em detrimento das cores da imensidão que há fora dela, essas perguntas ganham uma importância que sequer pode ser mensurada.
O mito exposto por Platão nunca foi tão atual quanto agora, em que os grilhões invisíveis de uma prisão onde o carcereiro é o próprio prisioneiro se mostram em telas de computador, celulares, gadgets e uma infinidade de aplicativos e programas que chegaram com uma proposta de unir, mas que acabaram afastando ainda mais as pessoas umas das outras e dos próprios objetivos que com tanto afinco almejam alcançar.
Não que o cronista tenha algo contra estas tecnologias, de forma alguma. A crítica que se tece é à forma com que são usadas, acabando por se transformarem em uma fuga da realidade, uma forma de esconder-se e de evitar exatamente o que se quer tanto viver, em um sentimento paradoxal em que o medo de buscar vivenciar o que sempre se desejou se torna tão grande que a saída encontrada é ocultar-se em um mundo de faz de conta em que ao menos parte da realidade tal almejada pode ser visitada de forma ilusória.
Mas essa sensação momentânea de satisfação é logo desmontada, cedendo como um castelo de cartas tão logo se percebe que o que é virtual não pode ser tocado, não pode ser sentido, não pode ser de fato vivido em sua integralidade, e assim aqueles que se ocultam nesse mundo de faz de conta acabam buscando cada vez mais esse lugar, na vã esperança de que o breve senso de satisfação possa ser revisitado ou mesmo ampliado, da mesma forma que o faz um viciado que toma doses cada vez maiores da droga da qual torna-se dependente, para encontrar apenas a frustração e o desejo constante de tomar mais e mais, sem nunca vivenciar o de fato se deseja.
A saída? Está nas mãos de cada um. Nesse caso o próprio prisioneiro é dono da chave de sua prisão, cabendo a ele dela sair para encontrar o que de fato existe lá fora, e só assim decidir se seguirá adiante, vivendo a plenitude de tudo o que envolve a realidade, ou se replicará a atitude do fugitivo do mito da caverna, que espantado demais com o mundo lá fora, acabou voltando para as sombras de seu cárcere, que lhe davam a falsa impressão de um conforto e de uma segurança que apenas disfarçavam a verdade de que havia algo muito maior para ser vivido no exterior de sua toca escura.
Eis a dúvida que a modernidade nos traz.
E você, já fez sua escolha?
Rancor
Imagine-se tomando um veneno extremamente nocivo e doloroso, mas que não mata de uma vez, instantaneamente, de imediato. Ele mata aos poucos, lentamente e de forma extremamente incômoda. Às vezes leva anos, talvez até mesmo décadas te consumindo, te desgastando, tolhendo de você a calma e a alegria necessárias para viver os seus dias em paz.
Ruim, não é? Péssimo seria a expressão mais correta a ser usada. Então você pode perguntar, quem em sã consciência, faria uso de um veneno desse tipo? A resposta que pode te causar espanto é, muita gente. Mas muita gente mesmo. São tantas as pessoas que bebem desse mal que alguém pode se questionar se o mundo está doente a ponto de uma parcela tão grande da população estar em busca de um sofrimento desse.
Mas o problema é que a maior parte dos que bebem dessa substância sequer tem consciência de que estão consumindo algo tão ruim, e assim continuam suas vidas achando que tudo está na mais perfeita normalidade. Que tudo está indo conforme o planejado. E sabe qual o nome desse veneno? Um que talvez você mesmo esteja tomando nesse exato momento? Rancor.
Guardar rancor, do que ou de quem quer que seja faz com que você carregue um peso invisível, mas que indubitavelmente está lá. E aos poucos esse peso te exaure, assim como o veneno que ele representa te contamina, te suga, te consome até que não reste nada mais do que uma alma murcha e dolorida, que vive apenas de relembrar um passado doloroso em que algo ou alguém te fez algum mal que não foi esquecido.
E o pior é que com o tempo esse mal acaba se transformando em um vício para muitas pessoas, que pautam suas vidas em alimentá-lo, em cultivá-lo, em fazê-lo crescer e se espalhar, tentando também contaminar aqueles que estão ao seu redor. Inconscientemente elas se acostumam tanto a ele que se tornam dependentes, vivendo em um ciclo vicioso em que alimentam o próprio distúrbio que as consome.
Mas qual o remédio para isso? É muito fácil de ser encontrado, mas o acesso a ele é difícil. Muito difícil, especialmente para quem já está tão acostumado a essa peçonha. Só que não há estágio que esteja além da cura, por mais avançado e enraizado que esse mal esteja. A cura não é fácil, mas pode ser encontrada. A cura, é pura e simplesmente o perdão.
Parece simples, não? Mas não é. Se perdoar fosse fácil esse ato não seria tão valorizado como é, e nem tão libertador como pode ser. Mas é como diz o sábio, as maiores conquistas, aquelas das quais mais nos lembraremos serão as que foram mais difíceis de serem alcançadas. E essa é a lembrança que vale à pena. Recordar de um ato que um dia te fez mal, de alguém que te prejudicou, mas relembrar sem sofrer, sem remoer, sem odiar, sem se consumir, sem desejar vingança.
Pura e simplesmente isso, lembrar que um dia deixou aquele mal ir embora. Que aquela pesada bagagem foi deixada para trás, e que aquele veneno que te consumiu foi extirpado e lançado para fora de sua mente e de seu coração.
O perdão é tão importante e tão libertador que está na principal oração que nos foi dada por ninguém menos que Jesus Cristo, que também nos disse que antes de deixar uma oferenda no altar, se reconcilie primeiro com o irmão com quem possui algum desgaste ou entrevero, para só depois voltar e levar sua oferenda a DEUS.
Forte, não é?
É essa a importância do perdão, e é esse o mal que traz o rancor. Então escolha não levar consigo algo que só faz mal a si próprio, porque muitas vezes a pessoa que te prejudicou sequer lembra disso, ou nem mesmo tem consciência de que o fez, enquanto você fica aí, levando esse peso que te exaure, bebendo esse veneno que te mata aos poucos.
O rancor não deve ser guardado, mas sim lançado fora, eliminado, obliterado da sua vida. Não é fácil, nem nunca será. Mas esse é o difícil que vale à pena ser lembrado lá na frente. Então, abra suas gavetas e tire delas todo o rancor. Pode até demorar, mas um dia, quando o perdão te transformar em alguém mais leve e mais limpo, você verá o tamanho da recompensa que essa atitude te trará.
A recompensa da paz.
O Muito e o Pouco
Quem pouco tem, um pouco mais almeja. Quem muito tem, o todo que há deseja. Pensei nessa frase enquanto, como se diz pelo lado de cá, matutava sobre alguns assuntos, dentre eles o tamanho do “desejo pelo ter” que muitos alimentam durante suas vidas, e que para alguns curiosamente não se satisfaz conforme se conquista o que queria, mas apenas aumenta, em uma sanha sem fim por possuir mais, e mais, e mais.
Não que eu esteja criticando o ato de almejar e de querer crescer, de forma alguma. Agir de tal maneira é justo e produtivo, e muito se conquistou até hoje pelas ações daqueles que desejavam algo e que se atreveram a buscar esse algo, mesmo com o mundo os criticando e os desacreditando na procura por seus desideratos.
A crítica, se é que me atrevo a chamar desta forma essa singela crônica, é sobre o ato de ter, e ter, e ter, em uma repetição sem fim deste verbo faminto que pauta a vida de muitas pessoas que traçam sua existência movidas pelo anseio de conquistar e acumular, chegando ao curioso comportamento de sequer do produto de suas conquistas fazer proveito no decorrer de seus dias, emulando o comportamento do bom e velho Tio Patinhas, cômico nos quadrinhos, mas triste na vida real, guardando suas fortunas em uma caixa forte enquanto esvaziam as reservas de seus corações e seus espíritos.
É o chamado ter pelo ter, chegando-se ao ponto de querer o mais pelo simples desejo de possuir, mesmo que já não se precise daquilo. Os gastos com alguns membros do judiciário é um bom exemplo. É de conhecimento quase que geral que os rendimentos de juízes e promotores é consideravelmente alto, se comparados com o que recebem outros profissionais.
No entanto, uma polêmica constantemente revisitada (mas nunca resolvida) é o famoso auxílio para moradia que estes servidores recebem, especialmente quando verificado que não possuem apenas um, mas diversos imóveis próprios, o que indica que não precisariam desta verba. Mas então faz-se a pergunta essencial, quantos deles abrem mão deste auxílio? Quantos aceitariam de bom grado deixar de recebê-lo?
Ao mesmo tempo olha-se para o gari, para o empregado, para o operário que é assalariado e vive em um pequeno barraco que muitas vezes mal se aguenta de pé, sendo este sim o destinatário correto da verba citada acima. O curioso, é que quando lemos as famosas reportagens que mostram os casos em que grandes somas de dinheiro foram perdidas por alguém e encontradas por outras pessoas que as devolveram, vê-se que quase que na totalidade aqueles que localizam tais valores são pessoas humildes, com poucas ou nenhuma posse, para quem tais somas seriam verdadeiros alívios. Mas ainda assim elas as devolvem.
O mesmo pode ser dito de quem recebe um auxílio de valor considerável, legalmente previsto, mas moralmente reprovável? É uma pergunta que fica no ar.
Uma vez mais esclareço que não critico a busca pelos sonhos, por construir, e, claro, também, pelo ganhar. O cerne aqui não é o ter, mas a vontade insaciável de ter mais e mais, e como bem diz a sabedoria popular, “quem muito quer, tudo perde”, ou “tudo em excesso faz mal”, especialmente quando se pauta toda uma vida com base no verbo “acumular”.
Por isso, meus caros, vamos acumular sim, mas sabedoria nas busca dos nossos sonhos, para que quando os alcancemos possamos aproveitar bem os frutos que deles resultam, e até mesmo dividi-los com aqueles que não conseguiram o mesmo sucesso.
Façamos como o célebre Ebenezer Scrooge, em “Um Conto de Natal” de Dickens, que deixou de ser um orgulhoso avarento que só pensava em juntar e juntar, para ser, como bem narra o livro, “o melhor amigo, o melhor patrão, e o melhor homem que a boa e velha cidade havia visto”, mostrando que o maior tesouro que podemos acumular, é a sabedoria.
The Doors
A crônica de hoje é pessoal, é tudo o que posso adiantar nessas primeiras linhas, além de deixar claro que ela não é Rock ‘n roll, apesar de tratar do Rock n’ roll.
Na verdade, para ser devidamente compreendida ela deve ser lida conjuntamente com o conto publicado, servindo a mesma também para esclarecimento da narrativa ali estabelecida.
De início, como um grande fã do bom e velho Rock ‘n roll, não poderia deixar passar em branco a data celebrada no último dia 13 de julho, marca comemorativa deste tão célebre e admirado gênero musical, que tem espalhado pelo mundo e pelos ouvidos dos mais atentos suas canções carregadas de romance, revolta, poesia, crítica social, ou pura e simplesmente de um escracho inteligente e sagaz, ou vocês não lembram dos inesquecíveis Mamonas Assassinas?
Mas esse ano o mês de julho coincidiu também com um marco importante para a história do Rock. Dez dias antes, em 03 de julho, foi celebrada a passagem dos cinquenta anos da morte de Jim Morrison, um dos maiores expoentes deste gênero musical, o que me levou a optar por escrever especificamente sobre a banda por ele liderada, cujo nome foi cunhado fazendo uso de uma citação da autoria de um dos maiores escritores que já existiu.
O escritor? Aldous Huxley. A banda? The Doors.
Formada em meados da década de sessenta, quando o sexo e o amor livre mesclavam-se às drogas e às músicas, o The Doors nasceu do reencontro de dois colegas do curso de cinema da UCLA, célebre faculdade de Los Angeles, Califórnia. Os ex-alunos eram James Douglas Morrison, um jovem de alma sensível e olhar provocativo, e Raymond Daniel Manzareck, um talentoso musicista formado em piano clássico e de gênio criativo.
Naquele dia, Jim cantou para Ray algumas músicas de sua autoria, que compusera enquanto imaginava um concerto em sua própria cabeça. Manzareck ficou extasiado com o talento de Morrison, e rapidamente decidiram formar uma banda, batizada com a já destacada citação de Huxley.
“Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito”.
As portas da percepção... As portas... The Doors. Nascia ali uma das maiores bandas de Rock n’ roll de todos os tempos.
Depois disso, o resto é história. A Jim e Ray se juntaram John Densmore, um talentoso baterista que trouxe ritmo ao conjunto, e Robbie Krieger, um virtuoso especialista em guitarra flamenca, que diversamente da maior parte dos músicos, tocava o instrumento com as unhas, e não com uma palheta.
Para muitos o som formado por aqueles quatro, mesclado à profundidade poética das letras de Morrison, era algo estranho. Estranhamente envolvente. Estranhamente atraente. Afinal, como diria o próprio Jim em uma de suas músicas mais famosas, “People Are Strange” (pessoas são estranhas), o que casava bem até demais com o estilo do conjunto.
A banda então passou a tocar em pequenos bares de Los Angeles, até que a estranha música chegou aos ouvidos de Jack Holzman, empresário da gravadora Elektra Records, que encantado com o som daquele quarteto resolveu contratá-los para gravar um álbum. Em seis dias o disco estava pronto, e o sucesso veio tão rápido quanto a gravação.
Ao primeiro álbum, nominado apenas de “The Doors”, seguiram-se “Strange Days”, “Waiting for the Sun”, “The Soft Parade”, “Morrison Hotel” e “L.A Woman”, que fincaram de uma vez por todas o nome da banda no hall da fama da música mundial.
Mas depois de uma carreira meteórica de pouco mais de cinco anos, marcada pelo sucesso e pelas polêmicas esporadicamente causadas pelo comportamento de Morrison, resultantes de pesadas bebedeiras que levaram inclusive à prisão do cantor e a um incômodo processo que culminou com uma perseguição da própria mídia, os integrantes resolveram dar um tempo na banda, e depois de gravarem o excelente L.A. Woman, Jim decidiu ir morar em Paris com sua companheira Pamela Courson, a fim de dedicar-se à sua grande paixão, escrever.
No entanto, na madrugada de 03 de julho de 1971 a voz dos Doors calou-se para sempre. De acordo com relatos, Pam, como Pamela era conhecida, encontrou Jim morto na banheira do apartamento dos dois em Paris, e a morte foi atribuída a um ataque cardíaco, que o levou aos vinte e sete anos de idade.
A partir de então, os mistérios que envolveram a morte de Jim, aliados ao desejo de muitos fãs de que o artista não tivesse morrido, e somado à escolha de um dos autores preferidos de Morrison, Arthur Rimbaud, se tornaram um prato cheio para a criação da teoria de que o Rei Lagarto (apelido do cantor) não morrera de fato, mas estaria vivo, vivendo no anonimato.
Rimbaud foi um dos maiores escritores e poetas do mundo, e no auge da fama abandonou tudo para viver no anonimato. Muitos fãs então passaram a acreditar que Jim, cansado da fama e insatisfeito com a vida de rock star fizera o mesmo. Neste ponto, é importante destacar que apesar de todo o sucesso alcançado, Morrison era na verdade um poeta, e almejava viver apenas como um escritor, tendo inclusive lançado em vida dois livros de poesia, “The Lords and The New Creatures” e “An American Prayer”, que foram bem recebidos pela crítica.
Mas como o próprio Jim dizia em um trecho de Roadhouse blues, canção de grande sucesso da banda, “The future is uncertain, and the end is Always near” (o futuro é incerto, e o fim está sempre por perto), e o fim chegou para Morrison, que não teve tempo de brindar o mundo com um pouco mais de sua obra. Mas ainda assim deixou um legado de poesias em forma de música que continuam a angariar fãs até hoje.
Um desses fãs foi um garoto de dezesseis anos que identificou-se com o som estranhamente encantador da banda e com as mensagens eternizadas na poesia de Jim. E esse jovem era esse que vos escreve, e que por vezes chegou a imaginar um breve e improvável encontro com esse expoente do rock para conversar sobre tudo e ao mesmo tempo nada.
Foi movido por isso que resolvi finalmente escrever, de uma forma resumida, admito, e até mesmo simplória, sobre esse encontro, e o imaginei no mesmo ambiente em que Jim e Ray Manzareck (falecido em 2015), se encontraram para que Moonlight Drive fosse cantada e os dois decidissem fundar a banda. Uma praia.
No conto inovei me incluindo como personagem desse encontro, e o velho que se aproxima é de fato Jim Morrison, que na minha imaginação fez valer a teoria da conspiração de que teria forjado a própria morte e ainda estaria por aí, rodando em seu velho Dodge clássico e escrevendo poesia de gente grande. Na história, me permiti perguntar algo que de fato o perguntaria se tivesse a oportunidade de conhece-lo. Se ele realmente encontrara a paz de que precisava.
E me alegro por ele ter respondido que sim.
Foi por influência de Morrison que aos dezesseis anos comecei a me arriscar a escrever poesias. Algumas ainda tenho guardadas em um pequeno caderno, mesmo após vinte e três anos contados do dia em que as escrevi, e quer saber? Podem não possuir a mesma qualidade das dele e das de outros poetas, mas as amo tanto quanto as que escrevo hoje em dia.
Foi por isso que resolvi fazer essa singela homenagem a esse poeta e escritor, e hoje mais do que nunca compreendo a razão que levou Jim a amar a escrita. Ela nos proporciona a oportunidade não apenas de construir, mas de habitar em mundos cheios de encantamento, formados nos recônditos de nossas imaginações (para mim, são informações sopradas por DEUS em meu ouvido, que acabo transcrevendo, e nas quais me lanço e vivencio cheio de alegria e gratidão).
Por fim, nessa crônica disfarçada de homenagem e fantasiada de uma narrativa biográfica, esclareço que as aspas utilizadas no conto em determinadas frases são para destaca-las por serem nomes ou trechos das músicas do The Doors, e que foram assim ressaltadas em virtude da dificuldade que teria para fazer com que fossem identificadas como tais em decorrência da tradução, algo que provavelmente só seria percebido por um fã da banda.
Bem, feita a homenagem aqui me despeço, não dizendo “This is the end”, como na minha música favorita da banda, mas pura e simplesmente um até breve, se DEUS quiser.
E um feliz dia mundial do Rock para vocês.
Olha pro céu
Lá fora as estrelas brilham no céu limpo, cintilando como se tivessem colocado suas melhores roupas para essa noite especial. Abaixo delas, a enfeitar ruas e casas, as bandeirolas se espalham coloridas, enchendo de tonalidades os olhos dos passantes e dos ficantes, enquanto pelas ruas as fogueiras crepitam, iluminando o ambiente e aquecendo os corpos e corações de quem acompanha todo esse espetáculo.
Crianças correm felizes, brincando com seus traques, soltado as cobrinhas e ratinhos, espalhando as faíscas coloridas de vulcões, árvores de natal e chuveirinhos, e até mesmo o estampido quase ensurdecedor das bombas possui o seu próprio encantamento. E como para finalizar o espetáculo, trazendo a cereja para esse bolo delicioso, surge o som choroso e manhoso da sanfona, que mexe e sacode o coração de qualquer nordestino apaixonado por essa terra encantada, anunciando que a época tão aguardada finalmente chegou. É São João.
É tempo de vestir a camisa quadriculada de flanela, o vestido estilizado, o chapéu e a bota, para gastar a sola forrozando no salão lotado. É época de se empanturrar de pamonha, canjica, pé de moleque, milho assado e todos os pratos característicos dessa terra especial. É o momento de suar aos borbotões batendo coxa com o par e dançando animado na quadrilha improvisada, de soltar traque, bomba e foguetão com a molecada, e olhar para o céu agarradinho, de mãos dadas com a namorada.
É época de arrastar o pé no chão de terra batida, de dançar e cantar ao lado da família reunida, e de parar à meia noite para ver a queima de fogos colorindo o firmamento enquanto o coração bate mais forte ouvindo o hino que enche o peito de nostalgia e alegria. “Olha pro céu meu amor...”
Êh, São João, tempo bom que deixa saudade e alimenta a vontade de viver novamente essa noite de festa, seja no cantinho do lar, seja na rua de gente repleta, com a alegria e o calor que o bom nordestino carrega no peito, que queima como uma fogueira acesa e ecoa como um forró animado, dançando juntinho e agarrado debaixo do céu estrelado, sem hora para findar toda essa animação. Êh, São João.
E como bom nordestino que sou, vou parar de me alongar aqui para ir lá fora curtir a festa que me aguarda junto com meu par, meu milho e meu forró, onde a fogueira e a noite estrelada convidam para essa festa tão esperada, para dançar e festejar até o sol raiar.
Olha pro céu meu amor...
Ame-se
Dia dos namorados, data especial em que os casais celebram a alegria da união com presentes, declarações, poesias, lembranças, jantares à luz de velas e tudo o mais que a criatividade e o romantismo permitirem, felizes por terem encontrado as tampas de suas panelas, ou na linguagem do dito mais popular, “os chinelos velhos para seus pés cansados”.
Mas fujamos um pouco à realidade romantizada dessas felizes duplas para encontrarmos aquelas pessoas que vivenciam esse evento na singularidade de suas próprias companhias, os famosos solteiros. Para alguns deles, o dia dos namorados é uma data para ser esquecida, para outros, irrelevante, e para uma terceira parcela, momento para promover orações, simpatias e mais algumas receitas para encontrar a pessoa amada.
Alguns se lamentam, suspirando enquanto assistem filmes ou séries românticas. Outros vão à luta, lançando-se em baladas, aplicativos ou sites de encontros em busca daquela que pode vir a ser a pessoa amada. E existem também aqueles que aprisionam o coitado do Santo Antônio, deixando-o cativo até que do nada surja o príncipe ou a princesa diante da porta dos castelos de seus próprios contos de fadas.
Mas me permitam alguns questionamentos. Acaso essas pessoas de fato apareçam, estarão os que se encontram na espera prontos para com elas assumirem um relacionamento? E se esses príncipes ou princesas nunca surgirem, significa que o mundo será um lugar sem sentido? A essas perguntas somo a terceira e mais importante delas, estamos preparados para sermos felizes sozinhos?
Seguindo a linha do primeiro questionamento e supondo que a “tampa da panela” apareça, como então ela encontrará essa mesma panela? A uma boa temperatura enquanto cozinha calmamente o conteúdo que há ali dentro a fim de servir um delicioso prato, ou fervendo descontroladamente a ponto de queimar o alimento ou mesmo explodir, pondo tudo a perder?
A pergunta se faz necessária porque muitas pessoas passam uma vida colocando nas costas da “metade” que está por vir a ingrata responsabilidade de fazê-las felizes, quando elas mesmas deveriam dar-se conta de que são as verdadeiras responsáveis pela própria felicidade, e quando este príncipe ou princesa não consegue lograr êxito em tal intuito, mesmo depois de tentar com afinco, a “panela” explode de frustração culpando o amor e até mesmo a própria tampa por não conseguir ser feliz.
No entanto, se tal pessoa amadurece a ponto de perceber que é ela mesma a responsável por ser feliz, a tampa que há de vir encontrará uma panela cozinhando calmamente o alimento que há ali dentro, e o esforço empreendido será conjunto, culminando então em um delicioso prato. Não entendeu? Então deixemos de lado as analogias com comida e sejamos diretos.
Se você tem a percepção de que a felicidade depende inicialmente de seu próprio esforço e de estar em paz consigo mesmo, então não colocará nas costas de um terceiro a responsabilidade de ser feliz, evitando assim uma frustração que quase certamente virá, e ganhando um aliado para ser feliz ao invés de jogar toda essa carga em cima de uma pessoa só.
O mesmo raciocínio vale para a hipótese de o amor de nossas vidas não aparecer. Caso essa busca seja infrutífera e a tão sonhada alma gêmea nunca apareça, isso será motivo para a infelicidade? Se a resposta for positiva, o que isso pode significar?
Pode significar que a pessoa que tanto alimentou esse desejo não aprendeu a ser feliz consigo mesma, e que colocou a responsabilidade por ser feliz não nos ombros do alguém que desejou com tamanho afinco, mas na conta do sentimento que nutriu por dias e dias sem fim. O amor idealizado em sonhos baseados em romances de faz de conta.
Nesse ponto, é crucial que percebamos que os príncipes e princesas encantadas existem sim, mas não surgirão repentinamente em cavalos brancos e em torres de castelos, prontos e prontas para serem amados enquanto o sol se põe dividindo a tela em letras garrafais anunciando “e foram felizes para sempre”.
Os príncipes e princesas encantadas existem, mas não surgirão repentinamente porque já estão ali. Sempre estiveram. Somos nós mesmos nossos príncipes e princesas, e enquanto não aprendermos a amá-los, cientes de que somos os principais responsáveis por nossa própria felicidade, não conseguiremos ser felizes com mais ninguém, porque estaremos idealizando no outro algo que na verdade nos compete conseguir.
Se você não se ama, se não aprendeu a se amar na sua singularidade, na sua posição de companhia de si mesmo, sinto dizer-lhe, mas mesmo que a mais bela das princesas ou o mais corajoso dos príncipes surja bem diante de seus olhos, a sua felicidade não passará de uma história de contos de fadas, porque não cabe a outrem levar nas costas a gigantesca responsabilidade de sozinho fazer o outro feliz.
Portanto, antes que a tampa de sua panela apareça verifique se a temperatura está correta, ou mesmo se o fogo já foi aceso, e caso ela não surja, não se preocupe. Existem alimentos que podem ser preparados com a panela descoberta, e que ficam tão deliciosos quanto os demais, ou, sendo mais direto, primeiro seja feliz consigo mesmo para ser feliz com outro alguém, e se não aparecer ninguém, a sua própria companhia já poderá lhe ser suficiente para que tudo fique bem.
Não pense que você é uma metade esperando a outra que irá lhe dar completude. Pense em si mesmo como alguém inteiro.
O melhor relacionamento será aquele em que a outra pessoa te namorar como você namora a si mesmo, então, ame-se, para poder ser feliz amando outro alguém.
Um feliz dia dos namorados.
Mãe
“Feliz dia das mães”, é o que muitos dizem naquele famoso segundo domingo de maio ao presentearem suas genitoras com as lembranças que levaram e que acharam que seriam do seu agrado. Alguns fazem o café da manhã e o levam na cama, outros levam suas mães para um delicioso almoço em um dos melhores restaurantes da cidade, ou fazem aquele maravilhoso churrasco na laje em homenagem àquela que os carregou nove meses na barriga.
Sim, é um domingo que fica marcado na memória. Mas o que acontece no dia seguinte? Na segunda-feira haverá café na cama? Haverão churrascos, restaurantes sofisticados, presentes caros, discursos ou simplesmente um singelo abraço com um rápido, porém sincero, eu te amo?
Na segunda-feira haverá ao menos um telefonema, ou simplesmente uma mensagem de WhatsApp perguntando como ela está, ou meramente desejando um bom dia? Você ao menos se dará ao trabalho de ler aquela mensagem enviada com o meme de um cachorrinho, ou mesmo mentir dizendo que assistiu o vídeo de 349575843898 minutos que ela te enviou?
Se você respondeu positivamente alguma, ou todas essas perguntas, parabéns, isso significa que é uma boa filha ou um bom filho. Mas se nenhuma das respostas que deu para essas questões foi sim, isso quer dizer que, assim como esse que vos escreve, vossa senhoria deve se esforçar um pouco mais.
“Ah, mas eu sou muito ocupado”, alguns podem dizer. Sua mãe também era muito ocupada, mas sempre deixava tudo de lado para cuidar de você. “Ah, mas eu não tenho tempo”. Sua mãe dedicou nove meses para te levar no ventre, e uma vida inteira para te levar no coração, e você está aí dizendo que não tem apenas alguns minutinhos para ela.
“Ah, mas eu tenho minha própria família agora”. Sua família nunca deixará de ser aquela que lhe deu o primeiro lar, o primeiro beijo, o primeiro aconchego, e que estará sempre disposta a dar-lhe novamente tudo isso, como se fosse a primeira vez.
Portanto, deixemos de lado as desculpas para dedicarmos um pouco mais do nosso tempo a quem nos dedicou tanto de tudo o que tinha, então, ligue, mande mensagem, visite, dê um beijo, um abraço, leve para dar uma caminhada, para tomar um café, e nunca, nunca deixe de dizer aquilo que jamais será uma mentira saindo de seus lábios... eu te amo mãe.
E para não incorrer no velho ditado do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”, vou ali dar um beijo e um abraço na minha mamãe, e claro, dizer a ela que a amo.
Um feliz dias das mães.
Porque ELE Vive!
Você já desejou um amigo fiel, que sempre estivesse ali, que sempre te recebesse com um abraço forte e uma palavra de consolo, mesmo que você tivesse feito as coisas mais desagradáveis que alguém possa fazer? Que sempre te desse uma mão para te resgatar dos abismos mais profundos ou que simplesmente te desse um sorriso, dizendo que tudo vai ficar bem?
Um amigo que não te deixasse na mão, que não fosse falso, que não te traísse, te desamparasse ou que jamais fosse te decepcionar? E seu eu te disser que esse amigo existe, e que está sempre ao seu lado, mesmo que você não veja com os olhos limitados, que são os olhos do corpo, você acreditaria?
Poucas não foram as vezes em que ouvi alguém dizendo que estava só, que ninguém amava essa pessoa ou que ninguém a compreendia. Poucas não foram as vezes em que eu mesmo disse essas palavras, e o que não percebemos em nenhuma dessas oportunidades é que somos nós que fechamos a porta para esse Amigo, mesmo ELE estando ali, batendo e esperando. Pacientemente esperando, com a paciência que só o amor é capaz de demonstrar.
Somos humanos, e como humanos gostamos do que é palpável, do que é tangível, e justamente por isso só valorizamos o que tocamos, o que enxergamos e o que ouvimos com os sentidos do corpo. Mas esquecemos que o amor não é tangível, e essa é a maior prova de que estamos equivocados na nossa forma de considerar o que nos cerca, porque o amor não pode ser tocado... mas pode ser sentido.
E é o Amor Maior, o Amor Perfeito, o Amor Pleno, o que pode ser sentido ao máximo, mesmo que não seja percebido pelos sentidos do corpo. O Amor de DEUS. O Amor Daquele que mandou o Próprio Filho para pagar pelos nossos pecados, para nos dar a Salvação. O Amor Daquele que renunciou a todo o Poder, para humilhar-se por nós, para nos salvar. Então te pergunto... que amigo daria tamanha prova de Amor?
Só ELE. Somente ELE. Apenas ELE.
Hoje vivemos a Páscoa, a data que representa a maior prova de amor de todos os tempos. Hoje devemos enxergar com os olhos do espírito, para ver que o sepulcro está vazio, e que por isso estamos cheios de Amor. O Amor de DEUS. O Amor de JESUS. Por isso, que possamos nesse dia nos tornar vazios como o sepulcro, mas cheios, repletos, plenos de JESUS ressuscitado, plenos desse Amigo, do nosso melhor Amigo, que tanto nos deu, que tanto nos amou, que tanto no salvou.
Que possamos abrir as portas dos nossos corações. Porque ELE está lá.
Porque ELE vive, eu posso crer no amanhã.
Graças sejam dadas, porque ELE ressuscitou!
Feliz Páscoa.
O que elas querem?
Do que elas gostam?
A pergunta acima tem assolado as mentes masculinas há muito tempo, e já foi inclusive título de filme estrelado por Mel Gibson, onde o personagem por ele vivido acabava ganhando por um tempo o dom de ler as mentes das mulheres e saber exatamente o que pensavam e o que queriam, o que por vezes é um dos desejos de muitos homens que reclamam da complexidade da mente feminina.
Mas será que elas são tão complexas assim? Será mesmo que elas são esses enigmas indecifráveis de que tanto se fala? Ou será que nós, bichos homens, é que gostamos de problematizar o que não precisa ser complicado? Do que elas, as mulheres gostam? Qual a resposta para essa questão?
Alguns abusados que não possuem lá muito respeito afirmam veementemente que elas gostam mesmo é de dinheiro, de conforto, de luxo e mordomia. Outros falam que elas adoram reclamar de tudo. Há a parcela que jura que elas não gostam de nada, uma vez que nunca estão satisfeitas, e já houve quem dissesse que é dos carecas que elas gostam mais.
Será que alguma das hipóteses acima está correta, ou teremos que marcar o bom e velho “nenhuma das anteriores”, última colocada no rol de opções, mas nem por isso menos importante? Acertou quem marcou a derradeira. Não que eu queira me alocar como dono da verdade e dizer aqui o que se passa na mente feminina, mas na parca experiência que adquiri ao longo dos anos convivendo com mulheres de força e personalidade, acredito que descobri o que elas realmente querem, e não, meus caros, não é nada do outro mundo.
Na verdade são apenas duas coisas, simples, nada complexas, nada enigmáticas, nada extraordinárias, mas que temos ao nosso alcance, e podemos dar sem dispender um tostão sequer, ou sem carregar o peso de um mundo nas costas para conseguir concede-las, e são elas, o amor, e o respeito.
“Nossa, que comentário clichê, caro cronista”, é o que alguns podem dizer. Pode até parecer, mas não é por ser clichê que deixa ser real. O fato é que as mulheres, por mais que possam parecer seres de outro mundo dada a sua grandeza e singularidade, são tão humanas quanto nós, e você, caro macho, assim como todo espécime da raça humana, deseja ser amado e respeitado, então, por que com elas seria diferente?
Quando batalham por liberdade, por igualdade de direitos para que possam ganhar o mesmo, para que possam ocupar os mesmos cargos, para que possam ter as mesmas oportunidades, elas desejam respeito, assim como o desejavam aquelas que em um passado não tão distante batalharam para conseguirem o que hoje as mulheres têm acesso.
Quando desejam uma companhia que lhes dê atenção, carinho, ajuda e que com elas dividam não apenas as alegrias, mas também as tribulações do dia a dia, elas querem amor. Então pergunto, onde está o enigma indecifrável quando questionamos o que uma mulher deseja?
Não precisa ser Mel Gibson para saber disso, e muito menos ter o dom de ler mentes. Basta apenas parar um pouco e observar aquela que está não atrás de você, nem acima, e muito menos abaixo, mas ao seu lado, e não observar apenas com os olhos físicos, de quem vislumbra apenas um objeto, mas com os olhos abertos do espírito, de quem pode enxergar uma alma bela, com desejos, aspirações, planos, e uma imensa vontade de amar e ser amada.
É disso que elas gostam. E vocês, mulheres, me corrijam se eu estiver errado.
Carnaval em Casa
É carnaval meu povo. Foram declarados abertos os festejos de Momo, e com eles o tempo de vestir a fantasia, sair na rua, desfilar no bloco, dançar, pular, cantar, beijar, abraçar e tudo o mais que envolve essa festa tão irreverente, não é? NÃO!
Não é segredo para ninguém que estamos vivendo uma situação ímpar em nossa história, um momento de renúncia, de enfrentamento, de conscientização e de tudo o mais que envolve a luta contra a pandemia do novo Corona vírus e contra a COVID-19. Também já é de conhecimento de todos as ferramentas e armas que atualmente temos para usar contra esse perigo que surgiu no mundo, e que até o momento não possui data definida para terminar.
Uma dessas ferramentas, importantíssima, diga-se de passagem, é o isolamento social, e a despeito do que algumas cabecinhas ocas de negacionistas pensam (se é que possuem a capacidade de pensar), é sim uma atitude relevante, sendo justamente esse o motivo pelo qual você, folião inteligente e pensante, não deve sair pela rua fazendo tudo aquilo que foi dito ali em cima, e não só no período de carnaval.
Justamente por isso, é imprescindível que não escolha fazer parte do bloco dos ”assassinos indiretos”, e sim dos “conscientes que amam e cuidam do próximo”, evitando, assim, contrair e espalhar essa praga que tem assolado o mundo. E não, nesse caso, assassino não é uma palavra forte demais, mas sim o termo que se adequa inteiramente a quem se expõe, participando de festas repletas de pessoas que não usam máscaras, se beijam, se abraçam (e algumas coisinhas mais), e voltam para casa para espalhar o que contraíram nesses ambientes. O vírus mata diretamente, mas quem foi que colocou ele ali?
Por isso, jovens afobados que querem sair por aí como se nada estivesse acontecendo, pensem nas pessoas que vocês têm em casa, e mesmo que não seja na mesma casa, pense naqueles que estão em suas vidas, e que poderão contrair o vírus enquanto você ficar replicando um comportamento tão arriscado como esse. Podem não pegar de você, mas poderão pegar de alguém que está agindo exatamente como você.
Justamente por isso, a opção esse ano (esperamos que apenas nesse), ficou restrita aos seguintes blocos. “Unidos do isolamento”, “Acadêmicos do fique em casa”, “Mamãe eu quero... máscara e álcool em gel” e “Ôh abre alas que eu quero vacinar”, afinal, só brinca carnaval quem está vivo, e quem não tem na consciência a morte de outra pessoa.
E mais uma coisa, animados foliões. O carnaval pode acabar logo, mas os cuidados não, pelo contrário, mais do que nunca, diante da situação atual, eles devem ser intensificados, então, nada de negacionismo meu povo. Mantenham e ampliem os cuidados, usem máscara, lavem as mãos e usem álcool em gel e segurem o ímpeto, só mais um pouco, antes de saírem participando de aglomerações.
Vamos acabar de uma vez com a folia desse vírus. Essa não é nem um pouco divertida.
Juízo.
Verão
Verão. A estação mais quente, talvez a mais contagiante de todas. O período de férias mais aguardado por jovens ansiosos para descansarem um pouco do período letivo e, por que não dizer? Dos adultos ávidos por um bom mergulho na praia, no lago ou na piscina, tudo a depender da disposição e da posição geográfica onde cada um esteja.
Todas as estações possuem seu charme especial, é claro. A primavera, com suas cores em forma de jardins multicoloridos, onde a esperança aflora, encantando os olhos de quem vislumbra a beleza das flores. O outono, com o poético cair da folhagem das árvores, anunciando a chegada de seu irmão mais frio, como a primeira estrela anuncia a chegada da noite em um céu ainda violeta de fim de tarde.
O inverno, com seu característico frio, onde o aconchego ao lado de quem amamos ou mesmo sozinhos embaixo de um cobertor, acompanhados de um livro e de uma boa xícara de café fica por demais difícil de ser ignorado. E, claro, o verão, quente, por vezes sufocante, mas sempre atrativo e restaurador, cheio de vida e energia.
Entretanto, mesmo com todas as quatro estações citadas acima, por morarmos em um país tropical acabamos vivenciando de uma forma mais concreta apenas duas, o inverno e o verão, e como a primeira, apesar de ser a minha favorita, só chegará em alguns meses, guardarei este espaço para falar da segunda, que nos visita nesse momento, e que também me atrai bastante.
O verão, amigas e amigos, é para todos. Para todas as idades, para todos os temperamentos, para todos os gostos. Desde a criança que se lambuza com o picolé na praia e se transmuta em um monstro de lama que acaba melando os papais e mamães desavisados, até os adultos, que enterram o pé na areia, refrescando-se com uma boa água de coco ou algum outro drink enquanto saboreiam um prato característico da culinária desta época, em um esperado e merecido descanso.
E claro, não podemos esquecer da terceira idade, ou melhor idade, onde nossos velhinhos acabam fazendo estripulias na areia ou dentro da água, agindo, de um certo modo, como as crianças que um dia foram, em um sinal de que o verão é, sim, uma estação cheia de energia e renovadora. Esta não é, afinal, a estação que encerra o ano que passa e recebe o ano que entra, renovando-se junto com a própria passagem do tempo?
Verão é época de tomar sol, renovar a vitamina “D” (essencial diante do que estamos vivendo), pegar aquela cor, ficar bronzeado como as pessoas do comercial de tv, ou queimado como o tiozinho que fica igual ao camarão depois de ter exagerado no tempo embaixo da luz do astro rei.
É o tempo dos amores que duram uma vida toda, mas apenas pelo período de um mês, onde jovens apaixonados fazem juras de um amor que na maioria das vezes se porá junto com o sol que se põe ao fim da estação. Momento de brincar, de caminhar na praia, de tomar banho nos lagos, cachoeiras, rios, mares. De radicalizar em aventuras, de mergulhar, de voar, de navegar, de correr, ou simplesmente de deitar na rede ou na toalha estendida na areia e ficar de papo pro ar embaixo do sol (cuidado para não acabar igual ao tiozinho camarão).
Época de veranear, se aventurar, se apaixonar, brincar, descansar, se renovar, se reinventar, e, claro, se fantasiar, afinal, é nesse tempo que o carnaval chega com suas cores e marchinhas para esquentar ainda mais esse período onde o sol brilha mais forte.
Ah, verão. Estação dos desejos, dos amores, do sol e das cores, do mergulho dentro do mar, da cerveja na mesa do bar, do descanso deitado na areia, do olhar buscando uma sereia (eu já encontrei a minha), do sol, do sal, do calor, do eterno e efêmero amor. Ah, verão.
E o seu, como está sendo?
(Lembrando que o verão deste ano está sendo, e precisa ser diferente. Portanto, aproveite o seu com parcimônia, e não aglomere. Logo, logo tudo isso vai passar, se DEUS quiser).
Resoluções de Ano Novo
Planos, projetos, resoluções traçadas cuidadosamente em uma lista no ano que termina, para serem cumpridas no que está por entrar. Passar em um concurso, reformar a casa, fazer uma viagem, conhecer o amor de sua vida, construir, ganhar, mudar, reconciliar e tantos e tantos outros verbos escritos em um rol que muitas vezes, para além de não ser cumprido em sua totalidade, é esquecido em um canto da memória, para ser recordado apenas nos últimos dias daquele novo ciclo, para serem novamente elencados para a data que está por vir.
Essas são as famosas resoluções de ano novo, normalmente feitas quando nos sentamos para olhar um pouco para trás, em um balanço do que fizemos ou deixamos de fazer no ano que caminha para seu fim. É nesse ponto que se reacendem os sonhos, movidos pela esperança de que a data que se renova trará as condições ideais para que alcancemos nossos objetivos.
Mas que condição é melhor que a ação? Sim, é muito bom traçar planos. É até necessário fazê-los, já que é a partir da idealização de algo, da elaboração de um sonho que se cria, que se conquista, que são deixadas as marcas de sua passagem pelo mundo como alguém que fez a diferença. Mas sonho, sem ação, não deixa o plano da imaginação.
Por melhores que sejam os objetivos, por mais belos que sejam tais sonhos, por mais grandiosos que sejam os pontos almejados, eles não deixarão de ser um desenho em um pedaço de papel, ou uma imagem presente apenas na mente de quem os idealizou se o primeiro passo não é dado, se o primeiro prego não é fincado, se as primeiras ações não são tomadas.
O ano novo é uma data que se renova, que simboliza uma mudança de ciclo, assim como o nascer de uma nova data cheia de possibilidades, mas sem ação, elas não passarão disso... possibilidades. Não é o ano novo que fará por você o que deve ser feito, mas o seu novo eu, que fará daquele ano o marco do início de algo que poderá mudar tudo.
Sim, façamos resoluções, tracemos planos, metas, objetivos, indiquemos para nós mesmos o que tanto almejamos. Mas para além disso tudo, que possamos dar o primeiro passo, porque o viajante que não se move nunca chega ao seu destino, e nunca vê as belezas que existem no decorrer do caminho.
O ano novo está aí. Ele já chegou.
Mas e o seu novo eu, chegou junto com ele?
Significado
Alguém já esqueceu seu aniversário? Não? Mas você já imaginou como se sentiria se isso acontecesse? Se as pessoas que mais amam esquecessem essa data tão importante? Chato não é? Agora modifico um pouco a pergunta. E se as pessoas não esquecessem a data, soubessem que é exatamente o seu aniversário, mas ainda assim fizessem vista grossa e não lhe dessem sequer os parabéns? Bem pior, certo?
Pois é. Nos coloquemos então no lugar de um amigo nosso, um grande amigo nosso, comum a todos nós e que anualmente passa por essa desagradável experiência. Você o conhece. Não consegue lembrar quem é? Force um pouco a memória, é bem difícil esquecê-lo (apesar de muitas vezes o fazermos, até conscientemente). Não consegue lembrar? Vou dar uma descrição, quem sabe assim acabe recordando.
Estatura mediana, magro, cabelos longos, barba um pouco rala, olhos expressivos, mãos e pés calejados (e marcados por cicatrizes inconfundíveis), extremamente paciente, compreensivo, atencioso, sábio e que sempre está lá quando precisamos dele. Ainda não reconhece? Quem sabe indicando o dia do seu aniversário você consiga lembrar. 25 de dezembro. Dia de Natal.
Ponto para quem disse Jesus, esse nosso Grande Amigo, que nos deu o maior presente que alguém pode dar. A Salvação. Pois bem, basta sair por aí todo mês de dezembro para ver se tornou uma constante esquecer o aniversário desse Alguém tão importante. Aliás, esquecer não, pior, ignorar. Quase todos nós estamos mais do que carecas de saber que o Natal representa o nascimento de nosso Salvador, o dia em que DEUS presentou o mundo com seu Filho, o dia em que nos deu a prova definitiva de que nos ama incondicionalmente.
Mas mesmo sabendo disso, acabamos ignorando o fato, e acabamos associando o natal a um velhinho simpático que carrega um saco nas costas, a uma árvore enfeitada com presentes embaixo e a decorações que pouco retratam a data que foi o divisor de águas na história da humanidade. Nada contra as decorações natalinas, ao Papai Noel ou à árvore de Natal, mas pergunto, quantos presépios vocês veem montados por aí em comparação às outras decorações que se espalham nessa época do ano?
Quantas vezes você já ouviu tocar o bom e velho “Jingle Bells” nesse período? Agora compare com as vezes em que alguma cantata natalina retratando o nascimento de Cristo foi tocada, e faça as contas. Provoco um pouco mais. Se organizarmos uma chegada de Papai Noel de helicóptero, como vemos tantas por aí, e uma encenação daquela noite perfeita que aconteceu há dois mil e vinte anos atrás, em qual das duas as pessoas se farão mais presentes?
Quantas famílias fazem uma oração relembrando o que significa esta data, e agradecendo a DEUS pelo nascimento de seu Filho? Quantas param para fazer esse ato antes de atacarem com voracidade a mesa da ceia, ou rasgarem ansiosos os embrulhos dos presentes que coloridos se espalham embaixo da árvore enfeitada?
Não quero ser o chato que fica apontando dedos, até porque tudo o que descrevi acima serve também como uma auto crítica, mas nada do que foi dito anteriormente é mentira, especialmente a parte em que ignoramos o real significado de uma data tão importante.
Natal é data de ponderar, de agradecer, de relembrar que em um dia em que trocamos tantos presentes, DEUS nos deu o Maior Presente de todos. É dia de reconciliação, de reaproximação, e não falo aqui apenas das pessoas com quem estamos brigados ou de quem estamos distantes, mas principalmente do aniversariante do dia.
Natal é dia de renascer e agradecer por esse renascimento. Então, vamos valorizar quem realmente deve ser valorizado. Que possamos nos reconciliar com o aniversariante, que possamos reencontrá-lo, que possamos convidá-lo para a própria festa, deixando-o entrar não apenas em nossas casas, mas principalmente em nossos corações.
Que possamos fazer isso todos os dias, não apenas no dia 25, mas lembrando sempre o que o Natal realmente significa.
Um Feliz Natal para todos.
E um Feliz Aniversário para Você, meu Grande Amigo, meu Protetor. Meu Salvador. Te amo.
Julgamentos
A Bíblia apresenta uma passagem de Mateus 7:3 que define bem a precipitação de quem se põe na posição de juiz de tudo e de todos, trazendo a seguinte mensagem para levar um pouco de luz às vistas turvas de quem se acha o proprietário da razão, que é a seguinte, “Por que reparas tu o cisco no olho de teu irmão, mas não percebes a viga que está no teu próprio olho?”
As palavras citadas acima definem bem o equívoco de quem se antecipa e se apressa a apontar dedos e proferir julgamentos, sem, no entanto, fazer uma auto avaliação a fim de constatar se de fato está agindo conforme está pregando, no bom e velho exercício da máxima “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço.” Ou seja, antecede-se para indicar e comentar defeitos alheios, esquecendo-se (propositalmente ou não) de reconhecer os seus próprios, muitas vezes tão escandalosos quantos aqueles que amam mostrar.
Mas se julgar alguém esquecendo-se de reconhecer os próprios defeitos já é algo ruim, talvez ainda pior seja fazê-lo sem ter a mais remota noção do que se passa no íntimo da pessoa que é alvo de tal julgamento. Ao olharmos para outrem, tecendo nossas próprias impressões, normalmente o fazemos levando em consideração a observação externa, sem, no entanto, possuirmos a vivência interna do que ali se passa.
Julgamos o drogado, taxando-o de fraco por ter decaído perante o vício, mas não sabemos quais os demônios internos que aquela pessoa carrega, e que muito provavelmente tiveram seu papel na construção daquela dependência. Taxamos de incompetente alguém que fracassou, sem percebermos que por detrás daquele insucesso podem ter existido inúmeros fatores que fogem à nossa compreensão, e que ocasionaram a falha que nos apressamos em indicar.
Apontamos o dedo para as pessoas pelas roupas que usam, pelos hábitos que cultivam, pelas amizades que mantêm, sem percebermos o quão rasos estamos sendo ao fazermos isso. Um exemplo disso é um célebre dito popular, que muito diz sobre o que fazemos, mas pouco possui de profundidade para analisar a veracidade de uma situação. “Dize-me com quem andas, que eu te direi quem és”.
Por que? Com que embasamento? Com que conhecimento? Com que propriedade? O julgamento que uma pessoa faz de outra diz mais sobre a própria pessoa do que sobre aquela a quem está julgando, pois revela sua personalidade (ou a falta dela), seu caráter (ou a falta dele) e sua pressa em tecer opiniões sem saber o que de fato acontece em cada caso. “Nunca julgue ninguém antes de caminhar um quilômetro nos sapatos daquela pessoa”.
O mundo está cheio de tribunais de exceção, com juízes famintos por promoverem condenações sem dar qualquer oportunidade de defesa, apontando, conceituando, colocando um rótulo sobre os demais, onde figuram suas opiniões apressadas e consequentemente equivocadas. Talvez seja por isso que as coisas se encontrem da forma como estão.
E em meio a tudo isso, até mesmo como uma auto reflexão, já que muitas vezes replico esse comportamento tão reprovável, proponho a adaptação do ditado anteriormente citado para algo mais plausível e condizente com a realidade.
“Mostra-me como julgas, que revelarás quem és.”
Nossos Heróis não deveriam morrer
Como um aficionado por livros e história, cresci lendo sobre heróis, desde os “super”, das versões dos quadrinhos, até as versões originais dos grandes personagens das mitologias, especialmente a grega. Até hoje lembro da noite em que, aos oito anos, vi em uma reportagem que o Super-Homem iria morrer em uma história intitulada “A Morte do Super-Homem”, a qual tive acesso tão logo chegou ao Brasil.
Como criança, como fã, como admirador fiquei triste, mas logo senti o alívio em saber que uma nova história estava chegando, “O Retorno do Superman”, onde o Homem de Aço voltava, tomando seu lugar de destaque no panteão dos heróis. Felizmente, nos quadrinhos eles não morrem, e quando o fazem, podem voltar. Mas na vida real a via é de apenas uma mão, e não permite retorno.
E com isso, me vi entristecido ao me deparar com a realidade de um herói que se foi, para não mais voltar. No último dia 31 de outubro de 2020 nos deixou Sean Connery, um dos mais completos atores que a sétima arte já teve em seus quadros, responsável pela interpretação de papéis antológicos e personagens inesquecíveis.
Thomas Sean Connery era escocês, nascido em 25 de agosto de 1930 em Edimburgo, e ganhou destaque e notoriedade em 1962, ao dar vida pela primeira vez ao célebre personagem criado por Ian Flemming, um tal de James Bond, o famoso 007. O filme era “OO7 Contra o Satânico Dr. No” (Dr. No), e lançou imediatamente o ator ao estrelato.
Connery voltaria a interpretar o agente do MI6 britânico em mais seis filmes, sendo até hoje considerado por muitos (inclusive por este que vos escreve) como o melhor 007 de todos os tempos, imprimindo ao personagem o seu característico charme pessoal e seu inconfundível carisma.
Além do 007, Connery se destacou em diversos outros papéis importantes em filmes inesquecíveis, a exemplo de “O Nome da Rosa”, “Caçada ao Outubro Vermelho”, “Indiana Jones e a Última Cruzada”, “Highlander” e “Os Intocáveis”, onde teve seu talento reconhecido ao ganhar o Oscar de melhor ator coadjuvante, e ao fazer isso, ganhou o direito de habitar o imaginário das pessoas como um dos heróis que a ficção nos apresenta.
Connery se tornou, inclusive, herói de mais de uma geração, passando pela do meu pai, que ainda era criança à época do primeiro filme de 007, e alcançando a minha, que teve o privilégio de assistir in loco os filmes desse inesquecível ator.
E da mesma forma que aquele garotinho ficou, tantos anos atrás, triste ao saber que o seu super herói morreria, esse garoto crescido agora também lamenta a partida de outro herói, mas agora com a triste consciência de que nesse caso não poderá haver volta.
Mesmo com a obra deixada por Connery, que podemos revisitar sempre que quisermos, ainda assim fica a consciência de que o homem que ali vemos, aqui já não está, e que aquilo nada mais é do que o eco do brado que o herói lançou um dia, e que jamais lançará novamente.
É, nossos heróis, de fato, não deveriam morrer.
Atração pelo medo
A cena é tão conhecida que já passou a ser um clichê dos filmes de terror. A moça ou o rapaz estão presos em uma casa, um castelo ou algo do tipo, sozinhos, vulneráveis, enquanto algo à espreita os rodeia, pronto para o ataque final que porá fim às suas vidas de uma forma aterradora. Do lado de cá da tela ficamos absortos, acompanhando aquele suspense e torcendo para que esses personagens de alguma forma escapem.
É nesse momento em que geralmente o mocinho ou a mocinha tomam a estúpida decisão (ao menos assim consideramos), de ir de encontro a uma porta, um armário, um sótão ou porão onde, escondida e faminta, está a terrível coisa que vai ataca-los. Do sofá de nossas casas, ou da poltrona do cinema taxamos essas pessoas de idiotas, afirmando que são burras demais por fazerem tal escolha, mas isso só porque já sabemos (em grande parte das vezes), onde está o bicho papão que irá atacar.
Mas será que se fossemos nós ali, a decisão seria outra? Ou tomaríamos o mesmo rumo que os personagens de tais histórias escolheram tomar? A pergunta é válida, e isso em virtude de um senso de curiosidade que o ser humano possui ao temer, e ao mesmo tempo querer explorar o desconhecido.
Ou por acaso vai negar que mesmo odiando aquele filme, tendo pavor do enredo, e já antevendo uma noite mal dormida imaginando que algo está à espreita atrás da porta ou embaixo da cama, você ainda assim não fechou os olhos diante daquela cena aterradora, ansiosa ou ansioso por ver o que aconteceria, ainda que ao mesmo tempo temesse o que iria ver?
Isso faz parte do repúdio, e ao mesmo tempo do fascínio que temos pelo medo. Discorda? Então me responda, por que os gêneros terror e suspense fazem tanto sucesso nas mais diversas mídias? Por que há tanto público consumidor, chegando a gerar os famosos blockbusters (estrondos de bilheteria) em temas que nos geram tanto medo e até mesmo pavor? Por que pagar um ingresso de cinema, ou o valor de um livro ou revista em quadrinhos para ter acesso a esse tipo de história?
Porque (e aqui trago apenas minha opinião, sem querer ser dono da verdade, e aceitando pontos de vista contrários) o bicho humano (em grande parte) inclina-se para um fascínio e por vezes atração por aquilo que lhe traz medo, em uma relação paradoxal de temor e fascinação por temas que fazer a espinha gelar e cada pelo do corpo eriçar-se em sinal de apreensão. E esse que vos escreve faz parte dessa numerosa lista. É como se disséssemos, “eu te detesto, mas ainda assim vou te ver, porque também gosto de você”.
Contraditório, não é? Mas o que é o bicho humano, senão um dos animais mais contraditórios que existem nesse pedaço de rocha que vaga pelo cosmos?
Então, senhoras e senhores, quando forem maratonar uma série de terror, assistir aquele filme em uma sessão de Halloween, ou lerem sozinhos aquele livro na calada da noite (bom demais), pensem duas vezes antes de chamarem o personagem que vai de encontro ao perigo de burro, e pergunte-se, naquele momento, se você realmente agiria de forma diferente.
E antes que me esqueça...
Bú! para vocês.
Palavras
As palavras têm poder. Cresci ouvindo esse dito popular, que externa um pouco da força que as palavras possuem em nossas vidas, seja para o bem, seja para o mal. Mas há algo mais sobre elas, algo que vai muito além de uma influência maniqueísta ou de uma potência resultante nos campos onde são aplicadas.
As palavras não têm apenas poder, elas têm forma, têm face, tem corpo e têm história. Têm sentimento, têm medo e têm coragem. Têm amor, raiva, alegria, tristeza, frustração felicidade, mentira e verdade. Elas carregam uma enorme bagagem. São elas mesmas por muitas vezes a bagagem, trazendo consigo o conhecimento de vidas inteiras, do que foi visto, vivido, vencido ou perdido.
Palavras têm o cheiro de quem partiu, deixando na saudade as lembranças de sua passagem. Têm gosto de beijo e declarações de amor. Palavras têm música, palavras são música. Canções, poesias, cheias de rimas e harmonias. São seres livres, cuja beleza se destaca ainda mais quando se soltam das amarras da norma culta de um idioma, tal qual um pássaro é infinitamente mais belo quando sai de sua gaiola e entrega-se ao vento para voar na imensidão dos ares.
Palavras têm cores. Sim, por que não? Palavras são cores e imagens, desenhos e figuras, ou vocês esquecem das pinturas rupestres, primeiras formas de comunicação de nossos ancestrais, que ainda sussurram em nossos ouvidos, narrando as histórias de suas vidas através dos ecos do tempo? Não, as palavras não envelhecem. Elas duram, perduram, germinam e fulguram, passando de geração em geração, entrando na mente e no coração de cada um.
Faladas, cantadas, desenhadas, pintadas, rimadas ou escritas, palavras são tempo, e voam ao sabor do vento para ficarem no pensamento, gravando na eternidade um momento, seja de tristeza ou de contentamento. Palavras são estrelas no eterno firmamento.
Brincam com a inocência das crianças, e falam com a seriedade dos velhos sábios. Carregam a leveza de uma brincadeira, ou o peso da profundidade de um ensinamento. Podem destruir em um piscar de olhos, mas possuem igual capacidade para construir muralhas instransponíveis. Carregam até mesmo as lições do Alto, DAQUELE que não podemos ver, mas que sentimos quando abrimos nossos corações.
Palavras, livres, belas, coloridas... palavras, que muitas vezes nos deixam tão encantados que até mesmo nos faltam... as palavras.
Cultive
Está impaciente? Acha que as coisas andam devagar demais, ou que sequer saíram do lugar? Tem o coração tomado de angústia por ver que outros seguem, que seus projetos se desenvolvem, mas sua oportunidade não chega? Se esses pensamentos te afligem, então volte seu olhar para as flores.
Sim, estejam elas enfeitando um jardim que colore a vida e encanta os passantes, ou mesmo singularmente isoladas em um vaso em meio a uma paisagem de ferro e concreto, observe-as, e veja como são belas. Mas vá um pouco além. Tente enxergar além das pétalas, das cores, das folhas e dos detalhes que dela, ou delas façam parte. Veja o que há adiante. Veja a espera.
Sim, a espera. Quando paramos para admirar algo belo, costumeiramente nos detemos no presente, no momento da observação, mas raras são as vezes em que pensamos por qual processo o foco de nossa admiração passou até que chegasse naquele ponto de encantamento para nossos olhos e nossos espíritos. E as flores, isolada ou conjuntamente falando, são um bom exemplo disso.
Em um jardim, um canteiro onde estejam plantadas uma grande variedade de flores, o que se enxerga são as tonalidades que enchem de cor o ambiente, mas pouco se pensa que cada uma delas, em sua singularidade, em sua especificidade, em sua unicidade, passou pelo mesmo processo de germinação e crescimento, até que chegassem àquele estado.
As flores não são plantadas em um dia para que horas depois ou logo no dia seguinte possam mostrar sua beleza. Não, elas passam por todo um período de desenvolvimento, que toma um tempo e cuidado que variam conforme a espécie. Uma rosa não germina e floresce no mesmo tempo em que o faz um girassol. E não é apenas o tempo que varia.
Algumas plantas demandam cuidados diferentes de outras, onde o jardineiro prossegue por um caminho bastante diverso, mas que visa ao mesmo fim, e tudo isso requer um ingrediente em particular, um sem o qual o resultado não virá, ao menos em sua plenitude. A paciência.
Todas as flores um dia foram uma simples semente, plantada cuidadosamente em um fértil solo, em um lugar particularmente escolhido, com o cuidado necessário para que pudessem crescer fortes e belas, e isso demandou dedicação, e também paciência. Complacência para colocar aquela pequena vida em um local especifico, e voltar no dia seguinte para ver que estava da mesma forma, e também no dia seguinte àquele, e assim sucessivamente, até que em um momento, um pequeno ramo surgiria da terra, como um pequeno sinal do que viria adiante.
Acaso não tivesse o jardineiro paciência, deixaria acabrunhado e frustrado o local onde plantara a semente, deixando para trás a beleza que esperara ver, deixando de cuidar da vida que viria, e que poderia até mesmo fenecer pela ausência de zelo de seu cuidador.
Mas o jardineiro que vai dia após dia ao local em que a semente foi plantada, regando-a com calma, tratando-a com zelo, e aguardando pacientemente o passar do tempo e o surgimento da vida, esse sim colherá os frutos de sua espera, e verá a beleza pela qual tanto aguardou. A paciência de quem planta, e a dedicação com o que foi plantado, levam ao tão aguardado resultado.
Então, se está impaciente com os projetos que demoram para seguir adiante, lembre-se das flores, e recorde também que cada uma possui o seu próprio tempo de germinação, mas que com o cuidado necessário, um dia florescerão belas e encantadoras. Plante seu jardim com paciência, trate-o com cuidado, e espere, pois o resultado um dia virá, e poderá ser até mais belo do que você imaginava.
Cultive com paciência. Cultive a paciência.
Liberdade
A segregação da liberdade de um indivíduo, não considerada a pena capital, é a maior reprimenda que a lei pode aplicar a alguém em um ordenamento jurídico democrático, decorrente de alguma atitude reprovável que a pessoa punida cometeu anteriormente, sendo necessária a punição para atender a critérios de recuperação do criminoso, de penalidade ao mesmo, desencorajamento para o cometimento de novos crimes e de resposta à sociedade frente ao delito cometido.
O trecho apresentado acima pode ser interpretado como uma aula de direito penal sobre a aplicação da pena, mas não é sobre o ordenamento jurídico pátrio que venho falar aqui hoje. O cerne da questão aqui é quando a punição, a segregação da liberdade não é aplicada pelo Estado. Quando sequer é imposta como algum tipo de punição.
A intenção aqui é tratar da prisão do indivíduo como algo imposto a ele, por ele mesmo. Uma condenação que lhe foi aplicada sem que sequer houvesse um julgamento com direito de defesa. Um caso onde o réu é também o juiz, o carcereiro, e o pior de tudo, a vítima. O preso, a quem pertence a chave da própria cela, que possui o poder de libertar-se de seu cárcere a todo momento, mas que nunca o faz, vivendo em uma prisão perpétua, dentro das grades de seu isolamento auto imposto.
A vida, com as peculiaridades de cada ambiente e as infinidades de personalidades que permeiam a raça humana dá a cada um suas próprias características. Seus talentos, suas capacidades, seus traços pessoais, bem como seus medos, suas inseguranças e seus traumas. São justamente esses últimos agentes que podem surgir na vida de cada um como os gatilhos que levarão o preso a trancar-se em sua própria cela, sem perspectiva de uma libertação. Uma pena sem prazo de duração.
Mas como uma pessoa pode condenar-se à segregação? Como pode alguém impor-se tamanho sofrimento? A resposta dependerá do ponto de vista de quem enxerga tudo, já que para o preso, o cárcere pode muitas vezes dar uma falsa sensação de liberdade. Mas como?
Medos e inseguranças podem levar uma pessoa a isolar-se, a trancar-se em si mesma, evitando o contato e a aproximação de outras pessoas, até mesmo como uma questão de autodefesa. Nesse ponto, a cela dá uma ilusão de refúgio, de proteção contra os males do mundo, que não são poucos. Mas essa situação pode ser comparada a um pássaro em uma gaiola que triste canta a ver a liberdade dos outros, e em dado momento, se solto, não vai querer sair de sua prisão, e se o fizer, poderá não sobreviver à tão sonhada, e ao mesmo tempo tão temida liberdade.
Mas o que seria melhor para o pássaro? A liberdade de voar para onde quiser, sentindo nas asas o vento correndo e vendo do alto a imensidão do mundo, ou permanecer em seu cubículo, vivendo de pequenos saltos em um espaço fechado, limitado, minúsculo? Qualquer um responderia que a liberdade é a melhor opção. Mas tais pessoas, ao responderem isso, já procuraram olhar para suas próprias celas?
E se sim, por que então não seguem o exemplo que encontraram em suas respostas? Talvez porque o melhor observador é aquele que enxerga de fora, e tais pessoas vivam o mesmo dilema do pássaro na gaiola. Vista de dentro, a situação é outra. O apego à prisão, à ilusão de segurança que faz com que tenham a chave da prisão em suas mãos, mas que acabem optando por jamais usá-la.
Para aqueles que não enxergam tal realidade a dor é menor, ou mesmo inexistente. Para alguns, a ignorância é uma benção. Mas para os que têm ciência do que vivem, o sofrimento é constante, pois o dilema se apresenta, a dúvida germina, e o combate se trava no interior de cada um. Escolher o que? A falsa sensação de segurança, ou a perspectiva de uma liberdade cheia de “ses”, mas também cheia de possibilidades?
Nesse ponto, convém citar a sabedoria popular, com o célebre dito “quem não arrisca, não petisca”, ou “não chega a lugar nenhum quem não dá o primeiro passo”. Se não houver tentativa, não haverá resultado, então, por que não arriscar? Por que não experimentar colocar a chave na fechadura e ouvir o intimidador e ao mesmo tempo esfuziante ruído das engrenagens girando, das dobradiças da porta sendo abertas? Da lufada do vento da liberdade no rosto que antes estivera encarcerado?
Somos os donos das chaves de nossas próprias celas, então, que possamos abri-las para darmos voos altos, ao invés de permanecermos cantando tristemente em uma gaiola de medos e inseguranças.
Liberte-se. Libertemo-nos.
Sopro
Um sopro. Uma brisa leve, uma passagem rápida e quase imperceptível perante o mundo. Grãos que descem rapidamente pela ampulheta das eras, chegando ao fim de sua jornada antes mesmo que se possa dar conta disso. Essa é a nossa vida física, percorrida em um piscar de olhos se a analisarmos sob o ponto de vista dos ponteiros incansáveis do tempo. Um curto intervalo percorrido entre o momento em que abrimos os olhos pela primeira vez, e os fechamos pela última.
Mas essa é uma realidade que pouco se vislumbra, e muito em virtude de um senso de falsa eternidade que acolhemos e adotamos para nossas vidas, talvez por medo de encarar a certeza inafastável que permeia nossa existência, a do fim da vida humana, da jornada física que cumprimos nessa curta e ao mesmo tempo longa caminhada.
E por isso deixamos para amanhã a pergunta que se faz urgente hoje. Como vivenciamos o sopro que é a nossa vida? Como viajamos por essa breve brisa, que se esvai tão logo surge, para se mesclar às lembranças do mundo e ali permanecer pela eternidade? Aproveitamos na plenitude o piscar de olhos que ela representa? Ou deixamos ela passar, passando por ela e desaparecendo como sombras que se esvaem tão logo o sol se põe?
Será que você tem vivido sua vida? Será que eu tenho vivido a minha? E quando conjugo o verbo viver nessa questão, tento fazê-lo não de forma rasa, mas com a profundidade que se faz necessária. Com a profundidade que é essencial. Não me refiro aqui a dinheiro, posses, conquistas materiais, relacionamentos superficiais ou algo palpável. Algo que será devorado pelo apetite insaciável do tempo.
Me refiro à essência, às coisas que o senhor das eras não pode tocar, ao que é intangível, e mesmo não podendo ser tocado, é o que de fato preenche. Me refiro não ao “ter”, mas ao “ser”. Você tem sido? Eu tenho sido? Ou apenas estamos tendo, acumulando coisas que não podem ser acumuladas, porque um dia sumirão com a mesma brevidade com a qual a nossa vida passa?
Você tem amado? Tem vivido a paz que o verdadeiro amor traz? O sentido de significado trazido por estar com quem se ama? Ou tem apenas trocado de amantes, objetificando os relacionamentos a ponto de acabarem se tornando algo sem qualquer significação? Algo tão corriqueiro como o ato de trocar de rouba ou alimentar-se?
Você tem sentido? Não no aspecto do tato físico, mas do sentir da alma, de buscar vislumbrar a essência do que nos rodeia, e assim enxergar a real beleza que se esconde por detrás de cada coisa.
Você tem percebido? Percebido a que a vida é um sopro, e que nesse exato momento as areias estão correndo para o outro lado da ampulheta enquanto o sol de nossa existência nesse mundo caminha em direção ao ocaso? Ou tem se escondido atrás da fantasia de que viverá para sempre? Se for esse o caso, abra os olhos e veja que o para sempre é agora, e ele passa rápido demais.
Abra os olhos e veja que a estrada se descortina à sua frente, e que logo mais você atingirá o ponto de chegada. Abra os olhos e ame, não vários homens ou mulheres, não corpos físicos e aparências que logo se tornarão apenas lembranças, mas almas. Ame a essência de quem está ao seu lado, porque essa sim durará para sempre.
Abra os olhos e sinta, mas sinta por dentro, sinta o que de fato vale a pena ser sentido, sinta não com o tato da pele, mas com a força do espírito. Abra os olhos e viva, não o que é tangível, mas o que é essência, porque as lembranças desse viver irão contigo pela eternidade que vem depois do fechamento dos olhos físicos, e influenciarão diretamente sobre ela.
Abra os olhos, o coração, a alma, e viva, ame, abrace, acolha, sinta, porque essa existência é um sopro, e assim como a brisa se esvai tão logo passa pela areias do tempo, assim findará nossa caminhada nesse mundo.
Viva.
Com quais olhos?
Com quais olhos você enxerga? Como vislumbra o todo que se põe à sua frente em sua caminhada? É uma pergunta que pode parecer sem sentido se o panorama utilizado para responde-la limitar-se ao que é físico, mas o questionamento rompe um pouco as barreiras do que podemos tocar. Então, permitam-me ampliar um pouco a questão.
Com quais olhos você enxerga? Apenas os do corpo, ou também com os da alma? E qual a cegueira que te acomete? A do espírito, ou a da carne? Quando olhas para algo, enxergas apenas a casca, ou procuras ver também a essência? Em qual ponto te limitas, e em qual segues além?
Para muitos, o olhar pode limitar-se ao físico, ao ver com os olhos do corpo, enxergando apenas o que é palpável, ou mesmo a cobertura deste palpável, sem que se tente, contudo, contatar um nível de sensibilidade que permita ir além destes limites, além das limitações da ciência da ótica que permite que a visão física identifique os objetos que se apresentam à sua frente.
É muito fácil, ao menos para quem possui o sentido físico da visão, enxergar e definir cores, formas, nuances e demais características de objetos ou pessoas aos quais possam ver. Mas a dificuldade é exposta quando se pede para abrir olhos que podem estar fechados já há um bom tempo, ou mesmo que nunca tenham sido abertos... os olhos da alma.
É vislumbrar adiante, para ver não apenas que o céu é azul, mas a grandeza que representa o firmamento, e que te faz pensar como se é pequeno diante de algo tão infinito. Ou para enxergar a perfeição de um beija-flor em seu processo diário e repetitivo de tirar o alimento das flores. A olhos humanos aquilo pode ser visto apenas como o ato natural de alimentar-se, mas em uma visão mais ampla, enxergar-se a perfeição da natureza em todos os seus aspectos, demonstrando a comunhão entre seres existentes que sobrevivem em conjunto e harmonia.
É ver além das cores que irradiam do ocaso, para entender a beleza e o significado de um novo dia que surge com o nascer do sol. É olhar um casal abraçado e vislumbrar não apenas uma interação física, mas a beleza do compartilhamento de uma vida entre dois universos tão distintos e tão complexos como o são os seres humanos em sua individualidade.
Ver com a alma é enxergar, mesmo que não se tenha o sentido da visão, e assim conseguir apreciar muito mais do que os olhos do corpo conseguem perceber. É ver sentindo, e nesse sentir, vislumbrar o todo em sua plenitude, ainda que estejamos com os olhos físicos fechados.
E então, com quais olhos você enxerga?
Gigante
Um gigante em tamanho aos nossos olhos quando somos pequenos, e um gigante em nobreza para nossos sentimentos quando crescemos. Esse é o pai. Amigo, parceiro, companheiro, conselheiro, educador, moldador de nosso caráter e construtor das bases que ajudarão em nosso processo de crescimento. Pai é o cara, sim, o cara.
O cara com quem tomamos aquela cerveja falando sobre futebol, política ou pura e simplesmente sobre trivialidades acerca de qualquer assunto. Ou para quem contamos, um tanto que constrangidos, sobre a primeira namorada ou o primeiro fora que levamos de alguém. Aquele que repreende com o olhar ou com a palavra quando erramos, nos dando o conselho de que precisamos para que possamos crescer. A mão que nos dá segurança, os ombros que nos carregam no alto, a voz que nos traz conhecimento.
Pai é segurança, amizade, proteção, educação, exemplo... herói. Sim, é o primeiro super-herói que admiramos, sem capa, sem máscara, sem super poderes. Sabemos que ele não pode voar, mas pode nos levar em voos altíssimos com o que nos ensina. Sabemos que ele não pode levantar carros ou prédios com apenas uma mão, mas que possui naquela mesma mão a força suficiente para nos erguer e nos retirar dos problemas que vivenciamos.
Não possui visão de raios-x, mas enxerga além, e nesse enxergar adiante, nos aconselha sobre os melhores caminhos que podemos seguir para que não nos machuquemos com decisões equivocadas. Não possui a super força do corpo, mas possui a do caráter e a do espírito. Não é fisicamente invulnerável, mas o exemplo que nos deixa não pode ser ferido.
E nesse ponto volto ao que disse no início do texto. Quando pequeno fitava meu pai com admiração. Alto, quase inalcançável, um gigante em tamanho aos olhos de um menino. Hoje, possuímos a mesma altura, mas enquanto homem o fito com a mesma admiração, ainda enxergando aquele gigante inalcançável. Imenso no tamanho. No tamanho do caráter.
Abracem seus pais e digam o que sentem. Para o meu, a mensagem é sempre a mesma, e vem em duas declarações.
Você não é exemplo de herói, mas um exemplo para os heróis. E a segunda, e a mais significativa...
Eu te amo, meu velho.
Feliz dia dos Pais.
P... que o pariu!
Apenas como esclarecimento, aviso de início que durante o texto vou usar a primeira palavra que compõe essa expressão, de forma abreviada ou semioculta por algumas reticências, já que alguém pode achar a frase pesada demais. Dito isto, prossigo dizendo que mandar alguém, ou alguma coisa, ou mesmo uma situação para a pqp (para quem não sabe, essa é a sigla que retrata a expressão do título) é algo que possui um quê de revigorante, especialmente quando o remetido para esse lugar tão singular tem o potencial ou a capacidade de te irritar profundamente, ou quando a situação demanda a liberação de um nível peculiar de energia que acompanhará a dita frase.
Aquela pessoa metida, arrogante, agressiva, irritante, aquela situação que te tira de prumo, trazendo verdadeiros aborrecimentos, ou mesmo aquele objeto, eletrônico ou não, que resolve falhar no exato momento em que você mais precisa dele. E isso, claro, sem falar na boa e velha topada que marca o encontro extremamente agradável (claro que é ironia) entre o dedo mindinho do pé descalço e o apoio da mesa ou a quina da porta. Numa hora dessas, o “p... que pariu” funciona inclusive como uma válvula de escape, uma forma de liberação da dor, ou simplesmente uma demonstração da ausência de carinho e admiração para quem a expressão é diretamente dirigida.
O “pqp” pode até mesmo servir como interjeição, trazendo uma conotação de espanto, revolta, ou admiração, a exemplo do “p... que o pariu, que música legal”, ou “pqp, que filme fantástico”, e por fim “p... que pariu, que cara pilantra”, ou seja, apenas para sintetizar, essa suave e recatada expressão possui tantas variações quanto o número de pessoas que a profere diariamente.
Alguns podem até acha-la vulgar, incomodando-se com seu conteúdo e por vezes com a agressividade ou intensidade com a qual é lançada boca afora, mas não sejamos hipócritas... mesmo a pessoa mais recatada pode sentir-se aliviada ou momentaneamente realizada ao gritar o bom e velho “pqp”. E por que não? Se é libertador, por que não sentir-se livre ao experimentar a sensação? Afinal, é melhor mandar algo e alguém, ainda que em pensamento, à “p... que o pariu”, do que guardar dentro de si uma raiva que posteriormente transbordará e poderá acarretar em algo bem pior.
E quanto à explicação dada no início do texto, sim, aquela que trata da abreviação ou das reticências como forma de evitar que alguém se ofenda com essa singular expressão, lembram? Bem, não seria hipocrisia da minha parte dizer que é algo é libertador, e ao mesmo tempo ficar com receio de usar esse algo, prendendo-o e consequentemente prendendo a mim mesmo? Pois bem, em respeito ao sentimento de desprendimento, e à liberdade que o termo proporciona, venho ruidosamente mandar as reticências, a sigla e o recato para a Puta que os pariu. E que aproveitem a viagem.
Ahhh, a liberdade.
O Monstro em Ti
Você já tentou conversar com seu “Mr. Hyde”?
Para quem não entendeu a pergunta, fica a dica de uma boa leitura, “O Médico e o Monstro” (Strange acase of Dr. Jekyll and Mr. Hyde), livro da autoria de Robert Louis Stevenson, que narra a história de Dr. Jekyll, um pacato médico que se vê às voltas com a personalidade maligna por ele desenvolvida, o Sr. Hyde.
Caso não tenha lido o livro, uma boa referência para o quadro pode ser encontrada em mídias mais populares, como por exemplo, “O Incrível Hulk”, que muito se assemelha à primeira obra de ficção, já que vemos o calmo Dr. Bruce Banner sofrendo um acidente com raios gama que acabam fazendo com que desenvolva um alter ego, irracional, extremamente forte e fora de controle, o famoso gigante verde conhecido como Hulk.
Mas não precisamos ir à Inglaterra do século XIX, ou aos quadrinhos da Marvel Comics para encontrar essa dicotomia. Ela está dentro de nós mesmos. Todos temos um Mr. Hyde em nosso interior, lutando para sair, fustigando nossa mente e nossos sentidos para tomar o controle de nossos atos, e muitas vezes não apenas o deixamos escapar momentaneamente, mas permitimos que acabe tomando o controle.
“Mas eu nunca agredi ninguém”, você pode dizer. “Jamais matei ou senti vontade de matar”, você pode explicar, mas a grande sagacidade de Mr. Hyde é que ele não está apenas na violência física ou psicológica, e sim em muitas outras vertentes. Mr. Hyde, meus caros, possui muitas faces, e tantos outros disfarces.
A inveja que sente e te faz remoer quando vê alguém que possui algo que você quer intensamente a ponto de cegar seu julgamento e cometer atos que normalmente não cometeria. Ponto para Mr. Hyde.
A raiva que te faz perder a calma e agredir física ou verbalmente aqueles que você conhece, e até mesmo quem não conhece. Ponto para Mr. Hyde.
A vaidade que faz com que se julgue superior aos outros, e em uma verdadeira incorporação de Narciso acabe amando e enxergando apenas a si mesmo. Ponto para Mr. Hyde.
O desejo de guardar tudo só para si, repudiando qualquer ato que denote algum altruísmo e te leve a dividir algo do que tem com outra pessoa. Ponto para Mr. Hyde.
A vontade irrefreável de comer para acalmar alguma fera interior, que às vezes você sequer sabe que está lá. Ponto para Mr. Hyde.
A falta de vontade e de atitude que te fazem desistir de fazer as coisas e entregar-se à preguiça, sempre protelando, sempre procrastinando. Ponto para Mr. Hyde.
O desejo pela carne, pela luxúria, que muitas vezes faz com que te esqueça da verdadeira pureza de um sentimento verdadeiro, para trair a quem ama e estragar algo tão belo, rompendo de vez um elo de confiança e fidelidade por causa de uma fraqueza repentina e sem sentido. Um grande ponto para Mr. Hyde.
Essas são apenas algumas das atitudes (acredito que perceberam a referência aos sete pecados capitais) onde podemos identificar esse personagem, ou se quiser simplificar, o nosso lado mais escuro. E nesse ponto, retorno ao início para perguntar novamente, você já conversou com seu Mr. Hyde?
Muitas vezes tentamos evitar nosso lado mais podre, e todos temos esse lado, por mais que neguemos, e é tentando evita-lo que acabamos por não entende-lo, e ao não entende-lo ficamos mais aptos a cairmos em suas armadilhas sagazes. Complicado demais? Talvez não.
Ao entender nossos desejos mais escusos, nosso lado mais manchado, nossa faceta que espreita na escuridão de nossos sentimentos mais mundanos e rasteiros, podemos finalmente enxergar seus pontos fracos, e com isso, se não eliminar o monstro que habita no médico, ao menos poderemos controlar esse ser. Mas isso implica encarar nossa face deturbada, nosso lado deformado, ou, o nosso retrato de Dorian Gray. E isso dá medo, muito medo.
Recentemente descobri que tinha evitado demais as facetas de meu lado mais sujo, sempre fingindo que não via sua expressão doentia a fitar-me da escuridão. Sempre fingindo que não ouvia sua voz distorcida sussurrando em meu ouvido para que cedesse às condutas que citei acima, e a várias outras. E foi cedendo a uma delas que finalmente percebi a necessidade de parar de simular que não escutava e não via o monstro que havia no médico, para finalmente me voltar para ele, e dialogar com essa figura tão escusa.
Ainda não consegui, confesso. Ainda tenho medo de encara-lo, porque o que vejo não é bonito, não é nobre, não é honrado. É triste, amargo e decadente. Mas sei que é necessário, porque só assim vou entende-lo, e só assim vou apaga-lo... ou ao menos controla-lo, porque pior do que errar, é permanecer no erro. Pior do que ver o mal, é abraça-lo e andar de mãos dadas com ele.
E você, já tentou conversar com seu Mr. Hyde?
The Song Remains the Same
“A música permanece a mesma”. Esse é o título de um dos melhores filmes já feitos por uma banda, cujo título em inglês é “The Song Remains the Same”, produzido pelo icônico conjunto Led Zeppelin, um dos maiores grupos da história do Rock n’ Roll e da música em geral, sendo também o nome de uma de suas canções e do albúm que marca a trilha da película.
O filme, que mostra os bastidores e shows de uma das maiores turnês da banda, realizada nos EUA em 1973, ficou marcado na história do Rock. Mas a pergunta, para além do próprio Led Zeppelin é, a música de fato continua a mesma?
Sabemos que o Rock and roll já não é nenhum garotão (ao menos em termos cronológicos), tendo-se passado mais de seis décadas desde que surgiu nesse pedaço de rocha perdido no espaço, chocando puritanos, marcando território, e mudando de uma vez por todas a história da música mundial.
Não há certeza acerca da data exata do surgimento desse vovô radical, nem de uma única pessoa a quem se possa indicar a paternidade desse gênero revolucionário, que alguns definem como um misto acelerado de Rhythm and Blues, Country, Soul, Gospel, Folk e Blues, havendo até hoje quem aponte a canção “Rock Around The Clock”, de Bill Haley, gravada em 1954, como um dos marcos iniciais deste ritmo, apesar de existirem inúmeros registros anteriores de músicas e artistas que já tocavam o bom e velho Rock and Roll.
Desde seu nascimento, o Rock já trocou de roupa várias vezes, assumindo diversas abordagens, merecendo destaque o Heavy Metal, o Progressivo, Surf Music, Punk, Glam Rock, Hard Rock e o Grunge, além de vários outros estilos, o que mostra apenas o quão dinâmico e multifacetado é esse tipo de música, que vem se reinventando com o passar dos anos, jamais permanecendo com a mesma roupagem. Você pode até não gostar da nova forma assumida, mas há de convir que o rock and roll ainda está ali.
E variado como é, o rock também tem sua faceta sombria, sendo associado ao temível “Clube dos 27”, nome dado à lista de músicos deste gênero falecidos aos vinte e sete anos de idade, citando-se, entre os mais famosos, Janis Joplin, Jim Morrison (dizem que ele ainda está vivo por aí), Jimmy Hendrix, Brian Jones, Kurt Cobain e Amy Winehouse. Mas mesmo com essas tristes baixas, é certo que o gênero nos trouxe mais animação do que lamentação.
Com tudo isso, pergunta-se, a música continua a mesma? A resposta é não, e ao mesmo tempo sim. O rock mudou, diversificou, alguns chegaram a dizer que morreu, mas ele sempre volta, renascendo das cinzas como a fênix, e com uma plumagem nova para angariar cada vez mais fãs. Mas apesar das tantas modificações, o espírito original, o DNA, a atitude atrevida e modificadora estão sempre ali, fazendo com que seja reconhecido, mesmo com uma roupa diferente.
E que bom que ele não permaneceu e não permanece o mesmo, do contrário, como teríamos tido a chance de conhecer o talento de Chuck Berry, o piano frenético de Jerry Lee Lewis, a diversidade dos Beatles, a potente voz de Janis Joplin, a virtuosidade de Jimmy Hendrix, a inteligência e o atrevimento de Jim Morrison e dos Doors, a profundidade de Pink Floyd, a potência do Led Zeppelin, o lendário David Bowie (o camaleão do Rock), a forte batida dos Ramones, The Clash e Sex Pistols, a variação do Queen, a inovação trazida por Nirvana e Pearl Jam e, claro, a genialidade do rei, do monarca, de sua majestade Elvis Presley, que deixou o prédio cedo, cedo demais. Há quem diga que ele não morreu, mas apenas voltou para casa. Vai saber?
Não fosse essa constante troca de roupas, essa inovação sem fim, essa busca constante pela mudança para não ficar sempre no mesmo lugar, o rock de fato estaria morto, como muitos entusiastas da forma que o gênero tinha em seus primórdios chegaram a anunciar, mas o fato é que ele está mais vivo do que nunca, alimentado pela insatisfação com o que é comum, pela necessidade de inovar, pelo protesto, pelo encontro de novos paradigmas, ou pela simples e pura alegria de tocar e cantar, balançando e rolando por aí enquanto as notas musicais fervem o sangue e aceleram o corpo.
O Rock está vivo, meus caros, e o dia 13 de julho está aí para nos lembrar disso, então, toque seu violão, sua guitarra, sua gaita, sua batera, ou simplesmente pegue seu bolachão de vinil, sua fita cassete, seu cd, pen drive ou app de compartilhamento de músicas, e escolha, porque o cardápio que esse vovô super animado oferece é tão variado quando as formas que ele adotou nessa metamorfose ambulante (claro que eu não poderia deixar de citar Raul).
Balance a cabeleira, sacuda o esqueleto, e cante, seja no timbre sedutor e encantador de Elvis, seja na incrível voz de Mercury, ou na ferocidade do tom de Robert Plant, porque hoje é o dia mundial do bom e velho Rock and Roll.
O preço de uma lágrima
"Você não sabe o preço de uma lágrima derramada."
Certa vez ouvi essa frase, e ela me fez pensar sobre várias coisas, em diversos aspectos, mas não mais do que no momento em que fiz alguém chorar. Ser a causa da lágrima de outrem, e de fato arrepender-se disso pode não ser tão doloroso quanto a tristeza que a outra pessoa sente, mas não deixa de ser um sentimento amargo, difícil de ser mensurado, e que jamais será esquecido.
Na vida estamos sujeitos a sermos causas das lágrimas de alguém, especialmente das pessoas a quem amamos, porque são justamente elas que mais sofrem com nossos erros, com nossos desvios de caráter, mentiras, traições, ou qualquer que seja o equívoco que tenhamos cometido. Às vezes sequer temos consciência de que estamos fazendo algo errado, às vezes temos essa percepção, mas ainda assim seguimos em frente, até que as consequências de nossos atos surjam, nos mostrando, da forma mais difícil, que o preço de uma lágrima derramada é muito, muito alto.
Palavras que ferem, gestos que machucam, atitudes que levam a caminhos sem volta. A todo momento nos deparamos com oportunidades em que podemos tanto cometer esses erros, como também evita-los, dependendo em muitos casos da nossa experiência de vida, mas principalmente de nosso caráter, que é algo que não possui idade.
Raiva, rancor, tentações, são apenas algumas das pontes que levam ao cometimento de atos que acabam deixando marcas difíceis ou mesmo impossíveis de serem apagadas, que rompem elos que provavelmente jamais serão forjados novamente, e cabe apenas a quem se depara com essas pontes escolher atravessá-las ou modificar a rota para tomar os caminhos certos. Nem sempre conseguimos, mas sempre podemos tentar. Sempre devemos tentar.
Então tente. Pense dez, cem, um bilhão de vezes antes de tomar atitudes que o levarão a um ponto de não retorno, a uma rota de dor, para você, e principalmente para a pessoa que sairá machucada com sua conduta.
Você não sabe o preço de uma lágrima derramada, então, não pague para ver, porque garanto que custa muito, muito caro, de um valor inestimável, que jamais poderá ser pago.
Arrasta o pé
Noite fria, noite estrelada, bota nos pés, roupa quadriculada. Época de tirar a poeira daquela blusa, daquele vestido que está guardado há um bom tempo no armário, de botar o chapéu e se preparar para dançar por horas sem fim o bom e velho forró pé de serra, aquecidos por uma boa dose de quentão e com a barriga forrada por repetidos pratos de canjica, pamonha, milho assado e toda uma sorte de comidas típicas que são revisitadas nessa época do ano.
Tempo de comer milho assado e canjica pertinho da fogueira em uma noite agradável de céu estrelado. De dançar um forró coladinho depois de saborear uma boa pamonha e uma dose de quentão que esquenta até os ossos.
Época de ouvir os hinos de nossa cultura, que tanto enriquecem o povo nordestino, cantados por figuras emblemáticas como Gonzagão, Dominguinhos, Sivuca e cia, que em nada têm a ver com os títulos plastificados e ritmos importados de outras áreas que pouco representam nossos laços e nossa história, mas que infelizmente têm sido cada vez mais buscados em um período em que deveríamos enaltecer o que veio de nossa terra (me perdoem, mas essa é uma crítica inevitável).
Como é gostoso ficar junto a quem se ama e divertir-se com as crianças a soltarem fogos (com segurança, certo?), com os velhos a contarem os causos de sua época, cantando a música que traz a marca de nossa história, por mais desafinados que sejamos.
Como é bom ouvir o canto manhoso da sanfona, a batida ritmada da zabumba e o tilintar desenfreado do triângulo, marcando o compasso e contagiando aquela dança colada e gostosa de dois pra lá, dois pra cá, que leva ao salão desde os jovens mais moços até os jovens mais experientes, arrastando o pé até que o tocador cante a saideira.
Bandeirolas coloridas, quadrilhas sincronizadas ou daquelas improvisadas, barracas com comidas típicas, jogos, tiro ao alvo e até mesmo beijos. Matutos e matutas caracterizados, fogueiras iluminando no chão e fogos brilhando no alto, trazendo aquela sensação única que talvez só quem seja dessa terra sofrida, mas tão bela, sinta.
É São João. Época de relembrar, e de viver para que novos momentos gostosos fiquem marcados nas lembranças. Tempo de saborear um período tão característico de nossa terra e que define tão bem nossas raízes. Momento de dançar e divertir-se. De ser velho com os velhos que contam nossa história, e de ser jovem com os mais moços que riem alto e se divertem.
É São João, então pega teu par, cabra, que a sanfona tá cantando e o arrasta pé vai até a fogueira apagar e o sol acender.
Viva São João.
Não deixe de ser criança
Dia desses estava entre amigos, quando um deles, após uma brincadeira de outro, lançou um revoltado “deixa de ser criança”. A despeito da reinação (sim, sou velho mesmo) que o outro tinha aprontado para receber aquela reprimenda, o argumento me deixou com uma semente plantada no terreno da cachola.
Parei então para pensar se em algum momento tinha deixado de ser criança, e para minha surpresa vi que já fazia um bom tempo que não agia como tal. Deixar um pouco de lado o terno e a gravata, a preocupação com as contas, com os problemas do cotidiano e simplesmente revestir-se de um espírito pueril, sem maldade, sem dedos acusatórios apontados, sem debates acirrados sobre quem está certo ou não, para ao invés disso tudo, simplesmente brincar.
Às vezes olho para os meus sobrinhos, para as bobagens que falam, para a extensão da imaginação de cada um, e a disponibilidade de usar o tempo para fazer algo inteiramente fora do comum, e isso me remete a um desenho que era febre na minha infância, os Muppets Babies, em que as versões pequenas de animais e outros seres conviviam juntos em um quarto de berçário, e cada dia era uma aventura diferente, mesmo naquele ambiente limitado, onde um simples abrir de porta de um armário podia levar os personagens a uma guerra espacial, ou a uma floresta misteriosa, ou a qualquer outro cenário cheio de emoção, e quando lembro que hoje eles, meus sobrinhos, fazem isso com uma facilidade ímpar, isso me causa, além de uma forte saudade, uma inveja daquelas que podemos chamar de boa.
Essa semana eles estiveram na minha casa, e como de costume, deixaram alguns brinquedos aqui. Um deles era um cavalo de pau. Algo tão simples, tão artesanal, sem chips, sem tecnologia de ponta, sem óculos de realidade virtual ou gráficos em 3D. Algo tão... infantil. Então, olhei para os lados e fiz a coisa mais lógica que um adulto poderia fazer... peguei o cavalo e fui brincar.
Imaginem um adulto na casa dos trinta, pertinho da vizinhança dos quarenta, correndo com um cavalo de pau de um lado para outro da casa. Ridículo? Ridicularmente infantil? Pois eu digo que foi incrivelmente bom, e que havia muito eu não me sentia tão livre. Olhei para dentro de mim, para o garotinho que ainda está aqui, e a quem não vinha dando a devida atenção, assim como tantos e tantos adultos fazem. Então, peguei na mão dele e fomos brincar, e como foi incrível.
E em meio a tantas lembranças me veio à mente mais uma, a de meu saudoso avô, que recentemente partiu para os braços do PAI. De como ele sorria e brincava quando estava conosco, de como ele se tornava novamente uma criança quando se juntava com a penca de moleques que eram seus netos, dando-lhe uma verdadeira canseira, mas ao mesmo tempo enchendo seu espírito de alegria.
Nunca vou esquecer da disposição dele e do seu sorriso quando brincava conosco, e hoje vejo que era nesses momentos em que a criança que estava dentro dele saía para brincar com as outras. E como era bom. E como é bom.
Então, a você, que está lendo o que escrevo nesse momento, assim que puder, dê uma pausa nas suas preocupações, no estresse e até mesmo nas responsabilidades, e pegue um carrinho, um cavalo de pau, uma boneca, bolinha de gude ou qualquer outro brinquedo que te remeta aos melhores momentos de sua infância, e seja pequeno de novo. Corra, grite, pule e saia por aí parecendo um adulto maluco, porque às vezes a seriedade de quem é são é chata pra caramba.
Brinque, divirta-se, chame a criança que está dentro de você para brincar um pouco. Garanto que valerá à pena.
E diversamente do que meu amigo disse, o meu conselho é... não deixe de ser criança!
Máscaras
Quando tudo isso acabar, qual máscara você vai tirar?
Há muito tempo a humanidade faz uso deste utensílio, seja em sua forma material, seja no modo de disfarçar suas reais intenções por motivos próprios. Fingir ser quem não é, esconder sua verdadeira personalidade, ludibriar as pessoas com quem convive para passar a elas uma falsa impressão é um expediente utilizado por uma grande parte da população, por vezes em raras ocasiões, em outras, de forma tão constante que o próprio usuário acaba se confundindo em quem de fato é, de tanto viver a falsa personalidade que atribuiu a si mesmo.
Neste ponto, em um momento em que nos vemos em meio à necessidade de utilizar máscaras artificiais, será que tiraremos nossas máscaras naturais? Em isolamento não precisamos mentir para quem é de fora. Em nossas casas, em nossos refúgios podemos ser nós mesmos, sem precisar agradar, sem precisar fingir para ganhar pontos ou elogios. Entre quatro paredes podemos colocar no cabide as falsas personas das quais nos revestimos.
Neste contexto, questiono, ao menos aos que fazem uso deste expediente (e aqui leitor, sinta-se à vontade para negar que finge, ao menos algumas vezes ao dia, ser uma pessoa diversa da que de fato é, já que a intenção deste que vos escreve não é de forma alguma generalizar), quando tudo isso acabar, quando tudo reabrir, quando a rotina recomeçar e as ruas se tornarem seguras novamente (ao menos quanto ao vírus), você retirará as duas máscaras, ou apenas substituirá uma pela outra?
Não seria ótimo livrar-se de uma máscara que pesa tanto como essa? E falo por experiência própria, de quem por vezes já fez uso dela. Fingir ser algo que não é pode até ser bom, por alguns instantes, a título de fantasia, de faz de conta. Mas usar essa máscara de forma constante pode sufocar, pesar, e mesmo chegar ao ponto de criar uma dependência dela, fazendo com que se torne uma angústia e ao mesmo tempo um alívio, como uma droga.
Então, meus caros, finda essa fase tão desgastante pela qual estamos passando, que tal pendurarmos junto com a máscara que necessitamos agora, aquela que adotamos com o passar do tempo? Talvez o alívio sentido acabe sendo duplicado. E a liberdade, ah, essa será bem maior.
O primeiro lar
Qual foi sua primeira casa nesse mundo? Já parou para pensar nisso? Aquela primeira habitação, que te deu acolhida e proteção, que te afastou do frio e das intempéries? Provavelmente você dirá que não lembra, e que eventualmente recorda de algo em virtude de fotos antigas que tenha visto. Mas não é a essa morada que me refiro.
A nossa primeira moradia não tinha portas, não tinha paredes, não tinha teto, não tinha nada que uma habitação comum normalmente possui, e não vamos confundir com a música de Vinícius de Moraes, “era uma casa muito engraçada”, porque a casa a qual me refiro anda, vê, fala e sente, e como sente.
A casa a qual me refiro é amplamente conhecida por um nome tão único, mas tão singular que sequer existe uma palavra em nosso idioma para rimar com ele. A nossa mãe.
Foi nela que habitamos, que nos formamos, que crescemos, nos nutrimos não apenas do alimento do corpo, mas do amor que alimenta a alma. Foi ali que primeiramente nos sentimos acolhidos e protegidos em um lar tão aconchegante, tão nosso que tivemos de ser expulsos dali, chegando a este mundo lançando altos decibéis de reclamações pela brusca e involuntária saída de nosso aconchego.
Mas não é ali que cessa essa conexão única, estabelecida de uma forma que escapa às explicações científicas. Para muito além dos nove meses no ventre, nossas mães nos carregam por uma vida inteira em seus corações, chegando por vezes a sentir quando acontece algo com seus rebentos, ou mesmo pressentir quando está para ocorrer alguma coisa.
Ou vai dizer que nunca ficou apreensivo quando ouviu de sua mãe, antes de ir àquela festa tão aguardada, que ela tivera um pressentimento não muito bom, e que era melhor você ficar em casa? Quer um conselho? Quando ouvir algo do tipo, não saia.
Mãe é isso, é casa que habitamos no início e refúgio que sempre buscamos nos momentos de tristeza e necessidade. É eterna professora, dona de valiosos conselhos que levaremos por toda nossa caminhada na estrada da vida. É a contadora de histórias que nos coloca para dormir, aquela que faz os melhores cafunés, que tem a melhor comida, o melhor colo, o melhor beijo e o melhor abraço.
É a dona da mira perfeita, que consegue acertar uma sandália no bumbum do filho a uma distância de fazer inveja ao melhor sniper, mas que acerta também nas lições e nos carinhos que ajudam a construir nosso caráter, nos formando como seres humanos cada vez melhores.
Enfim, mãe é mãe, única, ímpar, singular e sem rima, casa, morada, aconchego e refúgio. Porto seguro, amiga, conselheira, professora e autoridade. Mas apesar de todas essas definições, existe uma que a descreve como nenhuma outra...
Amor.
Um feliz dia das mães para essas pessoas tão abençoadas, em especial para a minha, que além de ser dona de uma ótima mira, é dona também do maior coração desse mundo todo.
Limpeza da alma
Em tempos de Covid-19 uma das recomendações que mais ouvimos é a de higienizarmos mãos, rosto, corpo, as roupas e até mesmo as embalagens dos produtos que adquirimos nas esparsas saídas de nosso isolamento. Para quem tem amplo acesso a água e a produtos de higiene isso não representa qualquer dificuldade.
Mas aproveitando o ensejo sobre o assunto limpeza para livrar-se de um vírus extremamente perigoso, que tal falarmos da higienização de outra parte nossa, a qual damos tão pouco valor, mas que é nossa parte mais importante? A higienização da alma. O Covid-19 é um mal recente, surgido há poucos meses atrás, mas o vírus que infecta e adoece o espírito é algo tão antigo quanto a própria humanidade, que enfraquece e mata aos poucos, e que possui um contágio tão rápido quanto as mazelas do corpo que existem atualmente.
Esse vírus já recebeu vários nomes com o passar do tempo. Inveja, gana, ira, cobiça, preguiça, luxúria, além de vários outros, e apresenta estágios diversos, atuando de formas distintas a depender do estilo de vida de quem foi infectado. Quem nunca viu uma pessoa falando mal da outra pelas costas, por vezes disseminando informações que sequer sabe se são verdadeiras? Esse é um exemplo do vírus da alma.
Quem não escuta o outro, julgando-o errado antes mesmo de ouvir seu lado da história, desejoso de impor um ponto de vista sobre algo que considere correto acima de qualquer outra coisa é uma pessoa que manifesta um dos graus de infecção do vírus da alma.
E o que dizer de quem possui o péssimo hábito de julgar constantemente o próximo, apontando dedos acusadores e proferindo condenações como se tivesse um histórico de perfeição em todos os atos praticados em sua vida? A hipocrisia, meus caros, é uma das maiores manifestações do vírus da alma.
Agressividade, impaciência, intolerância, preconceito, vaidade, egoísmo, todas essas e mais tantas outras manifestações do vírus que ataca a alma podem ser vistas constantemente em nosso dia a dia, e o pior de tudo é que essa é uma infecção silenciosa, que não acende qualquer sinal de alerta, ao menos para a pessoa que é por ela acometida.
E como fazer a higienização da alma contra esse vírus tão potente? Bem, isso requer vigilância constante e doses diárias de autocrítica e busca incessante de DEUS. Essa é a única forma de higienizar-se contra esse mal que espreita constantemente, e de antemão aviso, não é nada fácil.
E para não querer pousar de bom e sem defeitos nessa publicação, o autor esclarece de imediato que é afetado por boa parte dos sintomas citados acima, mas que está buscando tratamento para, se não melhorar de vez, ao menos amenizar os efeitos dessa mazela.
Não é nada fácil, maaaasssss...
Sigamos em frente.
O que você deixou de fazer hoje?
O que você deixou de fazer hoje? Ao ouvir essa pergunta a resposta que possivelmente surgirá de forma automática será a de algum compromisso previamente marcado na agenda. O pagamento daquela conta, por exemplo, que não foi feito porque as demais obrigações exigiram um tempo excessivo para seu cumprimento.
Deixar de ir ao mercado para fazer a feira, de levar o carro na revisão, de ir buscar a roupa na lavanderia, ou de ir ao banco tratar de algum assunto que ainda exige a ida pessoal até o local. Frente a um questionamento desse tipo, a primeira imagem que vem à mente é a agenda e tudo o que foi anotado ali.
Mas o direcionamento da pergunta não é esse, então, repito, o que você deixou de fazer hoje? Deixou de ajudar alguém que precisava? De visitar um amigo que não vê há muito tempo? De ligar para seus pais ou irmãos que residem em outra cidade, ou mesmo de ir visita-los pessoalmente se morarem perto de você?
Você brincou com seus filhos hoje? Foi pai ou foi mãe para eles? Beijou quem ama, ou fez amor com essa pessoa para depois ficar ao seu lado, desejando que aquele momento nunca acabasse? Olhou nos olhos de alguém e declarou-se? Escreveu uma poesia, ou ao menos desejou fazê-lo? Ou deixou de fazer tudo isso, lembrando-se apenas do que fora anotado naquele pedaço de papel ou no aplicativo de compromissos do celular?
Sim, os compromissos são importantes, e devem ser cumpridos, mas não faça deles a prioridade de sua vida. Dê-lhes o lugar que merecem em seus dias, mas não esqueça do que é realmente relevante em sua existência. Dos momentos que só acontecerão uma vez e que nunca mais se repetirão. Das pessoas que poderão passar pela sua vida, e ao irem embora, nunca mais voltarem. Dos amigos e amores que hoje estão aqui, mas que talvez amanhã não estejam. Dos entes que já não estarão aqui quando você lembrar-se de dizer-lhes “eu te amo”.
Boletos podem ser pagos com multa, reuniões podem ser reagendadas, a feira pode ser feita no dia seguinte, mas os momentos que realmente importam, esses são únicos, ímpares e especiais, e uma vez perdidos não podem ser substituídos. Então, sejam sim pessoas responsáveis que cumprem com os compromissos de suas agendas, mas nunca, nunca esqueçam daqueles que estão anotados em seus corações. Eles são importantes demais para serem deixados em um canto empoeirado de nossas vidas.
E aí, o que você deixou de fazer hoje?
Por dentro
Beleza. Ah, a beleza. Objeto de desejo, inspiração para poetas, apaixonados e artistas das mais diversas áreas. Objetivo por tantos almejado, capaz de levar pessoas a atitudes por vezes questionáveis, e em tantas outras radicais.
Na busca por esse revestimento, para muitos brilhante, as pessoas acabam seguindo caminhos extremos, passando por procedimentos desnecessários e extremamente invasivos. Mas talvez o pior desses procedimentos seja o processo gradativo de esvaziamento interno.
Ao olharem demais para o lado de fora, esquecendo de preservar e embelezar o lado de dentro, as pessoas podem acabar tornando-se modelos de vasos de luxo. Recipientes extremamente belos no lado externo, mas vazios, ocos, carentes de substância internamente.
Vários ditos populares que podem parecer clichês para um leitor mais desatento indicam a importância do enxergar-se por dentro, tais como “o que importa é a beleza interior”, ou “nunca julgue um livro pela capa”. Sim, são mensagens que foram tão repetidas que pareceram ter perdido o significado, mas acredite, não perderam.
Olhar para dentro de si, atento a cada detalhe e a cada característica pode ser um processo lento e demorado, por vezes até extenuante, mas que pode levar a ganhos imensuráveis no entendimento do que de fato vem a ser a beleza, não apenas em si mesmo, mas também no outro.
Uma casa pode possuir a melhor das fachadas, mas internamente não ter graça alguma. Um livro pode ter uma capa brilhante, chamativa e atraente, mas seu conteúdo pode ser tão vazio quanto o vácuo. Assim como uma pessoa pode externamente atender a todos os padrões de beleza, mas ser dona de um interior que não venha a causar encantamento algum.
E qual é o problema em querer ter um corpo, um rosto, uma aparência bonita? De se cuidar, de buscar aprimorar a estética? Nenhum. O problema aparece quando isso é alçado a uma posição de prioridade na vida de cada um, fazendo com que reformemos, pintemos, enchamos a fachada da casa de detalhes, deixando-a vazia, sem cor e sem vida por dentro.
Não há empecilho algum para que sejamos ambas as coisas, um livro com uma capa bonita, mas com uma história ainda mais bela. Não há obstáculo para que possamos construir ambas as coisas. Então, que cuidemos não apenas da casca, mas especialmente da essência, afinal, fazendo uso de mais um ditado popular, “a beleza um dia acaba”, e quando ela for embora, o que vai ficar?
Pensemos nisso.
Encontrar-se
O mundo está tão corrido que poucas são as vezes em que temos um pouco de tempo para parar e pensar sobre o que nos rodeia, sobre o que nos permeia, sobre o que nos norteia. O ritmo acelerado de tudo exige de nós uma dedicação que acaba por nos consumir momentos preciosos não apenas de contato com nossos próximos, mas com nós mesmos.
Quantas vezes, após um árduo dia de trabalho, paramos para pensar no que fizemos, no que vimos, ouvimos ou aprendemos? Quantas vezes pesamos nossos atos, ainda que por um breve instante, tentando absorver o significado deles e o ganho ou perda que trouxeram às nossas vidas? E como se não bastasse nossa falta de tempo, ainda gastamos o pouco que nos resta em aventuras virtuais que pouco ou nada acrescentam, preferindo muitas vezes vislumbrar o jardim do vizinho ao invés de cuidar do nosso.
Mas agora somos repentinamente obrigados a fazer isso, reclusos em nossas casas em virtude da ação de um inimigo invisível. A quarentena nos retirou da zona de alienação em que nos encontrávamos e nos pôs em um lugar de pensamento, onde repentinamente voltamos a fazer algo que nunca deveríamos ter abandonado, o ato de ter contato com nós mesmos, mas não o contato superficial que ocorre pelo mero fato de se estar sozinho, e sim o contato profundo, íntimo e visceral.
Lembro que o período pascal sempre foi uma forma de fazermos isso, de pensarmos mais a fundo nossa existência, ponderando sobre um sacrifício feito há milênios para pagar o preço de nossos pecados. Momentos onde nos recolhíamos e pensávamos sobre nossas atitudes, sobre o impacto delas no mundo, e principalmente, sobre se estavam de acordo com o que DEUS espera de nós.
Mas sequer isso estávamos fazendo, abandonando também estes momentos em detrimento de espetáculos, de programações e de aventuras nas quais não entrávamos em contato com nosso interior. E por que insisto nesse contato? Porque é através dele que podemos conversar com DEUS. É através desse canal de concentração que podemos estabelecer contato, porque são em momentos assim em que abrimos nossas almas e nossos corações.
Que a experiência ruim causada por esse vírus devastador possa trazer algo de bom. Que possa nos devolver algo que esquecemos quando resolvemos pisar no acelerador em uma jornada louca e desenfreada, adiantando os ponteiros do relógio e consumindo o tempo sem que nos déssemos conta disso, esquecendo de pesar nossos atos. Esquecendo de entrar em contato com DEUS.
Ainda não é tarde para isso. O tempo, ainda que acelerado, não chegou ao fim. Então que possamos nos conectar novamente, não com dispositivos eletrônicos, mas com nosso interior, nossa alma, para que no silêncio de nossos corações possamos escutar aquela Voz tão familiar e que nos dá tanta saudade.
A Voz de DEUS.
Não é frescura
Você já parou para pensar no quanto as palavras podem machucar? No quanto os gestos podem marcar alguém? No quanto coisas que parecem sem importância em dado momento podem acarretar em danos que durarão para uma vida inteira? Certa vez ouvi de uma pessoa que determinadas coisas, quando ditas, podem ser piores que verdadeiras surras físicas, porque deixam feridas que demoram sobremaneira para alcançar a cicatrização plena, que a depender da extensão delas, nunca chega.
Nesse ponto meu povo, devemos falar de bullying. Muitos podem até revirar os olhos e suspirar com uma nítida impaciência, demonstrando que adotam o pensamento de que isso é nada mais, nada menos do que pura e inequívoca frescura. Será?
Sou de uma geração que não cresceu com essa preocupação, e que adotava diariamente, fosse na rua, fosse na escola, aquele típico comportamento estúpido de alguns jovens, consistente em perseguir, apelidar e criar um extensivo rol de atitudes lamentáveis quando o assunto era humilhar alguma figura que sofria a infelicidade de ser eleita pelos simples fato de possuir alguma característica peculiar. E tenho propriedade para falar, porque sofri, e também pratiquei o tal do bullying.
Ainda em contato com colegas daquela época, escuto ou leio vez por outra o bom e velho argumento de que “o mundo está cheio de frescura”, que o “mimimi” impera nos dias atuais, e que todas aquelas atitudes que fazíamos orgulhosos de nossa falta de senso eram nada mais, nada menos do que inocentes brincadeiras, que não deviam ser levadas a mal. Será?
Apenas quem sofria as agressões, fossem físicas ou verbais, sentia na pele e no âmago a dor que aquilo causava. É como ensina aquele dito popular, “quem bate esquece, mas quem apanha não”. Para quem bate, quem xinga, quem marca, seja o corpo ou a alma, a dor não vem, a não ser quando tem a noção, ainda que mínima, de que o ato praticado gerou um tipo de dano tão extenso. Não sendo este o caso, fica fácil dizer que bullying é frescura.
No caso deste que vos escreve, e que esteve dos dois lados da linha, existe propriedade para falar que essas agressões doem para quem as sofre, e acabam doendo também em quem as pratica e descobre posteriormente o mal que causou. Apesar de curta, tive minha cota de atitudes agressivas e reprováveis, das quais me arrependi no momento seguinte em que as cometi, por saber exatamente o tipo de sofrimento que tinha causado.
“E por que então você fez isso se sabia o problema que estava causando?”, pode ser a pergunta de muitos. Porque por trás de quem comete esse tipo de atitude existe uma história, existe um rol de machucados que incomodam, que causam uma dor que necessita ser liberada, e seja por fraqueza ou meramente falta de orientação muitos acabam usando o mesmo expediente que causou seu sofrimento como uma espécie de válvula de escape. No meu caso, a dor eram as provocações sofridas, as quais eu replicava em outras pessoas. É justificável? Não. Mas muitas vezes é a realidade.
Então, na pele de quem sofreu por causa dos erros dos outros, e que cometeu esses mesmos erros em dado momento, posso afirmar com certeza. Não é frescura. Não é bobagem e nem patrulha do politicamente correto. Lembre-se, quem bate não lembra, e ainda ri orgulhoso pelo golpe lançado, mas quem recebe a agressão leva na alma a memória daquilo.
Se é jovem não pratique. Se é experiente, oriente. Mas nunca, nunca esqueça que a dor do outro dói da mesma forma que a nossa, basta ter a sensibilidade para entender isso.
As pequenas coisas
Pequenas coisas. O termo pode levar à conclusão de que se tratam de questões de menos importância, que podem ser relegadas a outro momento, a outro tempo, a uma resolução posterior, feita entre o cumprimento de uma ou outra tarefa que se mostre relevante em nossas vidas. Mas nem sempre as tais “pequenas coisas” deixam de causar impacto em nossas vidas.
O maior exemplo é o que temos visto recentemente, em que algo de um tamanho tão insignificante tem causado tragédias que marcarão o mundo para sempre. Um vírus, um ser microscópico, que sequer pode ser visto a olho nu, derrubando nós, seres humanos, que nos consideramos donos de tudo, senhores da razão e da verdade, proprietários de toda e qualquer coisa em que se possa bater os olhos.
A raça humana e sua constante necessidade de fazer coisas colossais e grandiosas, espantosas aos olhos de todos, para serem vistas a quilômetros de distância. A raça humana e seu desejo de domínio, de expansão, de agigantar-se para mostrar sua superioridade vê-se repentinamente acossada, cercada e tomada de incerteza diante de um ser tão minúsculo que nem ela pode ver sem o auxílio de um maquinário específico.
Existe lição mais grandiosa do que a que estamos recebendo pela ação de algo tão minúsculo?
Repentinamente nos vimos privados e desejosos de ter novamente algo que durante muito tempo consideramos como sendo “pequenas coisas”. Um abraço, um beijo, o simples ato de se estar ao lado de alguém sem temer uma infecção que pode vir a ser fatal. Uma saída na rua, pelo simples fato de ter a liberdade de sair na rua. Um sanduíche comprado naquele trailer da esquina, a cerveja tomada no balcão de um bar, o toque, a carícia entre namorados. As pequenas coisas.
De que nos valem nesse momento as temidas armas de destruição em massa, os materiais bélicos de última geração, construídos para nos afastar uns dos outros, para servir de fonte de ameaça e extermínio para nossa própria espécie, quando não conseguimos dar conta de algo que sempre consideramos como “uma pequena coisa”, e que agora se mostra como a verdadeira ameaça?
De que vale nossa tão auto proclamada grandeza e nosso domínio citado com tanto orgulho quando temos que nos trancar em nossas casas diante de uma ameaça invisível?
Talvez a grandeza maior que nossa espécie possa mostrar agora seja a de reconhecer sua pequenez, e a de incluir-se no rol de “pequenas coisas” que permeiam esse enorme universo. Talvez a maior forma de combater essa ameaça invisível seja justamente voltar a valorizar os pequenos atos, aqueles que deixamos de atribuir importância com o passar do tempo e com a aceleração das atividades do dia a dia.
Pequenas coisas como reconhecer a importância desta mazela. Como agir com atos simplórios como lavar as mãos, cuidar da higiene, evitar aglomerações e principalmente, ficar em casa. Pequenas coisas, como o ato de valorizar as pequenas coisas.
Não é o mesmo que pedir que se construa uma ponte quilométrica, ou um arranha-céu que ultrapasse as nuvens, ou mesmo um túnel submarino. São apenas atos simples, pequenos, que serão mais que suficientes para dizimar esse minúsculo, mas tão perigoso vírus que nos assola.
No fim das contas, para o bem ou para o mal, as pequenas coisas são muito mais relevantes do que imaginamos.
Contágio
Não deem abraços, beijos, afagos. Não apertem as mãos, não se cumprimentem, resumindo, não mantenham contato uns com os outros. Essas são algumas das recomendações que temos recebido com o intuito de evitar que o que é uma verdadeira pandemia tome rumos catastróficos, e além da preocupação com o próprio corona vírus (COVID-19), a população tem vivenciado um sentimento de apreensão justamente por causa do... isolamento.
Então você pode perguntar, “é sério que a população está preocupada com o isolamento? Com a proibição de manter contato físico com aqueles que lhe são próximos? Logo ela, a mesma população que antes do surgimento do vírus tinha eleito justamente esse comportamento como algo perfeitamente normal?”
Há algum tempo atrás escrevi sobre como o homem estava se maquinizando no sentido de tornar cada vez mais frias e autômatas suas relações humanas, comportamento que víamos em mesas de bares e restaurantes, em pátios escolares, em salões universitários, e dentro de nossas próprias casas, onde famílias inteiras dividiam mais o seu tempo voltando olhos e dedos ágeis e afoitos para as telas de celulares ou computadores do que uns para com os outros.
Naquela época havia poucas preocupações nesse sentido, e parco era o número de queixosos que reclamavam sobre a falta de contato humano nas relações com amigos, conhecidos e familiares. E o que mudou então? O que mudou é que agora não podemos optar como outrora podíamos. O que mudou é que o que antes era uma escolha tornou-se um impedimento, uma proibição, e acabamos perdendo, ainda que momentaneamente, algo que tínhamos ao nosso dispor com uma facilidade digna de nota.
É nesse ponto que surge aquele velho dito popular, “só valorizamos algo quando perdemos”, ou algo perto disso. Agora, mais do que nunca, somos impelidos ao isolamento, a fazer uso apenas das máquinas frias e sem vida que temos ao nosso dispor, em detrimento do toque acolhedor e caloroso daqueles que estão vivos. E agora, mais do que nunca, ansiamos por esse contato como há muito não fazíamos.
Tal como um filho que chora a morte de um dos pais e sente remorso e saudade, condenando-se por não ter dado mais tempo àqueles que amava e que não estão mais ali. Ou como um namorado que cai na tristeza por ter sido deixado por uma namorada cansada de sua indiferença, de sua distância, e que optou por seguir em frente enquanto ele ficou para trás, com sua saudade e arrependimento.
A diferença, meu povo, é que nossa perda, ao menos a princípio, não é definitiva, durando enquanto persistir a pandemia que nos circunda, e tão logo ela desapareça, e DEUS queira que desapareça, teremos de volta a possibilidade de abraçar, de beijar, de tocar e acalentar aqueles que amamos. Mas a pergunta é, realmente faremos isso?
Ou seremos como o namorado teimoso, que promete com lágrimas nos olhos que vai mudar, para voltar a repetir o comportamento costumeiro assim que tem de volta o amor que ameaçava deixa-lo?
Cresci ouvindo um ditado, carregado da sabedoria do povo, onde se afirma que “não há um mal que não traga um bem”. Então, que esse mal que nos assola, que nos preocupa e nos afasta, traga o bem da valorização que com o tempo deixamos de dar ao que e a quem realmente importa. Ao amor que sentimos, e às pessoas que amamos.
Assim que esse vírus intrometido e inconveniente (porque é inconveniente aquele que entra sem ser convidado) for embora, que abracemos então, que beijemos então, que amemos então o amor puro, o amor que acolhe, que agrega e que aproxima, e que façamos isso sem moderação.
Esse sim, meus amigos e amigas, é o contágio de que precisamos.
Esse sim, é o contágio que salva.
Sexo Frágil?
Sexo frágil, é como muitos gostam de definir as mulheres, baseados em uma questão que envolve tão somente a parte fisiológica ou a força bruta. Mas será mesmo que podemos limitar a mulher, um ser tão rico em características, fazendo uso tão somente do substantivo da fragilidade?
Evidentemente que a resposta é negativa. Não há uma forma de definir a mulher nem com uma e nem com inúmeras palavras. Como optar por dar uma definição a alguém que é frágil, mas ao mesmo tempo forte o suficiente para aguentar todas as complexidades de uma gravidez, que culmina com as dores indefiníveis no momento do parto?
Como limitar alguém que chora com a facilidade com que penteia os cabelos, mas que se torna uma verdadeira fera no momento de lutar por seus objetivos, desafiando a tudo e a todos, não importa o risco envolvido, para proteger as pessoas que ama?
Como trazer para o raso um ser que é cheio de profundidade, e que cria laços de tamanha intimidade com os filhos que a própria lógica científica não consegue encontrar uma explicação plausível?
Como querer dar só uma expressão a alguém tão rica em personalidade, e que consegue enxergar além das expressões para ver o que há em nosso interior?
Sim, as mulheres são complicadas, complexas e difíceis de entender, como nós, homens, tanto nos queixamos diariamente. Mas o que é o universo, senão algo complexo, complicado e difícil de entender, mas lindo e infinito, com inúmeras descobertas maravilhosas a serem feitas? E o que são as mulheres, senão universos singulares com suas próprias belezas e peculiaridades, infinitas em si mesmas?
Admirável pela inteligência, pela capacidade de discernimento, por conseguir enxergar além do básico e adentrar no que é complexo com uma facilidade espantosa, encontrando soluções simples para problemas que aos nossos olhos masculinos são praticamente irresolúveis, ela é dona de um sexto sentido que faz com que veja e sinta muito além do que conseguimos com nossa capacidade limitada.
Não, a mulher não foi criada para ser entendida, mas sim admirada, respeitada e amada, e como, pergunto, como não amar alguém em quem habitamos por meses em nossas vidas, e que se torna nosso abrigo, nossa guarida, nosso porto seguro pelo restante de nossos dias?
As mulheres foram nosso primeiro lar, e é em seu colo que encontramos conforto e aconchego sempre que precisamos, não importa a idade, e é, no mínimo, lastimável que ainda não sejam respeitadas como deveriam ser, que ainda sejam massacradas, como jamais deveriam ser, e que não encontrem uma igualdade à qual possuem um direito tão inerente que sequer deveria ser debatido.
Um dia para as mulheres? Essa ideia é tão absurda quanto dizer que elas são simples a ponto de serem definidas apenas como “frágeis”, porque para um ser tão rico como a mulher o próprio calendário torna-se insuficiente para propor uma merecida homenagem a quem tanto faz, a quem tanto pode.
Mas já que ele existe, que façamos jus a ele, estendendo-o por todos os outros 364 dias do ano, para amá-las, respeitá-las, e caminhar lado a lado com elas, construindo um mundo melhor, um mundo tão rico, tão belo e tão grandioso como são as mulheres.
Feliz dia da Mulher.
Simplicidade
Você já olhou para as estrelas hoje? Já reparou o quão brilhantes elas estão, desfilando sua beleza na imensidão do universo? Já parou nesse dia para fitar o mar, o seu verde brilhante e resplandecente, sentir no rosto a suave e acalentadora brisa, e experimentar o inconfundível cheiro e frescor do sopro do oceano? Ou mesmo vivenciar o leve toque da areia da praia nas solas dos seus pés cansados?
Já sentou e ouviu o farfalhar das folhas das árvores levemente balançadas pelo vento que corre em uma manhã ensolarada, como uma melodia gravada no fundo da memória, que ressurge para nos lembrar de uma passagem agradável e nostálgica de nossas vidas? Ou simplesmente foi pego se encantando com o som e a beleza do sorriso puro e inocente de um bebê, lembrando que no mundo ainda existe vida que não foi tocada pela impureza a qual nos auto infligimos?
Não fez isso? Então experimente. Esqueça um pouco o prazo para cumprir, os compromissos que a vida lhe impõe e as dores de cabeça causadas pela correria que o cotidiano exige de nós. Talvez esse seja o remédio exato para os males dos quais você esteja sofrendo.
A beleza e o poder contidos na simplicidade muitas vezes nos ficam ocultos por causa da venda que nós mesmos colocamos em nossos olhos, que não impedem que enxerguemos as coisas, mas que acabam turvando os elementos mais importantes do quadro que vemos em determinado momento.
As pessoas têm mania de potencializar os problemas, bem como as soluções para eles, quando muitas vezes só basta uma gota do remédio a ser ministrado para curar aquela dor que se está sentindo, sem que seja necessário fazer uso de uma cirurgia complexa e delicada.
Estou cansado da vida? Uma viagem para o exterior resolve. Crise no casamento? Presentes caros e uma nova lua de mel em um hotel de luxo naquela localidade paradisíaca podem solucionar o problema. Não suporto mais a carga que o trabalho me impõe? Que tal comprar aquele carro ou aquela tv nova para suprir o vazio que há nos meus dias?
Muitas pessoas acreditam em soluções complexas para grandes problemas, quando a verdade é que a simplicidade pode ter o condão de resolve-los de uma forma rápida e eficiente. Não que uma boa viagem, um presente caro ou a aquisição de um bem há muito desejado sejam ruins, pelo contrário, são ótimos, mas colocar em cima desses desejos a única solução para nossos problemas pode acabar dificultando a resolução dos mesmos, ou o que é pior, pode terminar trazendo uma enorme frustração quando vemos que eles não foram resolvidos no fim das contas.
Com o passar dos anos a vida se tornou complexa, corrida, exigindo cada vez mais de nós e fazendo com que começássemos a pensar que tudo, inclusive as soluções para os nossos problemas tivessem de apresentar o mesmo tamanho colossal que eles. Mas é nas coisas simples que reside a essência das coisas mais grandiosas, como o toque do primeiro raio de sol no início da manhã, um despretensioso banho de chuva em uma tarde fria no jardim de casa, ou o simples olhar de um bebê que nos fita pela primeira vez como se nos conhecesse desde sempre.
A vida é simples, nos é que a tornamos complexa, e ela é simples justamente por ser grandiosa, então, olhe mais para as estrelas, para o mar, para o campo, para a simplicitude, pois é ali que você poderá enxergar coisas tão gigantescas que sequer poderão ser mensuradas.
Porque é nos momentos de dificuldade que o simplificar seja a solução.
Carnavalizar
Abra o armário, não apenas o do seu quarto, mas também o da sua mente, o do seu coração, e de lá tire aquela velha e empoeirada fantasia para vestir-se das cores da alegria que surgem quando ouvimos os primeiros e inconfundíveis acordes das antigas mas nunca defasadas marchinhas de carnaval.
Porque carnaval é isso, é colorir, é tocar, é sorrir e cantar como se criança fosse, porque é em nossa fase pueril que criamos as melhores fantasias, e quando as resgatamos de nosso velho guarda-roupa de conveniências e responsabilidades, crianças nos tornamos novamente.
Não o carnaval dos vícios, ou da troca banal e desenfreada de parceiros, que em nada acrescenta e não possui significado algum. Mas sim o carnaval da brincadeira, do riso, dos cantos, dos pulos, da alegria espalhada e colorida, diversificada e musical, rica em tons e gargalhadas, em troças e em fantasias multifacetadas, em confetes, serpentinas e espumas lançadas em um ar repleto de marchinhas, frevos, maracatus e sambas, novos e velhos, mas nunca ultrapassados, assim como os foliões que ali brincam com a inocência de uma criança.
No carnaval podemos ser os heróis que admiramos, os piratas das aventuras que nos contagiam, os índios de nossa rica história e de nossa valiosa cultura. Podemos criticar o político corrupto sem deixar de lado a diversão. Podemos conscientizar ao mesmo tempo em que brincamos, podemos nos vestir de outros, mesclando os tons de realidade com as cores da ficção criada em nossas mentes, e assim nos misturarmos, como uma grande corte de reis e rainhas, príncipes e princesas, cavaleiros e bobos e um reino de folia onde o castelo é o bloco e o reino é a diversão.
Abra o armário, do peito, da mente, da ilusão e da imaginação, e de lá tire sua fantasia empoeirada, brincando em harmonia nessa festa colorida, nessa folia mascarada, e assim como uma criança, ausente de qualquer maldade, mas movida apenas por um sentimento de pura diversão, brinque, imagine, fantasie, abra alas ou como diria o povo, maior dono dessa festa multifacetada, carnavalize-se.
Sempre com responsabilidade.
Amizade
Amizade, uma palavra forte demais para ser usada na definição de relações passageiras. Ao contrário das coisas efêmeras, a amizade real, concreta e sincera é feita para durar, para perseverar, para permanecer, não importa quantos anos passem, não importa o quão escassos se tornem os encontros e reencontros, quando ela possui o alicerce da verdade, ela fica, mesmo quando as pessoas se vão.
Mas tais amizades se tornam ainda mais especiais quando são construídas na idade mais tenra e sincera que vivemos na longa caminhada da vida, a infância. As relações construídas nessa época áurea de nossa breve existência são especiais porque são iniciadas sem interesses, sem segundas intenções, mas tão somente na sinceridade que apenas as crianças conseguem ter.
São aquelas amizades iniciadas com apenas um “oi”, ou um descompromissado “quer brincar?”, e que se solidificam e perduram pelos anos vindouros, renovando-se nas novas crianças, vindas na figura de filhos daquela antigas crianças que em um dia de um passado distante criaram um laço que duraria dali em diante.
E como saber disso, senão vivendo o próprio exemplo que cito nesse breve texto? Quem teve a sorte de construir tais relações e mantê-las com o passar dos anos saberá o quão especial é reunir-se para relembrar uma época que deixou tanta saudade. Para repaginar as brigas diárias por conta de bobagens, que acabavam em um tratado de paz sincera, deixando para trás um conflito que ambas as partes sequer sabiam dizer porque tinha começado.
Ou mesmo para recontar as inúmeras travessuras aprontadas em uma época tão inocente que acabava por tornar-nos inconsequentes, vivendo aventuras que hoje nos arrepiam só de nos lembrarmos delas. Jogos diários de pés descalços em terra batida, deixando para trás pedaços da pele dos dedões que eram arrancadas quando chutávamos tudo à nossa frente, sem a preocupação de eventualmente topar com um pedaço de pedra, o que quase sempre acontecia.
Passeios de bicicleta no meio do mato, onde descíamos ladeiras vertiginosas a uma velocidade indizível, com a falsa certeza de que nossas pelas eram de aço e nossos ossos de borracha, sem medo dos efeitos de uma queda séria e violenta, que eventualmente acontecia, fazendo com que voltássemos para nossas casas com joelhos ralados e queixos ensanguentados, mas com sorrisos de satisfação em nossos rostos.
Bombas jogadas aos quatro cantos nos festejos juninos, onde pulávamos fogueiras enormes e brincávamos de cientistas, fazendo mecanismos arriscados com a pólvora retirada dos artefatos, lembranças que que trazem verdadeiros arrepios só de imaginar o risco corrida naquela época... mas a emoção era enorme, sem precedentes.
Memórias resgatadas da fase seguinte, dos primeiros beijos com a namoradinha do colégio ou da rua. Das primeiras festas, dos assustados nas casas de amigos, em que nos vestíamos como se estivéssemos indo para um baile, com metade de vidros de perfume derramados em nossos pescoções para impressionar as garotas que encontraríamos.
O primeiro fora, a primeira bebedeira, os inúmeros shows, idas ao estádio para ver os times do coração e passar o dia seguinte relando com o torcedor da equipe adversária que tinha perdido no dia anterior. A festa pela aprovação no vestibular, pela conquista da carteira de motorista, pela conclusão do curso com a turma inteira entornando garrafas e mais garrafas até cada um se tornar novamente o menino que foi um dia.
O casamento, os filhos, as responsabilidades da vida adulta, os desabafos por uma crise aqui e outra ali, em reencontros cada vez mais intervalados, mas que justamente por isso parecem se tornar ainda mais especiais. Eis a magia de uma amizade que sobrevive às andanças do tempo, construída em um dia longínquo de uma passado remoto, com a simplicidade que só pode ser enxergada na inocência de uma criança.
Nesse momento, me recordo de uma fala retirada de um filme que se tornou um clássico da sessão da tarde, aquela mesma, em que assistíamos aventuras com baldes de pipoca e copos de guaraná, cujo nome é “Conta Comigo” (Stand by me), baseado no conto “O Corpo” (The Body), da autoria de um de meus escritores favoritos, Stephen King.
O filme narra a aventura de quatro amigos, rapazes de apenas doze anos que se aventuram na busca do corpo de um garoto desaparecido no meio da floresta. A história é contada por Gordie Lachance, um escritor famoso, que era um dos quatro amigos envolvidos na aventura. Em uma das últimas cenas do filme, parado diante do computador com o olhar perdido no passado, e após ser chamado pelo filho e por um amiguinho dele para saírem, Gordie escreve as últimas palavras da história contada como uma lembrança:
“Eu nunca mais tive amigos como os que eu tive quando tinha doze anos. Meu Deus, e alguém tem?”
Não Gordie, não tem. Mas podemos manter os que conquistamos naquela época, para relembrar as histórias emocionantes de todas as fases vividas. Mesmo que os encontros se tornem intervalados e as reuniões cada vez mais raras. Porque a amizade real é assim. Embora os anos passem, ainda nos vemos como aqueles garotos que se conheceram em um dia de um passado longínquo, e em algum momento diremos em nossas narrativas cheias de emoção:
“Puxa, parece que foi ontem.”
A grande tela
As luzes se apagam, a escuridão reina momentaneamente por um período de expectativa que parece durar uma eternidade, enquanto o silêncio grita, ensurdecedor nos ouvidos de uma multidão cujo o olhar torna-se cativo de um único ponto naquela sala apertada e abarrotada de corações palpitantes e olhos atentos.
Então um estrondo invade os ouvidos de todos, ao mesmo tempo em que um clarão adentra por olhos que sequer chegam a piscar, tamanha é a expectativa pelo início do espetáculo, e eis que o que era espera torna-se realidade, e o grupo de ansiosos espectadores adentram em uma viagem cheia de magia e fantasia, que durará apenas algumas horas, mas que ficará marcada pelo resto da vida nas mentes de cada um dos que dela participam.
Alguém aí já sentiu isso? Sabem de que local estou falando? Sim, falo daquele lugar onde sonhos se tornam realidade em uma enorme tela que se apõe diante de olhos atentos e brilhantes. Daquele lugar onde impera o cheiro de pipoca e o barulho de saquinhos de doce e papéis de chocolate sendo abertos, daquele local onde por um breve momento antes do início da aventura, a única luz que pode ser vista é o pequeno anúncio em letras garrafais e vermelhas aposto em um canto da sala, dizendo “Não Fume”. O cinema.
Terra da fantasia, onde visitamos mundos imaginários e viajamos junto com heróis, heroínas e outros personagens cativantes pelo preço de um ticket. Espaço de sonhos, em que nos unimos brevemente a mocinhos e bandidos que duelam em conflitos maniqueístas, ou em relações mais complexas, onde não sabemos onde o mal começa, e o bem termina, ou vice versa. Cantinho guardado para troca de beijos entre casais que muitas vezes dão uma pausa na aventura assistida para viverem sua própria aventura de amor e descoberta.
Não importa o tamanho, a localização, as condições da sala, das poltronas ou se o filme é 2D ou 3D, o cinema tem o condão de nos levar por uma terra de magia, onde rimos, choramos, gritamos, nos assustamos ou saímos apaixonados. Crianças, adultos, idosos, não importa a idade, não importa o tempo passado ou as rugas acumuladas, as possibilidade de emoção são sempre as mesmas.
Em pouco mais de cem anos de existência, a sétima arte tem encantado e criado épicos que nos acompanham a chegam a nos influenciar pelo resto de nossas vidas. Quem nunca se emocionou com Scarllet O’Hara e sua promessa de que nunca mais passaria fome em “E o vento levou”? Quem nunca sorriu ou mesmo chegou a derramar uma lágrima com a sensibilidade de Chaplin, com a qual cuidadosamente construía cada um de seus personagens?
Quem nunca passou dias ou meses sem entrar no mar depois de assistir ao assustador “Tubarão”, de Steven Spielberg, ou mesmo se emocionou com aquele simpático ser vindo do espaço, criado pelo mesmo Spielberg em “ET”? Alguém por acaso não deixou ser envolvido pela áurea de mistério a cada aventura de Indiana Jones em suas buscas por artefatos há muito perdidos no passado?
E qual não deve ter sido o som do fôlego preso momentaneamente e solto com um pesado ar de incredulidade quando Darth Vader revelou a Luke Skywalker que era seu pai, em “O Império Contra-Ataca”?
Aventuram romance, terror, ficção, história. Épicos, comédias, informação. Tudo isso cabe em poucas horas de revelação, em uma sala escura, na frente de uma tela colossal, podendo revelar em nosso íntimo a mais variada gama de sentimentos que nós sequer sabíamos sermos capazes de sentir, e tudo isso graças a uma invenção criada em 1895 por Auguste e Louis Lumière, os irmãos Lumière, que viria para revolucionar a forma como as histórias seriam contadas.
Carros que viravam máquinas do tempo, foguetes espaciais, ninjas, samurais, heróis, vilões, mocinhos, bandidos, dinossauros, aventuras em uma galáxia muito, muito distante, ets, tubarões, cães, gatos, leões que se tornaram reis, horas do pesadelo, halloweens assustadores, seres que matavam de medo, comédias que matavam de rir, histórias que nos faziam pensar e cogitar sobre nossas vidas e nossos valores, eis a magia da sétima arte, eis a magia da fantasia que se torna realidade, acabando com aquela breve mas quase eterna expectativa que se põe entre o limiar do apagar das luzes, até a explosão de som e brilho que faz com que nossos corações batam mais forte, e nossa atenção seja aprisionada até o momento em que a célebre frase aparece diante de nossos olhos...
“The End”.
Mas como a moda recente são os epílogos, as cenas pós créditos, faço uso do mesmo expediente para perguntar, já riu, chorou, se assustou ou se emocionou hoje? Não? Então compre seu ticket, seu balde de pipoca e escolha sua poltrona em um cinema perto de você, porque a fantasia não para, e a fantasia meus amigos, é o alimento dos nossos sonhos.
O relógio não para
Sentado na sala silenciosa eu escuto o som compassado e solitário do tique taque do relógio, marcando o tempo que não descansa por um segundo sequer em sua caminhada infinita, e me pergunto se eu tenho aproveitado da forma correta a passagem desse incansável senhor, que em seu trajeto deixa para trás as horas, os dias, os anos, as vidas.
E você, quantas vezes se perguntou sobre a forma que tem aproveitado a companhia deste jovem e ao mesmo tempo velho companheiro? Já parou e pensou em como os dias e os anos têm passado com uma rapidez assustadora, fazendo com que uma vida passe praticamente em um piscar de olhos? Ou já fez sua reclamação diária de que não há tempo para nada, e que quando viu o dia já passou sem que conseguisse cumprir sequer metade do que tinha planejado?
Vez por outra escuto expressões saídas das bocas de pessoas das mais variadas idades, frases como “não tenho tempo”, ou “não deu tempo”, ou mesmo “aproveite, porque o tempo passa rápido demais” são quase que uma constante em nosso cotidiano, e nesse contexto, vez por outra eu me faço a pergunta que fiz acima. De que forma tenho aproveitado o tempo que me foi dado?
Desde o dia em que abrimos os olhos pela primeira vez nesse mundo nossa vida dá início a uma contagem regressiva rumo ao momento em que os fecharemos pela última vez, e o tique taque do relógio não tem e nem nos dá descanso algum, porque em um piscar de olhos o amanhã se torna ontem, e a areia de nossa ampulheta se torna um pouco mais escassa. E assim me volta o questionamento, de que forma tenho aproveitado o tempo que me foi dado?
Mas será que não estou fazendo perguntas demais, e vivendo de menos?
Como diria o poeta, o tempo não para, e assim como ele, não podemos ficar parados. O agora, o nesse instante, o momento atual não pode ficar estagnado, e tem de ser vivido como o que de fato é, o presente. Devemos viver o presente para que possamos ter um passado na busca pelo futuro que virá, e nesse trajeto, havendo ou não uma distorção na percepção de como vemos o tempo passar, a verdade é que temos de aproveita-lo da melhor maneira possível.
Não, de fato não temos o tempo, porque só a DEUS ele pertence, e por isso, assim como não podemos conter o vento que viaja pelos quatro cantos, também não podemos conter esse viajante incansável, nos cabendo apenas aproveitar da melhor maneira a jornada até o dia em que chegaremos ao destino final, e na rapidez com que fazemos esse trajeto não há oportunidades para questionamentos ou reclamações, sob pena de deixarmos escapar momentos passíveis de ficarem marcados na eternidade de nossas lembranças.
Nesse contexto pergunto, o que seria melhor, tentar capturar o vento, ou senti-lo acariciando nossas faces e nossos cabelos, e refrescando nossas vidas? A mesma pergunta vale para o tempo. Não há como captura-lo. Não há como pôr nele um laço e prende-lo, tornando-o mais lento ou mesmo o fazendo parar seu trajeto.
O melhor então é senti-lo em nossas faces, em nossos corpos, em nossas vidas, e aproveitar cada momento que nos é proporcionado, sem tantas perguntas, sem tantos questionamentos, porque cada momento é um privilégio, cada instante uma riqueza, e cada segundo uma chance de marcar nossas lembranças nesse enorme e precioso livro que narra a existência de tudo.
Sentado na sala silenciosa eu escuto o som compassado e solitário do tique taque do relógio, e ele não para. É nesse momento que vejo que ao invés de perguntar ao tempo quando ele vai parar, ou de reclamar com ele sobre a rapidez com que passa, o melhor seria segurar sua mão, para junto dele correr como o vento nessa jornada que a cada dia fica mais curta, e assim fazer exatamente o que fomos destinados a fazer quando pisamos nesse mundo. Viver.
E você, vai questionar ou vai viver? O relógio não para, não há tempo a perder.
O meu é maior que o seu
Quem cresceu na minha época ou ouviu ou disse muito essa expressão. “O meu é maior que o seu” podia ser utilizado em diversas áreas e amplos aspectos. Desde a medição do patrimônio da família de cada um, passando pelo talento em determinado jogo e chegando até mesmo onde você provavelmente chegou assim que leu o título acima, o tamanho do nosso colega lá de baixo.
Mas ultimamente “o meu é maior que o seu” tem sido utilizado por pessoas de todas as idades, e de uma forma velada, sem que se repita, ipsis literis, esse que já se tornou um célebre dito popular, o que tem sido, diga-se de passagem, algo muito mais chato do que uma discussão inconsequente entre crianças e adolescentes imaturos.
Em anos recentes temos visto uma verdadeira polarização nos posicionamentos que abrangem as mais diversas áreas em nossa sociedade, o que longe de ser maléfico, é algo que denota a existência de um regime democrático, afinal, quando se vê algo polarizado conclui-se de imediato que existem não apenas dois, mas diversos outros lados, visto que também devem ser considerados os que se posicionam mais ao centro de toda essa mescla diversificada.
O problema é quando a intolerância, sim, a intolerância, aquele bichinho guloso e egocêntrico, que acha que só ele é quem tem razão, invade essa discussão. Aí, meus caros, é muito mais construtivo dialogar com uma criança de sete anos. Garanto que a conversa será bem mais produtiva, uma vez que nesse caso muito provavelmente haverá uma exposição de ideias, e não uma imposição de ponto de vista.
Sim, eis o cerne de todo o imbróglio, eis o motivo da discórdia, ou como dizem na minha terra, eis a razão que deu início ao moído. O nó cego da história acontece quando alguém deixa de querer expor um ponto de vista, para impor um ponto de vista.
As pessoas hoje em dia já entram em uma discussão armadas até os dentes com o único fito de mostrar a qualquer custo que estão certas e pronto, como um menino mimado que bate o pé e não quer ouvir mais nada além do que lhe convém, e isso ganhou contornos mais amplos com o advento das redes sociais, visto que com elas todo mundo quer mostrar o que pensa. Mas como seria bom se o intuito fosse apenas esse “mostrar o que pensa”. No entanto, como diária o sábio, “o buraco é mais embaixo”, e se não tomarmos cuidado podemos cair direitinho dentro dele, e isso acontece a partir do momento em que o nosso intuito passa a ser inculcar na cabeça do outro o pensamento que permeia a nossa.
Não estou criticando o debate, longe disso. A discussão é saudável e necessária, e podemos sim tentar convencer o outro a adotar nosso ponto de vista, assim como o outro tem o direito de fazer o mesmo conosco. O problema é quando a pessoa já entra na discussão fechada a ouvir ou aceitar qualquer outro pensamento, e querendo a todo custo que o interlocutor entre no grupo do qual ela faz parte. É nesse ponto que “o meu é maior que o seu” vira um verdadeiro pé no saco, com o perdão da expressão.
Então, meus caros, vamos ter mais calma, mais parcimônia, mais paciência na hora de entrar em um debate, seja em qual campo for. Política, religião, música, cinema, praia, campo, morango, chocolate, iphone, android, etc. O importante é o papo, a conversa e os ensinamentos que podemos colher dela, porque todo diálogo, por mais simplório que seja, tem algo a ser assimilado.
Portanto, menos chatice e mais tolerância, afinal, dialogar é bem melhor do que brigar, já que todos saem ganhando.
Máscara de amor
O amor é egoísta? Eis uma pergunta que me surgiu desde que li uma frase em um livro, que dizia mais ou menos que o egoísmo se fantasia de amor. Mas será mesmo que isso acontece, ou tais sentimentos realmente se confundem, e o amor de fato tem um pouco de egoísmo em sua essência?
A história nos traz muitas definições sobre esse sentimento tão complexo que é o amor, sendo esta tarefa um dos principais expedientes que os poetas têm utilizado em seu ofício ao longo do tempo, e uma dessas descrições afirma que o amor, o amor de verdade, não é egoísta.
Segundo os defensores dessa afirmação, o amor em sua real essência, quando de fato se mostra puro, em nada sustenta qualquer forma de egoísmo, tendo em vista que aquele que realmente ama quer o melhor para a pessoa amada, chegando muitas vezes a abrir mão de seu bem estar para que o outro saia beneficiado, o que mostraria um sentimento, na verdade, repleto de altruísmo.
Mas não seria isso uma forma de egoísmo? Tendo em vista que aquele que ama, ao ver a pessoa amada se satisfazendo, satisfaria desta forma a si mesmo, alcançando a felicidade por constatar que o destinatário de seu amor estaria também feliz? Contraditório, não é? Mas trata-se apenas de uma forma de complicar o pensamento. Uma, digamos, provocação.
Na verdade, este que vos escreve essas confusas linhas de fato acredita que o amor em sua essência mais pura é de fato o mais altruísta dos sentimentos. Ocorre que, levando em conta a frase que li e que serviu de cerne para essa discussão, o egoísmo pode fazer uso dessa confusão para fantasiar-se de amor, e é nesse ponto que os problemas começam.
Muitas pessoas confundem um apego às vezes doentio com o amor, e acabam abrindo mão das coisas que possuem no afã de manter o destinatário de sua obsessão ao seu lado, o que demonstra na verdade o egoísmo em sua face mais crua, já que ela abre mão de coisas que tem em menor conta para manter no final aquilo que para ela é mais importante, a presença da pessoa amada.
Neste ponto o egoísta vira prisioneiro deste sentimento, e acaba tentando também aprisionar a pessoa que afirma amar. Mas não é o amor uma forma de deixar livre? De dar asas a quem se ama e desejar para ela sempre o melhor, mesmo que esse melhor seja distanciar-se e até mesmo não mais voltar? Sim, essa é a verdadeira definição deste sentimento.
O problema é que a linha entre estes sentimentos é tão tênue que o indivíduo acaba caminhando em um terreno achando que está no outro e, acreditando amar de verdade, termina por aprisionar a pessoa de quem diz gostar, o que é uma das formas mais egoístas de agir.
Ou seja, muitas vezes o próprio egoísta é algoz e vítima nesses casos, acreditando que faz o que faz por amor, quando na verdade trata-se exatamente do contrário. Então como identificar um e outro? Como ver por detrás da máscara do amor a verdadeira face do egoísmo?
Na opinião de quem já amou, e de quem também já foi egoísta acreditando que estava amando, a pergunta que deve ser feita é, “você abriria mão de sua felicidade para que a outra pessoa seja feliz”?
Caso a resposta seja positiva, então provavelmente você estará amando de verdade, porque pensar no bem do outro sem atender a um desejo egoísta que venha a satisfazer os próprios anseios é, segundo os poetas, a forma mais pura de amor.
Mas e quanto ao questionamento feito no início do texto, o de que o altruísmo de abrir mão da própria felicidade em prol de quem se ama seria uma forma de satisfazer a si mesmo, e consequentemente, uma espécie de egoísmo? Bem, isso é por demais filosófico, e neste ponto prefiro ficar com os poetas, quando dizem que o amor não é razão, mas sim emoção.
Afinal, o coração bate sem que o cérebro precise mandar, não é verdade?
O Homem, a máquina
“O ser humano é uma máquina perfeita”. Aposto que muitos já ouviram essa expressão em algum lugar e em diversos contextos, para referir-se ao homem como uma criação insuperável, que jamais poderá ser substituído por qualquer dispositivo, por mais elaborado e moderno que ele seja.
Mas já pararam para pensar que o humano pode de fato estar se tornando uma máquina? Não a que se refere ao ditado citado acima, mas à própria máquina definida no sentido mais literal da palavra. Longe de ser absurda, essa pergunta tem ganhado contornos de relevância diante do comportamento que as pessoas têm apresentado com a evolução tecnológica.
Para tanto, sugiro um experimento. Da próxima vez que chegarem a um bar ou restaurante, observem o comportamento de quem está ao seu redor. É quase certo que irão se deparar com pessoas atentas e concentradas em uma tela de celular, atraídas por mensagens, conversas virtuais, fotos, vídeos e os bons, velhos e criativos memes.
Mas o problema não é deixar-se contagiar pela criatividade que as pessoas apresentam na internet. O problema é quando ficamos atentos demais ao aparelho quando ao nosso redor temos uma infinidade de assuntos que poderemos abordar com vários exemplares desta que é definida como a máquina perfeita... o ser humano.
Pessoas deixam de conversar com pessoas para prestarem atenção a conteúdos virtuais preparados por... pessoas. Contraditório, não? Mas essa é a realidade. A tecnologia que deveria unir, acaba apartando, segregando, afastando os que estão perto e aproximando os que estão distantes. Mas mesmo que os que estão longe possam ter a oportunidade de aproximar-se com o avanço tecnológico, ainda assim não lhes é possível fazer o que pessoalmente poderia ser feito. Dar um beijo, um abraço sincero, ou mesmo um olhar carregado de significados. Isso a modernidade ainda não nos possibilitou.
Mas possibilitou que os que estão perto uns dos outros deixem de adotarem estes mesmos gestos de aproximação e contato, e em detrimento disso, que é tão valioso, as pessoas preferem voltar-se a telas frias que as distanciam umas das outras. Neste ponto, pode-se concluir que o humano está se tornando uma máquina, mas uma máquina semelhante à que foi criada pelos próprios homens.
O afastamento, a indiferença, a distância e a frieza com as quais as pessoas tem tratado umas às outras fazem com que seja quase impossível distinguir alguém de carne e osso de dispositivos feitos de plástico, cobre e outros materiais. Nesse contexto, o humano, que é definido como a máquina perfeita, tem se transformando em uma máquina cheia de imperfeições.
Esse fato traz à tona um antigo filme (que em respeito aos fãs, como este que vos fala, deveria ter dispensado as inúmeras continuações que vieram com o passar dos anos), e essa película é o já célebre "O Exterminador do Futuro”. Pois bem, o enredo do filme original, bem como de sua sequência (e a coisa deveria ter acabado por aí), trata de uma rebelião promovida por uma inteligência artificial criada para a defesa das pessoas, cujo nome era Skynet.
A Skynet acaba constatando, com sua frieza de raciocínio, que a maior ameaça existente é o próprio ser humano, e assim volta-se contras as pessoas que deveria proteger. O resultado não poderia ser outro... extermínio. Mas o que vemos na atualidade é o caminho inverso. A despeito do avanço da inteligência artificial, não estamos vendo as máquinas se rebelando, mas o próprio humano rebelando-se contra sua humanidade.
É como se a raça humana estivesse entrando em um processo inconsciente de auto destruição, onde não são necessárias armas de destruição em massa ou robôs modernos voltando no tempo para atacar aa pessoas, mas meramente um abandono gradual que tem sido promovido pelo próprio homem. O abandono de sua humanidade.
A partir do momento em que deixamos de sermos sensíveis ao toque, ao contato, ao olho no olho, à conversa cara a cara, ao beijo, ao abraço ou simplesmente ao sorriso dado a quem está próximo, passamos a entrar em um processo de desumanização que nos tolhe de nossa sensibilidade e acaba fazendo com que nos tornemos tão frios e distantes quanto o nosso bom e velho Schwarzenegger dizendo de forma intimidadora, “I’ll be back!”, no papel do icônico ciborgue que vem do futuro.
E a solução para isso é abandonar a tecnologia que tanto tem nos servido? Claro que não. O que devemos fazer é usar tais avanços exatamente para o que foram criados. Para nos servir, aproximar os distantes e facilitar nosso dia a dia, e isso a máquina pode fazer. Mas quem acaba complicado a coisa toda é justamente a máquina perfeita, que é tão imperfeita em suas ações... o ser humano.
Então, da próxima vez que estiver em uma mesa cheia de amigos e quiser dar aquela olhada marota no celular para ver quem curtiu aquela foto, ou quem comentou sua postagem, ou pura e simplesmente para checar as tretas no grupo do aplicativo de conversas, olhe ao redor e veja que ali tem coisa muito mais interessante para ser vista, vivida e conversada.
E quando chegar esse momento olhe para o celular, o computador ou qualquer que seja o dispositivo que esteja prendendo sua atenção e diga “Hasta la vista, baby”. Pode até não soar tão épico quanto o bom e velho Schwarza, mas garanto que valerá à pena.
Vaidade
Verão em alta, e com ele chega a vontade de tomar aquele sol na beira do mar, com os pés enfiados na areia, relaxando do trabalho extenuante realizado durante o ano (ao menos para aqueles que têm a sorte de tirarem férias nessa época). No entanto, muitas pessoas não curtem esse descanso, esse relaxamento ou a sensação de tranquilidade que tal repouso pode oferecer.
E não fazem isso porque estão preocupadas demais em adquirirem corpos perfeitos, deslumbrantes e que reflitam o padrão de beleza escolhido pela sociedade. No fim das contas, nada de sol estendido na areia, ou do bom e velho banho de mar, mas no lugar disso, selfies e mais selfies na praia, seguidas de dedos ávidos e olhos atentos nas curtidas que recaem sobre as fotos publicadas nas redes sociais.
Mas esse padrão não é exclusividade do verão. Ele se repete o ano todo, durante as quatros estações, e ganha contornos cada vez mais profundos conforme a exploração da própria imagem nas redes sociais cresce de forma exponencial. O resultado? Pessoas que vivem plugadas, ora admirando a própria imagem, ora checando quem está a admira-la naquele momento.
Pode-se dizer que são Narcisos com um novo traço de obsessão, preocupados não apenas em admirarem apaixonados o próprio reflexo, como o personagem mitológico fazia, mas também com a avaliação da sociedade sobre aquela imagem. Cuidado para não se afogarem no próprio ego, como ocorreu com o rapaz que era apaixonado por ele mesmo.
É claro que a vaidade, um dos componentes daquela turminha problemática conhecida como “os sete pecados capitais”, não se restringe à parte física, havendo quem se envaideça da própria inteligência, do conhecimento e de outras características, mas é certo que a auto imagem vem sendo a forma de expressão mais vista deste tão famoso pecado capital.
Não basta se achar bonito, o ego só ficará satisfeito se todos os outros se curvarem diante da majestade daquele corpo esculpido e daquela face impecável, tornando a pessoa escrava da aparência que tanto batalhou para conseguir.
Nada contra a busca por uma estética mais apurada, mas o problema é quando essa busca se torna doentia, e a pessoa que participa dessa jornada se transforma em alguém alienado pela própria beleza, deixando de enxergar o potencial que possui por dentro da casca que a cobre, ou seja, perde tempo admirando a capa quando há uma história fantástica a ser lida caso resolva folhear o livro.
Nessas andanças tive a oportunidade de conhecer pessoas que chamavam a atenção por onde passavam, tamanha era sua beleza, mas que possuíam qualidades que iam muito além da estética e que só eram vistas por quem fazia parte de seus círculos de intimidade.
No entanto, essas pessoas estavam preocupadas demais olhando para a própria imagem e para o julgamento que a sociedade fazia de seu retrato, e deixavam de ver sua faceta mais bela, que apenas aqueles mais próximos enxergavam, e com isso acabavam alienadas pela beleza externa, quando havia tanto a mostrar de quem eram por dentro.
O resultado? Tornaram-se pessoas fúteis, presas à necessidade de serem admiradas, viciadas nos elogios de quem muitas vezes sequer conheciam. Mais gente para conta sapeca dessa tal de vaidade.
De outro lado, conheci também pessoas que causavam uma epidemia de torcicolo por onde passavam, tamanha era sua beleza, mas que em nada se importavam com aquilo, e pautavam suas vidas por coisas mais importantes do que passarem o dia se admirando no espelho ou checando na internet quantos outros tinham olhado ou dito o quão belas elas eram.
Pois é, essas são as pessoas que não apenas chamam sua atenção, mas que também a prendem, porque te mostram o que está escrito naquele livro com a capa bonita, e acabam te entretendo com as histórias maravilhosas que ali são contadas.
Que tal ser esse tipo de pessoa? Afinal, dá muito bem para ser bonito por fora e lindo por dentro. Além disso, é muito chato passar o dia se olhando no espelho, quando tem tanta coisa boa para ser vista por aí.
Sai dessa Narciso, e vai curtir a vida, porque ela sim, é bela pra caramba.
Um Novo Capítulo
O que você fez esse ano? O que deixou para trás? Que histórias escreveu nesse capítulo que preenche o livro da sua vida? Quantas lágrimas derramou e quantos sorrisos distribuiu no caminho trilhado nesses trezentos e sessenta e cinco dias? São perguntas que muitas pessoas não fazem, mas que deveriam fazer, justamente para que os desejos que revelam para o ano vindouro possam ficar mais próximos de serem alcançados.
Grande parte das pessoas finda o ano tentando esquecer os percalços com os quais se depararam, limitando-se a deixar aquilo no passado e desejar um ano melhor para o futuro. Mas desejar não basta, e deixar os obstáculos enterrados no passado, em um local para serem esquecidos fará com que o aprendizado que trouxeram seja igualmente relegado a um lugar sem importância no fundo do armário de nossa vida.
A consequência? Os erros provavelmente serão repetidos, e os desejos que fizemos não passarão disso, apenas pedidos perdidos no tempo, porque não tivemos o empenho exigido ou o conhecimento necessário para que colocássemos em prática as ações que poderiam torna-los realidade.
Deixar de aprender com nossos equívocos ou mesmo com nossas omissões fará com que repitamos o mesmo comportamento tentando alcançar os objetivos que almejamos. Albert Einstein, em toda sua sabedoria, definia a loucura como a repetição dos mesmos comportamentos buscando alcançar resultados diferentes, mas a repetição da história mostra apenas que sempre chegaremos ao mesmo fim.
Construir uma casa sem alicerce no mesmo lugar resultará em sua ruína, mesmo que o construtor repita o projeto cem, mil, um milhão de vezes. Repetir os mesmos comportamentos que levaram aos erros anteriores culminará em sua reedição, dia após dia, ano após ano, e nossos desejos nunca sairão do ponto de partida, que é a vontade de que aconteçam.
E como mudar? Mudando, ora bolas. Saindo da zona de conforto que nos paralisa. Deixando a mesmice que nos atrasa. Abandonando a rotina de apenas desejar, e de nada fazer. Abra seu livro, revisite o capítulo que escreveu, e veja as falhas que compuseram o enredo que você criou. Mas visite também as partes dignas de serem lidas, os pontos onde a leitura cativou e emocionou, porque elas ajudarão a seguir com sua história, fazendo-a cada vez mais interessante do que já era.
Trace metas, busque objetivos, marque os erros e aprenda com eles, mas também visualize os acertos e veja, com um sorriso no rosto, as coisas que conquistou. Então vire o ano agradecendo e pedindo, mas também planejando, porque os projetos não saem do papel se os deixarmos lá, por mais belos que eles sejam.
Porque os desejos só se tornarão realidade se encararmos a realidade para transformá-los em conquistas.
Então, mude sua história e escreva um novo capítulo, cheio de personagens inesquecíveis e aventuras insuperáveis.
Ah, já ia esquecendo...
Um Feliz Ano Novo, cheio das bênçãos de DEUS.
O Convidado
Dia 24 de dezembro, véspera de natal. Saí pela rua, a caminho da celebração desta data, mas antes de chegar ao meu destino resolvi aproveitar o tempo que me sobrava para dar uma volta pela cidade e ver a decoração, as luzes, os enfeites e toda a magia que representa essa época especial do ano. Enquanto dirigia, com a intenção de encantar-me com a beleza da iluminação que se desvelava na minha frente eu vi algo mais.
Nas ruas iluminadas, decoradas, cheias de luzes coloridas e enfeites eu vi um homem mexendo no lixo, suas mãos ágeis revirando o conteúdo que ali havia, seus olhos pacientes e concentrados enquanto analisavam os restos de algo que nos causaria verdadeira repulsa, em busca de encontrar nas sobras que desprezamos o alimento que fortaleceria seu corpo magro e frágil.
Enquanto buscava encantar-me com a magia do Natal, vi uma mãe com um filho no colo, e outras duas crianças a ladeá-la, segurando com uma mão um bebê magro e sonolento, enquanto que mantinha a outra erguida, em busca de algo que amenizasse a fome e o cansaço que sentia, e em resposta eu vi vidros fechados, como uma barreira levantada em fria recusa àquele triste apelo.
Vi também um grupo de mendigos sentados lado a lado, abaixo de uma marquise, com seus corpos cobertos por farrapos e pedaços de papelão, pois mesmo no calor do verão, os dedos gélidos do frio agarram com afinco a pele e os ossos daqueles que passam as noites ao relento. Ali, um deles repartia um pão velho, tirando com dificuldade um naco daquele alimento para dar a cada um dos companheiros que partilhavam de sua fome.
Com aquelas imagens na mente concluí meu passeio, e voltei para a casa onde seria realizada a tão esperada ceia. Ali vi pessoas felizes, com sorrisos no rosto e corpos bem nutridos. Ali vi comida farta na mesa, e presentes espalhados ao redor de uma frondosa e bem decorada árvore de natal. E com aquilo em mente, voltei meus olhos para a porta de entrada, e vi que estava fechada.
Então lembrei o real significado daquela data, a celebração que ela representava, o nascimento que ela trazia de volta à nossa recordação, e me perguntei se o principal convidado daquela festa fora realmente chamado para dela participar.
Naquele momento me vieram à memória as cenas que presenciara momentos antes. O homem mexendo no lixo, vestido de farrapos, em busca do alimento diário enquanto pessoas passavam sem parecer enxerga-lo. A mulher com a mão erguida em apelo por um pouco de ajuda, enquanto se deparava com os vidros e corações fechados. O jovem que mesmo com um pão todo para matar sua fome, o repartia entre os amigos que dividiam com ele o relento da noite.
Acaso batessem em nossa porta, seriam convidados a entrar? Acaso pedissem abrigo, seriam atendidos em seu apelo? Ou teriam a entrada negada, da mesma forma que aconteceu com um casal há mais de dois mil anos atrás? Será que se o aniversariante pedisse acolhida em nossa casa, a Ele daríamos guarita, ou fecharíamos portas, janelas e olhos, para não enxerga-lo, para não ouvi-lo, para não acolhê-lo?
Será que esquecemos de convidar o aniversariante? Será que trocamos o homem de sandálias gastas, corpo magro e vestes simples por outro de botas lustrosas, agasalhos completos e bochechas rosadas e bem nutridas? Será que negamos um único, porém “o único” presente, em detrimento de outros que não possuem significado algum em nossas vidas?
Cristo foi negado em vida. Negado ainda na barriga de sua mãe, tendo de nascer em meio a animais em uma simples manjedoura. Foi negado pelas pessoas que uma semana antes o aclamaram ao entrar em uma cidade, para logo em seguida cuspirem em seu rosto e proferirem insultos em seu calvário. Foi negado três vezes por aquele que dizia amá-lo mais. Será então que continua a ser negado na data que celebra seu nascimento? Na data em que DEUS nos deu o maior presente que poderíamos receber, continuamos a trocá-lo por bens materiais que não possuem significado algum?
Que essa pergunta possa ser feita, mesmo por aqueles que já têm o coração aberto para o homem cujo nascimento celebramos hoje, porque mesmo elas precisam ter em mente que continuamente ele bate à nossa porta, ou se mostra através dos mais fracos e necessitados.
E que daqui para frente possamos abrir as portas, não apenas de nossas casas, mas também de nossos corações, para deixar entrar o convidado de honra. Para acolhê-lo como ELE nos acolheu, e para com ELE dividir, como ELE dividiu em vida, porque ali, embaixo daquela marquise, enquanto dividia o pão com seus amigos famintos, eu vi o Jesus que não vi na mesa farta, na iluminação encantadora, e nos presentes espalhados pelo chão.
Abramos os olhos, os ouvidos e principalmente os corações, porque ELE vive, e bate à nossa porta, diariamente.
“Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei e cearei com ele, e ele comigo. (Apocalipse 3:20).”
Feliz Natal, e que DEUS nos abençoe a todos.
O velho na rua
Uma das vantagens da espera é o tempo que ela proporciona para que possamos fazer coisas que normalmente não faríamos, dada a urgência que nos é exigida pelo cotidiano para resolvermos os problemas que surgem. A observação é uma dessas coisas. Observar o céu, as folhas balançando ao vento, os movimentos instintivos e naturais dos animais, e algo que é fonte inesgotável de conhecimento, o comportamento humano.
E assim me vi em um desses dias, obrigado a esperar e levado a observar as coisas ao meu redor, como forma de ocupar meu tempo quando fui, por assim dizer, fisgado por uma figura curiosa a qual observava através do vidro frio e escuro da porta da sala de espera de um consultório.
Do canto onde estava vislumbrei, sentado em um pequeno batente de uma simpática e antiga casa, como todas as outras daquela vizinhança, um senhor de traços distintos e característicos. A pele seca, manchada, marcada por profundos sulcos que pareciam ter sido cavados dia após dia por décadas e mais décadas de esforço, em uma imagem que parecia ter sido desenhada à mão, como uma representação, uma alegoria de um homem sofrido.
O corpo, magro e curvado parecia prestes a quebrar-se ao menor movimento, os olhos enevoados e sem cor fitavam o vazio, e as mãos grandes, magras e nodosas, quase esqueléticas repousavam sobre os velhos joelhos que haviam suportado o peso de uma vida, à espera de outras mãos que a segurassem e lhe dessem um rumo, levando-o para algum lugar, qualquer que fosse ele.
Na calçada as pessoas passavam pelo homem parecendo não vê-lo, ou ao menos fingindo que não o viam, seguindo suas vidas, com seus próprios pensamentos e seus próprios problemas para resolverem, e o velho lá permanecia, com o olhar perdido à espera de algo. Vez por outra ele voltava os olhos opacos para uma das pessoas que passavam, seguindo-as com interesse, em uma espécie de silencioso pedido por um pouco de atenção.
Esquecido da pressa e da impaciência que momentos antes me incomodavam eu passei a conjecturar quem era aquele homem, de onde viera, e o que o levara a vivenciar a última fase de sua vida de uma forma que aparentava ser tão solitária? Que estrada o levara até aquele ponto? Até aquele batente em meio a uma tarde quente, na frente de uma casa tão antiga quanto ele?
Onde estaria sua família, se é que tinha uma, e como passara o tempo que lhe fora dado para viver nesse mundo?
Quanto mais o observava, mais perguntas surgiam em minha cabeça, mas no fim uma delas tomou seu próprio espaço e o das demais. Por que ninguém olhava para ele, enquanto ele olhava para todos? Porque ninguém devolvia o simples gesto que a todos ele direcionava?
Um olhar, um sorriso, apenas um ato de mostrar-lhe que ele de fato existia, que era visto, que era percebido. Mas não. Todos passavam, pensando em suas próprias vidas, com seus próprios problemas para resolverem. E eu podia condena-los? Acaso não estivesse esperando impaciente para ser atendido, eu teria, em outra circunstância, vislumbrado e prestado atenção naquele velho solitário? Ou seria apenas mais um a passar e ignorar toda uma história de vida, a esquecer de alguém que tinha muito a lembrar, a olhar apenas para mim mesmo enquanto havia tanto a ser visto ao meu redor?
Não, eu não podia julga-los, afinal, essa é a postura que o mundo tem exigido de nós. “Resolva seus problemas primeiro, e preocupe-se com os outros depois”. Infelizmente essa máxima tem sido uma constante não apenas com velhos desconhecidos parados em meio a uma calçada ordinária em mais um dia comum de nossas vidas.
As famílias têm sido assim. Os amigos têm sido assim. Os amores têm sido assim. Como perceber alguém que está próximo quando nossos olhos e corações estão fechados ou distantes? Ocupados demais com os boletos e contas para pagar, com o salário que não aumenta, com o carro ou a roupa da moda a ser comprada ou com o corpo perfeito a ser idealizado e mostrado em incontáveis fotos nas redes sociais, nós temos ficado alheios às pessoas, andando como seres programados para fazer algo que não sabemos o que é, e para seguir rumo a lugar nenhum.
Perdido naqueles pensamentos eu fui arrancado do meu devaneio temporário pela secretária que me chamava, dizendo que chegara minha vez de ser atendido, e antes de entrar na sala eu fitei uma vez mais o velho homem, prometendo dar-lhe alguma atenção assim que saísse da consulta, mesmo que fosse apenas um cumprimento e um simples “boa tarde”. Prometendo a mim mesmo que chegaria próximo o bastante para enxerga-lo, e para que ele pudesse ver que eu o enxergava.
Entrei, e consulta feita, saí, já com a intenção de ir até o velho homem, mas ele não estava mais lá. Olhei para os dois lados da rua, mas ele já partira, seguindo seus lentos e pesados passos naquela estrada que o levara até o batente daquela porta onde eu o vira, e que o levaria até onde as forças lhe permitissem ir, carregando o peso de uma vida e lembranças pelas quais ninguém parecia se interessar.
Ele fora embora sem saber que fora visto, porque uma vez mais a urgência do cotidiano e a pressa em resolver minhas questões tinham me impedido de mostrar a ele que ainda podia ser enxergado. Naquela tarde eu caminhei pela mesma calçada onde ele estivera sentado olhando para cada pessoa que passava, e ao fazer o mesmo, nenhuma delas me olhou. Naquela tarde eu vi que no fim das contas, todos somos como aquele velho homem, parados em meio a um mundo onde poucas pessoas, ou mesmo ninguém nota nossa existência.
E naquela tarde eu descobri que além de não ver, eu também não era visto, porque afinal, é o que estamos nos tornando, pessoas de olhos fechados para o mundo, e abertos apenas para nós mesmos, como alguém que fita apenas um ponto em uma pintura, deixando de enxergar a beleza que há no quadro como um todo.
Então, abramos os olhos e agucemos os ouvidos, pois há uma paisagem inteira, e um mundo rico de personagens variados a serem vistos e ouvidos.
Quem sabe assim não acabemos aprendendo algo com eles?
Memória
A memória. Baú de lembranças infindáveis e recordações inestimáveis. De registros recolhidos e vivenciados na eterna caminhada de nossa efêmera existência. O lugar onde guardamos os momentos mais íntimos, os lugares mais belos e as pessoas amadas que já partiram, e que só ali podem ser visitadas.
A memória dos sentidos, dos toques, das imagens, sons, cheiros e gostos. Dos beijos dados, dos olhares trocados, das canções que embalam nossa existência. Quem nunca lembrou aquele carinho especial ao ouvir uma música do passado, ou de alguém que passou pela vida com um cheiro que ativa nossas lembranças, resgatando-as daquele local escondido e empoeirado na estante das recordações, guardada nos recônditos de nossa mente?
Um tesouro inestimável, que não pode ser comprado, trocado ou substituído. Que sequer pode ser mensurado. Tão especial que não pode ser roubado por qualquer de nossos pares, não importa a astúcia ou ardil utilizado, porque está guardado em um cofre que não pode ser invadido, e do qual só nós possuímos a chave. A nossa mente.
A máquina do tempo tão almejada pelos sonhadores, que pode nos levar a qualquer hora pelos lugares e eras percorridos em nossa caminhada.
Aquela que não para. Que trabalha sem pausa e sem descanso porque o agora acabou de passar, porque o presente já foi, e o futuro está fadado a se tornar passado, ecoando nos salões infinitos de nossas recordações.
Triste daquele que perde sua memória ou a abandona pelo caminho, pois não há como voltar para recolhe-la novamente. Triste daquele que vive seus momentos através de registros frios em uma caixa eletrônica, enchendo a memória de um dispositivo, mas deixando a sua própria vazia, logo ela, que não possui limite algum para guardar o que foi vivido.
Infeliz aquele que prefere registrar os momentos mais íntimos, os lugares mais belos e as pessoas mais queridas através de uma tela, mas cujos olhos são vazios para o caminho que passa e que não há de voltar.
Mas é feliz aquele que vive seus dias, horas e segundos, e guarda-os, cada um deles como a uma joia de valor inestimável, porque há de chegar o dia em que elas serão a única forma de rever aqueles que amamos, de lembrar daquilo que sentimos, e de reviver, ainda que nas recordações, o que outrora foi vivido.
E você? Lembra daquele dia?